Gado (AFP)
Da Redação
Publicado em 3 de setembro de 2013 às 13h26.
São Felix do Xingu - Lacir Soares está transformando sua fazenda em um modelo de produção de carne na Amazônia, sem desmatar e em dia com as exigências ambientais do recém-aprovado Código Florestal brasileiro.
É um exemplo de que as coisas estão mudando na floresta amazônica com o apoio da indústria pecuarista e de ambientalistas, depois de uma década em que o gado foi o principal vetor do desmatamento e quando muitos consumidores se inquietavam diante da possibilidade de estar comprando um produto que devastava a maior floresta tropical do planeta.
Rotação de pasto e melhorias na qualidade genética do gado e das pastagens ajudam Lacir a aumentar a produtividade em sua fazenda "Boqueirão", no município amazônico de São Félix do Xingu (Pará, norte), sem destruir mais a floresta. Com um rebanho de 200 milhões de cabeças de gado, o Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina, sendo que 20% do total é procedente da região amazônica. Mas a região também é líder em baixa produtividade, com uma cabeça por hectare.
Soares conseguiu atingir uma taxa de produtividade de 2 a 3 cabeças por hectare. "O equilíbrio entre a pecuária e a floresta não é só uma obrigação legal, também garante um aumento da produtividade", afirmou este pecuarista e advogado, em boa forma aos 69 anos, dedicado à sua fazenda, cujo entorno ainda exibe as cicatrizes de décadas de destruição. Soares sabe que sem garantias ambientais, a indústria não vai comprar sua carne.
A luta contra a criação de gado que aumenta o desmatamento ilegal da Amazônia se aprofundou há quatro anos, quando o Ministério Público Federal do Pará denunciou 13 grandes indústrias de carne e advertiu 72 supermercados e fábricas de cosméticos e sapatos - em parte multinacionais - de que enfrentariam a Justiça se comprassem produtos de áreas desmatadas.
A ONG Greenpeace divulgou na época um relatório explosivo assegurando que carne e couro de áreas desmatadas conseguiam penetrar na indústria que abastece gigantes do calçado e da moda, supermercados e até a indústria automobilística, na produção de assentos de couro.
[quebra]
As denúncias foram o "pontapé inicial" e a indústria teve que criar programas mais eficazes para garantir que compravam carne sem uma mancha ambiental, explicou à AFP o diretor-executivo da Associação Brasileira de Exportadores de Carne, Fernando Sampaio.
A solução, em parte, veio da tecnologia: em uma área gigantesca e de difícil acesso, mapas via satélite atualizados quase em tempo real permitem observar onde a floresta está recuando. Com a reforma do Código Florestal, o governo brasileiro está estendendo a todos os produtores um censo que determina as áreas de floresta que devem respeitar.
A Marfrig, segunda maior empresa processadora de carne bovina do Brasil, e a gigante transnacional do varejo Walmart, juntamente com a ONG americana The Nature Conservancy, tentam ir além com um programa destinado a transformar algumas fazendas de São Félix do Xingu - que tem o maior rebanho bovino do país - em modelos ambientais e econômicos de produção de gado que possam ser replicados no resto da Amazônia.
Um desses exemplos é a fazenda de Lacir Soares, um indício de que a sustentabilidade pode virar um negócio. "Se não tivéssemos esta atitude, talvez não poderíamos estar vendendo a mercados como o europeu", onde o consumidor se preocupa com a sustentabilidade, afirmou à AFP o gerente de sustentabilidade da Marfrig, Mathias Almeida.
Um exemplo: a sofisticada marca Gucci lançou este ano, em Paris, uma bolsa de couro da Amazônia com certificado de sustentabilidade ambiental. "O cerco à pecuária desmatadora se traduziu em uma redução drástica do desmatamento", em mais de 80% nos últimos oito anos no país e no estado do Pará", disse o promotor Daniel Azeredo Avelino.
Os grandes frigoríficos aderiram ao compromisso da "carne legal" e embora persista "uma parcela de pequenos" que eludem a norma, "a maioria dos produtores incorporou a ideia de que se continuam desmatando, não terão acesso ao mercado", disse o promotor à AFP. Anos atrás, um acordo com a indústria da soja - um setor muito mais concentrado e fácil de controlar do que o da carne - permitiu deter a devastação da floresta, impulsionada por esta produção.