Repórter colaborador
Publicado em 9 de dezembro de 2024 às 08h30.
“Todo mundo se lembra do seu primeiro Nokia”, diz Mark Mason, que se juntou à equipe de design da empresa em seu auge nos anos 1990. “Quando você diz o nome, ele evoca uma memória.”
Não é tão exagerado quanto parece. Em 1998, a empresa finlandesa era a marca de telefone mais vendida no mundo, com 40% do mercado mundial e 70% do mercado do Reino Unido, de acordo com reportagem do The Guardian.
O impacto cultural da Nokia será devidamente reconhecido pela primeira vez em 15 de janeiro, quando o arquivo de design da empresa for exibido. A Universidade Aalto da Finlândia adquiriu o arquivo e o disponibilizará por meio de um portal com curadoria online e mediante agendamento.
Embora para a Finlândia o impacto da Nokia seja indiscutível – o Instituto de Pesquisa da Economia Finlandesa relata que ela contribuiu com um quarto do crescimento econômico da Finlândia entre 1998 e 2007 – o valor da cultura pop internacional da marca também é inegável.
“A Nokia foi uma das primeiras empresas de telefonia a realmente enfatizar o design e a diferença, com tudo, desde telefones muito acessíveis até os mais recentes aparelhos de ponta”, diz Jonathan Bell, editor de tecnologia da revista Wallpaper ao The Guardian. “No mundo antes da Apple, Google e até mesmo da Samsung, eles estavam acima de todos os outros players.”
O toque de fábrica da Nokia – o Gran Vals de 1902 de Francisco Tárrega – era onipresente nas décadas de 1990 e 2000. Em 2009, foi relatado que a melodia era ouvida cerca de 1,8 bilhão de vezes por dia em todo o mundo – o equivalente a 20.000 vezes por segundo.
O aparelho Nokia 8110 – mais conhecido como banana – teve um papel de destaque no filme Matrix de 1999. A marca rapidamente se tornou imbuída de prestígio cultural.
Murray Healy é diretor editorial da revista de moda Perfect lembra que o Nokia 3210 – lançado em 1999 e conhecido no Brasil como "tijolão" – ajudou a inaugurar uma cultura de personalização completa “Você podia até ter o nome da sua banda favorita impresso nele.”
A Nokia também foi a primeira fabricante de celulares a oferecer suporte a mensagens de texto SMS, e os teclados dos aparelhos foram perfeitamente projetados para isso.
“Todos esses fatores deram a ele um apelo imediato para o mercado jovem, que já era adepto de contornar o custo das ligações telefônicas por meio de mensagens de texto”, diz Healy.
Mark Mason, que trabalhou na Nokia por 20 anos e agora é especialista em design do Design Council do Reino Unido, diz que foi um momento fantástico para a criatividade. “Criamos uma linguagem de design cedo que colocava as pessoas no centro. Nosso mantra era ‘tecnologia humana’ e o slogan da Nokia era ‘Conectando pessoas’. Tudo o que fazíamos era em torno disso. Até o teclado era curvado como um sorriso da Mona Lisa. Quando você olhava para ele, ele sorria de volta para você.”
Esse boom de criatividade renderia à companhia um lucro de US$ 4 bilhões em 1999, mas isso não se sustentaria por muito tempo.
O declínio da Nokia se deveu a uma combinação de fatores. A a empresa não aceitou novas abordagens para se adaptar ao mercado, particularmente a ameaça competitiva representada por smartphones touchscreen mais potentes, como o iPhone.
De 2007 em diante, o valor de mercado da Nokia caiu cerca de 90% e seu negócio de telefonia móvel foi comprado pela Microsoft em 2013.
Hoje, os telefones mais "parrudos" da empresa estão encontrando um novo público: jovens cujos pais cresceram com a marca e agora querem dar a seus filhos menos acesso às redes sociais.
Os aparelhos Nokia estão de volta à produção desde 2016, feitos pela Human Mobile Devices – HMD – uma fabricante finlandesa independente de telefones celulares, composta em grande parte por ex-funcionários da Nokia.