Federal Reserve: foram analisadas informações sobre o uso de cartões de débito e crédito durante passagem dos furacões Harvey e Irma, para checar o impacto na economia das cidades atingidas (Mandel Ngan/AFP)
Funcionários do banco central americano usaram uma ferramenta experimental para avaliar o estrago que as tempestades do ano passado causaram na economia: uma montanha de big data que fornecia em tempo real respostas sobre os gastos, que normalmente demorariam semanas para aparecer.
Em vez de trabalhar com estimativas e dados mensais do varejo, o pessoal do Federal Reserve acessou informações sobre o uso de cartões de débito e crédito da First Data, uma empresa global de tecnologia de pagamentos. Em três dias eles entenderam como os furacões Harvey e Irma impactaram as economias das cidades de Houston e Miami.
Os gastos em restaurantes e lojas em Miami e Tampa cessaram quase completamente. Em Houston, os gastos ficaram 75% abaixo da média. Duas semanas depois, os dados mostraram que não houve recuperação acima do normal. A informação ajudou o Fed a calcular o quanto os eventos climáticos subtraíram do crescimento econômico do terceiro trimestre e esse recado foi incluído no comunicado do comitê de política monetária (Federal Open Market Committee ou FOMC), divulgado em 20 de setembro.
Para o presidente do Fed, Jerome Powell, são de extrema importância os monitores que acompanham os sinais vitais da economia americana em tempo real. O banco central está subindo os custos de captação gradualmente para manter a economia nos trilhos, mas tem apenas uma vaga ideia do nível de taxa de juros que pode limitar o crescimento da atividade. Dados melhores e mais oportunos podem mostrar antecipadamente se a política monetária está frouxa ou restrita demais, ajudando o Fed a evitar um erro que pode sair caro.
Com a atividade econômica cada vez mais digitalizada, pesquisadores podem sair na frente ao procurar nos dados privados sinais sobre a economia real que os órgãos oficiais divulgam com defasagem.
Mas é uma jornada desafiadora. Encontrar pistas sobre a economia em montanhas de informações não filtradas é como vasculhar o lixão para entender o que o país compra.
Diferentemente das estatísticas oficiais, os dados do setor privado não são reunidos com uma pergunta em mente (por exemplo: quanto o país exportou no mês passado?). As amostras podem ser viesadas. Nem todos os cidadãos pagam por bens e serviços com cartões e ainda menos durante furacões, quando falta eletricidade e pode ser melhor usar dinheiro. Nem todas as empresas usam sistemas automatizados para pagar funcionários. A consistência dos dados pode mudar junto com as estratégias do setor privado. Há problemas relativos a privacidade e é necessário tornar os dados anônimos.
No entanto, os órgãos governamentais estão prestando mais atenção porque as ferramentas para análise das informações estão se aprimorando, disse Brian Moyer, diretor do Escritório de Análise Econômica dos EUA (BEA).
“O que realmente mudou não foi a disponibilidade dos dados, mas as ferramentas de ciência da computação e nossa capacidade de processar e usar os dados em tempo real”, disse Moyer, acrescentando que sua instituição vem tentando deixar os relatórios oficiais mais precisos e não substituí-los por dados privados. “Podemos investigar as mudanças na composição dos gastos com bens e serviços e é isso o que vai manter a precisão do PIB.”