Logo Exame.com
Empresas

Debenturistas dão ultimato – e Unigel se aproxima de recuperação judicial

Pedido de suspensão de execução de dívidas é negado; ainda não há decisão da Justiça para ‘mediação cautelar’ protocolada ontem

Unigel: falta de comunicação com credores é ponto chave da crise da companhia (Unigel/Divulgação)
Unigel: falta de comunicação com credores é ponto chave da crise da companhia (Unigel/Divulgação)
Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Publicado em 12 de dezembro de 2023 às 18:24.

Última atualização em 13 de dezembro de 2023 às 14:29.

Em meio a um processo de renegociação de dívidas de R$ 3,7 bilhões que se arrasta há mais de seis meses, a Unigel – uma das mais tradicionais indústrias químicas do Brasil – pediu ontem proteção contra execução de dívidas por 60 dias, mas teve o pleito negado pela Justiça. 

O pedido veio junto com outro, de mediação cautelar com os credores, uma etapa que significa um chamado aos credores para negociar em ambiente supervisionado – uma espécie de antessala de uma recuperação judicial. 

"O processo de mediação garante um ambiente organizado para que possamos continuar as tratativas com os demais credores de forma estruturada, visando uma solução negociada, que entendemos ser a melhor alternativa para todas as partes envolvidas”, disse Roberto Noronha Santos, CEO da Unigel, em nota.

Diante da decisão tomada ontem à noite, entretanto, a companhia fica ‘sob ataque’, o que dificulta a negociação entre um lado e outro. No mercado, a percepção é que será difícil barrar a execução das dívidas sem uma RJ. 

“A recuperação judicial inclui outros credores além do financeiro, como fornecedores e engessa mais os processos porque tudo precisa passar pelo crivo do Juízo”, aponta uma fonte especializada em recuperação judicial. 

A situação esquentou ontem, quando detentores de R$ 500 milhões em debêntures que venceriam apenas em 2027 decidiram executar a dívida, depois de declararem o vencimento antecipado dos títulos na última semana. Segundo fontes próximas às negociações, o grupo, que representa a menor parte da dívida – majoritariamente concentrada com bancos e bondholders –, vem afirmando que estava sendo deixado em segundo plano na negociação. 

A Unigel não apresentou os últimos dois balanços trimestrais, onde ficaria claro o estouro dos covenants que limitam a dívida líquida a 3,5 vezes seu Ebitda. No primeiro trimestre do ano (último resultado disponível), o indicador está em 2,16 vezes – e desde então, a situação da empresa se deteriorou. 

Diante dessa situação, numa assembleia realizada no dia 5 de setembro, os debenturistas concordaram com um waiver, mediante o compromisso de que seria oferecida alguma garantia para os títulos. Também ficou acordado que a empresa ofereceria novos termos econômicos e uma nova assembleia seria realizada, dentro de 90 dias, para aprovar a reestruturação da dívida. 

O prazo se encerrou em 5 de dezembro, sem avanços. “Não houve negociação efetiva”,  diz uma fonte próxima aos debenturistas.

Dentro desse período, a companhia também confirmou as expectativas de credores estrangeiros e deixou de pagar US$ 23,7 milhões em juros para os bonds. As negociações dessa tranche, que envolve US$ 530 milhões, vêm sendo tocadas em paralelo. Até agora, não houve pedido de execução da dívida. 

A Unigel vem tentando vender ativos para reforçar o caixa. Na semana passada, anunciou a venda de uma operação de chapas acrílicas no México, por valor não revelado. A companhia também busca um sócio estratégico para seu projeto de hidrogênio verde – e tem conversas em curso com a Petrobras em torno desse tema e para viabilizar a produção de fertilizantes nitrogenados no país.

É culpa da Rússia!

Na petição enviada à Justiça pedindo a suspensão da execução, o time de advogados da Unigel, liderado por Thomas Felsberg (um dos mais tradicionais especialistas em reestruturações financeiras do país), expõe os fatores que a levaram à crise financeira.

Fundada nos anos 1960, a companhia é a maior produtora de fertilizantes nitrogenados da América Latina desde 2019, ano em que arrendou duas fábricas da Petrobras no país. É dividida, resumidamente, em quatro unidades: acrílicos, embalagens, estirênicos e fertilizantes. A companhia pertence à família Slezynger, de origem belga. De acordo com informações da "Fortune", a fortuna do fundador, Henri Arman Slezynger, é de R$ 17,2 bilhões.  

A empresa informa que foi afetada pela compressão de margens dos negócios de agro e químicos desde o segundo semestre de 2022. Segundo ela, a ureia e da amônia – seus principais produtos –  tiveram uma queda de cotação no mercado internacional, ao mesmo tempo que os preços do gás natural, usado como insumo, fez disparar os custos. 

Segundo a petição, o custo de produção de 1 tonelada de ureia está em US$ 572, ante um preço de venda de US$ 365. Além desse produto, a empresa fabrica uma série de químicos usados na indústria de bens de consumo, um setor de margens espremidas.  

Apesar do cenário recente ruim, os problemas da companhia não vêm de um ano para cá. Há cerca de dez anos, a Unigel passava por problemas financeiros, com rumores de venda da companhia. Na época, o grupo químico tinha dívidas totais de R$ 1,7 bilhão, para uma posição de R$ 177 milhões em caixa, como apontou o "Valor Econômico" na data. No mesmo ano, a Unigel colocou à venda ativos de embalagens — considerado um ponto fora das atividades centrais da empresa. 

A crise na época veio como o resultado de uma crise financeira internacional. Entre 2006  e 2009, a companhia fez investimentos pesados no México, o que aumentou os compromissos financeiros — inflados pela contração global no mercado de crédito. Também nessa época, a Unigel deixou de lado uma oferta pública de ações, uma alternativa para se capitalizar. Em 2014, a companhia fez uma negociação de US$ 400 milhões de dívidas financeiras e investiu na profissionalização da gestão. 

No meio de toda essa situação, a Unigel conta, a seu favor, com o fato de ser a maior produtora de fertilizantes nitrogenados da América Latina desde 2019. Não há outra companhia nacional que esteja nesse patamar, com a empresa competindo apenas com multinacionais estabelecidas no Brasil. 

É uma vantagem competitiva que não vai embora com a situação econômica difícil pela qual a companhia passa atualmente, segundo fontes de mercado ouvidas pelo EXAME In.

Para quem decide. Por quem decide.

Saiba antes. Receba o Insight no seu email

Li e concordo com os Termos de Uso e Política de Privacidade

Karina Souza

Karina Souza

Repórter Exame IN

Formada pela Universidade Anhembi Morumbi e pós-graduada pela Saint Paul, é repórter do Exame IN desde abril de 2022 e está na Exame desde 2020. Antes disso, passou por grandes agências de comunicação.

Continua após a publicidade
Dejà vu: JBS bate (de novo) o consenso, puxada por Seara

Dejà vu: JBS bate (de novo) o consenso, puxada por Seara

Stone bate consenso, com avanço de 20% no TPV e take rate recorde

Stone bate consenso, com avanço de 20% no TPV e take rate recorde