Peter Todd: apontado pelo documentário "Money Electric" como o criador do bitcoin (HBO/Reprodução)
Repórter
Publicado em 10 de outubro de 2024 às 11h53.
Última atualização em 10 de outubro de 2024 às 16h06.
"Money Electric", documentário lançado no Max nesta semana, causou agitação ao apontar Peter Todd, um desenvolvedor central no mundo das criptomoedas, como o possível Satoshi Nakamoto, criador do bitcoin. Todd, no entanto, nega qualquer envolvimento com a criação da moeda.
O diretor Cullen Hoback segue uma linha de investigação que, no início, faz parecer que Adam Back, CEO da Blockstream, seria o verdadeiro Satoshi. Back, afinal, é citado diretamente no artigo que descrevia a ideia do bitcoin e é inventor do hashcash, uma tecnologia importante para a criptomoeda. Mas, quando o filme entra em seus momentos decisivos, a narrativa muda de direção.
Em vez de Back, o foco se volta para Todd, com duas evidências centrais que ligam seu nome ao mistério de Satoshi. Primeiro, a solução para o problema do limite de transações no blockchain do bitcoin. Todd, junto com Back, rejeitou a ideia de aumentar o tamanho dos blocos e defendeu o sistema "replace-by-fee", em que usuários pagam uma taxa maior para que suas transações sejam processadas mais rapidamente, como em um leilão.
O filme sugere que Todd teria recebido US$ 500 de uma figura chamada John Dillon para implementar essa mudança. Dillon, supostamente um agente do governo, parece ser um personagem nebuloso que Todd alega ser real, mas sem ligação direta com ele.
A segunda pista vem de uma troca de mensagens no Bitcointalk.org, o fórum criado por Satoshi Nakamoto em 2009. Hoback descobre uma postagem técnica de Nakamoto que parece ser concluída por Todd, que havia acabado de entrar no fórum. A teoria: Todd alternava entre as contas de Satoshi e a sua própria, até que, por um erro, acabou postando com o nome errado.
Essas revelações se somam a uma terceira ideia: para que o bitcoin fosse amplamente aceito, seria necessário garantir que Nakamoto, dono de mais de 1 milhão de bitcoins, nunca despejasse essa quantia no mercado de uma vez, o que causaria um colapso no valor da moeda.
Todd, em mensagens privadas, mencionou ser “o maior especialista do mundo em sacrificar bitcoins”, insinuando que teria destruído as moedas, garantindo que não pudessem ser vendidas. No entanto, o documentário não oferece provas de que isso aconteceu, deixando no ar a possibilidade de que Todd ainda tenha acesso a uma fortuna que pode chegar em US$ 70 bilhões.
Nos momentos finais do documentário, quando confrontado por Hoback, Todd se defende dizendo que essas especulações prejudicam o avanço do bitcoin como uma moeda global. Pouco depois, Todd foi ao X (antigo Twitter) reclamar que não sabia que Hoback estava tentando encontrar o verdadeiro Satoshi Nakamoto, criticando a forma como as entrevistas foram conduzidas.
Essa é uma questão que ressurge constantemente à medida que o bitcoin continua a crescer. Além de Peter Todd, há outros três indivíduos mais apontados, em diferentes momentos, como os possíveis criadores da criptomoeda mais famosa do mundo.
Entre os candidatos, poucos têm sido tão insistentes quanto o cientista australiano Craig Wright, que alegou publicamente ser Satoshi Nakamoto. Em 2015, a revista Wired publicou um artigo afirmando ter encontrado “a evidência mais forte” até aquele momento sobre a verdadeira identidade de Nakamoto. Emails vazados, um suposto rascunho de um paper sobre criptomoedas no blog de Wright e trechos de reuniões com advogados sugeriam que ele havia tentado esconder seu envolvimento com o bitcoin desde 2009. Wright chegou a afirmar: “Tentei o meu melhor para esconder o fato de que venho gerenciando o bitcoin desde 2009. Mas no fim, acho que metade do mundo vai acabar sabendo disso”.
Porém, essas alegações rapidamente começaram a ser questionadas. Posteriormente, Wired encontrou inconsistências, incluindo a suspeita de que as chaves criptográficas associadas a Nakamoto e as postagens do blog de Wright haviam sido retrodatadas. A desconfiança em relação a ele chegou ao ponto de Vitalik Buterin, cofundador do Ethereum, rotulá-lo publicamente de fraude. Mesmo assim, Wright usou a exposição para ganhar notoriedade na comunidade cripto, liderando um fork do Bitcoin Cash que resultou na criação do Bitcoin SV. Em março de 2024, um tribunal de Londres decidiu que Wright não é Satoshi Nakamoto, com o juiz declarando que a evidência contra ele era "esmagadora".
Outro nome frequentemente citado como o possível Satoshi Nakamoto é o de Nick Szabo, engenheiro de computação e pioneiro no conceito de contratos inteligentes, criados em 1996. Szabo também idealizou a Bit Gold, uma moeda digital descentralizada que, de muitas maneiras, previu o conceito de bitcoin. A proposta de Bit Gold envolvia a criação de bits e troca de bits sem a necessidade de intermediários de confiança, um princípio central na arquitetura do bitcoin.
Em seu livro Bitcoin: The Future of Money?, o autor Dominic Frisby argumenta que Szabo seria o verdadeiro Satoshi. Frisby chegou a consultar um especialista em estilometria que concluiu que o estilo de escrita de Szabo era muito semelhante ao de Satoshi. A tecnica mais tarde seria usada por Cullen Hoback para apontar Peter Todd como Satoshi. Outro ponto forte é o fato de ambos, Szabo e Satoshi, terem citado o economista Carl Menger em seus trabalhos. Além disso, Szabo trabalhou na DigiCash, uma das primeiras tentativas de aplicar criptografia aos pagamentos digitais, o que reforça a hipótese de que ele seja o criador do bitcoin.
Talvez uma das histórias mais surpreendentes na busca por Satoshi Nakamoto tenha ocorrido em 2014, quando a revista Newsweek afirmou ter encontrado o verdadeiro criador do bitcoin: Dorian Nakamoto, um engenheiro aposentado que vivia na Califórnia. A alegação baseava-se em coincidências notáveis, como seu sobrenome e sua formação técnica. Além disso, Dorian havia trabalhado em projetos confidenciais para o governo, o que levou a especulações de que ele teria a expertise necessária para criar algo tão complexo quanto o bitcoin.
No entanto, após a reportagem ser publicada, Dorian Nakamoto negou categoricamente qualquer envolvimento com o bitcoin. Em uma coletiva de imprensa, ele declarou: "Eu nunca estive envolvido com o bitcoin. Nunca soube nada sobre isso até a Newsweek entrar em contato comigo." A comunidade cripto ficou do lado de Dorian, e o próprio Satoshi Nakamoto (ou alguém usando seu perfil no fórum P2P) postou uma mensagem dizendo: "Eu não sou Dorian Nakamoto."