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Estado contribuiu para organização da cadeia da cana no BR

Avaliação é de pesquisadores da Esalq-USP e da University of California em livro sobre a experiência brasileira no setor

Cana processo de intervenção do Estado na indústria de açúcar e álcool começou em 1933, com a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (Getty Images)

Cana processo de intervenção do Estado na indústria de açúcar e álcool começou em 1933, com a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 2 de junho de 2014 às 08h26.

São Paulo – A forte intervenção do Estado brasileiro na cadeia de produção do etanol de cana-de-açúcar entre as décadas de 1930 e 1980 – condizente com o ambiente institucional do período – contribuiu para a organização, o aumento da produtividade e da competitividade do setor.

Os ganhos de produtividade agrícola e industrial obtidos a partir da criação do Proálcool na década de 1970, com consistente redução dos custos de produção, permitiram a retirada dos subsídios públicos no final dos anos 1990 e a consolidação, no Brasil, do maior e mais bem-sucedido exemplo mundial de substituição de combustíveis fósseis por um biocombustível no setor de transportes.

Mudanças institucionais do início dos anos 1990, contudo, alteraram drasticamente o papel do Estado na economia brasileira. A partir do final da década, com o início do processo de desregulamentação de diversas cadeias agroindustriais no Brasil, ocorreram mudanças profundas na organização da cadeia produtiva da cana, afetando produtores, consumidores e as políticas do setor.

A avaliação acima é de Márcia Azanha Ferraz Dias de Moraesa, professora do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), e de David Zilberman, professor do Departamento de Agricultura e Recursos Econômicos da University of California, em Berkeley, nos Estados Unidos, no livro Production of ethanol from sugarcane in Brazil – From state intervention to a free market, recém-lançado em inglês pela editora Springer.

Derivado da tese de doutorado de Moraes, defendida em 1999 na USP, o livro foi publicado com apoio da FAPESP, por meio da modalidade Publicações – Livros no exterior.

Moraes conta no livro que o processo de intervenção do Estado na indústria de açúcar e álcool começou em 1933, com a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA).

A intervenção estatal baseou-se principalmente na manutenção do equilíbrio entre a produção e o consumo por meio da fixação de cotas de produção de açúcar e álcool para as usinas e por meio de políticas de regulação de preços e créditos para os dois produtos agrícolas, apontou a pesquisadora.

“Essa primeira fase da intervenção do Estado foi muito importante para a instalação da cadeia produtiva de açúcar e etanol a partir da cana-de-açúcar no Brasil”, disse Moraes à Agência FAPESP.

“Os investimentos em pesquisa agrícola e em processos industriais – em grande parte públicos, mas também privados – permitiram a modernização da indústria canavieira e o lançamento do Proálcool [Programa Nacional do Álcool] na década de 1970 durante o regime militar”, afirmou a pesquisadora.

Criado com o objetivo de estimular a produção de etanol anidro no Brasil para enfrentar os choques de preço do petróleo, o Proálcool passou por diferentes fases de intervenção estatal e permitiu, em uma segunda fase, a produção e o uso do etanol hidratado em larga escala nos automóveis, apontou Moraes.

Em meados dos anos 1980, em razão da política de contenção de gastos públicos vigentes na época, reduziu-se a intervenção estatal no setor sucroalcooleiro. Contribuíram para isso a baixa dos preços do petróleo no mercado internacional, o aumento da produção da gasolina no Brasil e a deterioração das contas públicas do país.

Os recursos do governo para programas de investimentos diminuíram, destaca o livro. “O descompasso entre oferta e demanda por etanol no mercado brasileiro criou conflitos entre o governo e o setor privado”, afirmou Moraes.

“Assim, foi iniciado o processo de desregulamentação do setor, no final da década de 1990, em um cenário de desregulamentação da economia como um todo e com um novo ambiente institucional estabelecido, marcados pela promulgação da Constituição Federal de 1988 e o controle dos gastos públicos para controlar a inflação”, explicou a pesquisadora.

Novo contexto

Outros marcos do processo de abertura da economia brasileira que afetaram a cadeia de produção do etanol de cana-de-açúcar no Brasil foram a eliminação das barreiras à importação, iniciada no governo de Fernando Collor de Mello, a entrada do país na Organização Mundial do Comércio (OMC) e, consequentemente, a derrubada das barreiras à exportação do açúcar brasileiro nos anos 2000.

“O aumento da participação do Brasil no mercado internacional de açúcar levou os competidores internacionais, principalmente no setor de açúcar, a questionar as práticas ambientais, sociais e de produção. Isso induziu à adoção de práticas mais modernas e sustentáveis para concorrer em igualdade de condições no comércio internacional”, destacou Moraes.

Outra mudança importante foi a produção dos carros flex fuel no país, em 2003 – considerado o grande responsável pela recuperação da confiança do consumidor brasileiro no etanol, que reverteu completamente a tendência declinante do uso do etanol hidratado no Brasil.

Também surgiu uma agenda ambiental pautada na redução das emissões de gases de efeito estufa pela queima de combustíveis fósseis. Assim, o etanol ganhou visibilidade internacional, mais um fator para atrair o capital estrangeiro, apontou Moraes.

“Essa nova agenda ambiental internacional implicou grandes investimentos por parte das usinas, que fizeram com que o setor crescesse bastante em produtividade, logística e coordenação das cadeias produtivas”, disse a pesquisadora.

“O setor cresceu muito depois de 2000, no ambiente de livre mercado e sem intervenção governamental, porque já havia toda uma infraestrutura e indústria formadas e um mercado já consolidado para o etanol de cana”, avaliou.

“Numa época em que muitos países consideram medidas políticas alternativas para reduzir as emissões oriundas do uso de energia para o transporte, este livro é uma leitura obrigatória”, avalia Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, que escreveu a contracapa da publicação.

“Ele traz informações valiosas sobre experiências positivas e negativas de um grande país industrializado e em desenvolvimento na redução de sua dependência do petróleo e das emissões de gases de efeito estufa de seu setor de transporte”, escreveu Brito Cruz.

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