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Entenda tudo sobre os novos domínios personalizados da internet

Rodrigo de la Parra, vice-presidente do ICANN para América Latina e Caribe, explica a criação de novos gTLDs e fala sobre a influência deles na internet

internet (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 15 de maio de 2014 às 16h59.

Na última semana, o ICANN, órgão que regula os endereços na web mundial, aprovou o primeiro domínio customizado do Brasil, o .globo. Mas apesar da novidade no país, o processo de criação desses novos “generic top-level domains” (gTLDs) já vem sendo desenvolvido desde pelo menos outubro do ano passado – e envolveu endereços bem diferentes, como o “.christmas” e o “.guitars”.

A criação do programa de novos domínios, no entanto, vem de bem antes: a discussão correu por longos oito anos dentro do ICANN antes de tudo ser finalmente colocado em prática. A demora é compreensível, no entanto, já que a novidade pode representar uma mudança brusca dentro da internet. Basta imaginar que, com esses novos endereços, o consagrado “.com” pode, em breve, dar lugar a um “.bar”, por exemplo.

Então, para entender melhor como foi todo o processo de criação desses novos gTLDs – e como será o futuro do projeto, que finalmente está dando as caras no Brasil –, INFO conversou com Rodrigo de la Parra, vice-presidente do ICANN para América Latina e Caribe. Na entrevista, o executivo explica exatamente o que são esses domínios genéricos, qual a intenção da instituição em criá-los e por que ainda são tão poucos os aprovados por aqui e nos países vizinhos. Confira a seguir.

INFO: Primeiramente, o que é a iniciativa e o que são exatamente os “top level domains” tratados no programa de domínios personalizados?

Rodrigo de la Parra: O programa de novos gTLDs é uma das maiores iniciativas que estão circulando no ICANN no momento. Na verdade, é uma das maiores inovações da internet desde que ela foi concebida. Mas para entendê-lo, é preciso saber também como funciona a indústria de domínios. Na “raiz” da internet, temos os chamados “top level domains” (TLDs), que são o primeiro nível de domínios. Depois deles, você ainda encontra os de “second level” e de “third level”. Mas no caso específico dos TLDs, existem dois tipos, sendo um deles os “generic top level domains”, conhecidos também como gTLDs. Até o ano passado, eles eram apenas 22, sendo os mais populares o .com, o .net e o .org. E além desses genéricos, temos ainda os que chamamos de “country codes top level domains” (CCTLD), que englobam o .br, o .mx para o México, o .cl para o Chile, e outros. Há cerca de 200 deles pelo mundo.

Como foi o processo de aprovação dessa iniciativa de se criar novos gTLDs personalizados?

A comunidade no ICANN basicamente discutiu e aceitou muitos novos gTLDs na raiz da web – foram quase 2.000 pedidos recebidos. Nós analisamos todas as inscrições, desde os méritos das organizações até se eles possuíam capacidade técnica e fundos suficientes. Para alguns desses pedidos, ainda levamos em conta a proteção a marcas registradas, direitos sobre propriedades e considerações geográficas. Das 2.000 inscrições iniciais, 1.300 poderão ser aprovadas muito em breve, e de todas elas, delegamos (o termo que usamos para dizer que autorizamos as companhias e organizações a começar as operações dos domínios) até agora 250. A primeira no Brasil foi a do .globo, para a empresa de mídia, mas há outros pedidos no país – .bom e .final, além de um para a cidade do Rio de Janeiro, .rio, por exemplo. Esses, no entanto, estão em fase de contrato, mas poderão começar a funcionar também em beve.

O que os inscritos precisavam ter para que os gTLDs sugeridos fossem aprovados?

Tornar-se um dono (ou “registrador”) não é exatamente fácil, porque além de ter ficar responsável por vender [ou manter] os componentes de nomes de domínios, é preciso carregar a responsabilidade de tomar conta da infraestrutura crítica da internet. Isso porque todos esses gTLDs delegados estarão na raiz dos arquivos da internet, e esses novos registradores terão responsabilidades técnicas na parte de comunicações na web – o que exige equipamentos sofisticados. Não é algo trivial.

Como e para que esses domínios personalizados poderão ser utilizados?

Há tipos diferentes de aplicações, e algumas delas são relacionadas a marcas – o que é algo novo, porque não tínhamos marcas nos gTLDs até agora. Na América Latina e no Caribe, por exemplo, temos o .avianca, da companhia aérea colombina. A intenção, nesses casos, não é vender domínios sob o .avianca, mas sim usar esse “top level domain” para fins de marketing, posicionamento de um novo produto, identificação. Em resumo, é uma categoria única. Outra aplicação é a geográfica: já expliquei que temos os códigos de países, mas agora dá para ir além deles. Esse novo programa permite incluir cidades. É o caso do .rio, do .nyc para Nova York, do .barcelona, do .miami. Por fim, há a categoria que lida com comunidades, como o .gay e outras que identificam grupos específicos. Ao todo, são três as categorias dentro das inscrições que recebemos, e acreditamos que será uma grande oportunidade para dar escolha ao consumidor na internet e também para incitar a competição – teremos muitos novos “players no mercado”, que poderão criar um panorama diferente na indústria de domínios.

Essa criação maciça de novos “top level domains” não pode acabar gerando uma “bagunça” na web, já que estamos deixando de lado os antigos padrões?

Então, os programas e quaisquer outras decisões tomadas no ICANN surgem a partir de todo um processo que segue um modelo de múltiplas partes interessadas (stakeholders). Temos diferentes grupos que unem essas partes, como a comunidade técnica, a sociedade civil, o setor privado, governos – todos estão representados lá. Há oito anos, um desses grupos, a organização de suporte ao “generic name”, começou esse programa, e ele foi discutido durante os sete anos seguintes até se tornar uma realidade. Ou seja, decisões como essa não são tomadas pela liderança do ICANN, não é uma ordem que vem de cima. Foi a comunidade global da internet que decidiu ser uma boa ideia abrir o espaço de nomes de domínio para competição e escolha do consumidor.

Mas falando também do ponto de vista técnico, não há problema em diversos “top level domains” coexistirem – e fizemos análises para saber se isso criaria algum problema. O que descobrimos foi que, mesmo que as 2.000 inscrições fossem bem-sucedidas, elas poderão funcionar muito bem do ponto de vista técnico. E nós temos até menos que isso, algo por volta dos 1.300. No entanto, é claro que eu acho que, do ponto de vista do consumidor, levará algum tempo para que todos nós nos acostumemos com esses novos domínios na web. Ainda assim, eu particularmente acho que é bom termos esses endereços mais específicos, para identificar melhor negócios ou comunidades conforme procuramos por eles na internet.

Por exemplo, temos a inscrição de um empreendedor mexicano para criar o .rest (restaurantes) e o .bar (bares). Então vamos supor que você tenha um estabelecimento do tipo: talvez seja até melhor estar no domínio .rest do que no .com por fins de busca. Mesmo as pessoas que procurarem por restaurantes poderão achar interessante quando perceberem que os estabelecimentos estão sob um “top level domain” específico. E ainda há outros, como .hotel ou os referentes a cidades. Com as Olimpíadas de 2016, por exemplo, talvez o governo ou companhias queiram usar o .rio para anunciar hotéis, a programação do evento e muitas outras coisas, para facilitar a identificação.

E como é o processo para que outras empresas possam usar os gTLDs registrados?

Não é bem como registrar um novo domínio. O responsável pela inscrição do gTLD se torna o “registrador” desse .rest, por exemplo. Esse dono poderá, então, vender o domínio para os que quiserem oferecer registros, de forma que a partir daí, pessoas e outras organizações poderão criar uma página sob o endereço. Você poderá ver, por exemplo, um fogodechao.net. Mas para isso, a companhia responsável pelo Fogo de Chão precisará falar com um “registrante” [o intermediador, como um GoDaddy] que tenha um contrato com o dono do .rest, e então poderá fazer a URL com o gTLD personalizado.

Mas isso vale apenas para os gTLDs abertos, cujo objetivo dos donos é vender. Talvez os empresários estejam agora mesmo se aproximando de diferentes restaurantes e associações para que consigam fazê-los comprar domínios .rest. No caso dos fechados, como o .globo e o .avianca, o objetivo das empresas é ter mais presença na web. Serão usados apenas por suas marcas e produtos, como a emissora de TV, por exemplo.

Segundo um documento de divulgação do programa de novos gTLDs, das cerca de 1.300 aplicações aceitas pelo ICANN, apenas 24 vieram da América Latina e do Caribe. Em comparação com a América do Norte (911) e Europa (675), é um número muito baixo. Por que essa diferença existe?

Até a aprovação desse da Globo Comunicações, não tínhamos nada na América Latina e no Caribe – os novos gTLDs estavam apenas na Europa e na América do Norte, com alguns poucos na Ásia e nenhum também na África. Então foi um bom passo, mas ainda há um longo caminho pela frente. Uma das razões que talvez explique essa baixa adesão é que pessoas e organizações da região não estão acostumadas a fazer parte desses negócios online. Mesmo o envolvimento de partes interessadas (ou stakeholders) vindas da região no ICANN é muito pequeno. Nós até estamos tentando mudar esse cenário, mas mesmo com promoções ou programas diferentes, não tivemos muito sucesso em convencer organizações e empresas a fazer inscrições para o programa.

Outro motivo talvez tenha a ver com o aspecto cultural mesmo. Se você observar o mercado de domínios na América Latina, verá que cerca de 70% deles estão sob o CCTLD, de código de país. É o exato oposto do resto do mundo, que tem 70% dos domínios sob os gTLDs (.com, .net, entre outros). Consumidores na região, portanto, devem se sentir mais confortáveis registrando seus domínios sob os códigos de país mesmo. Em vez de ter um .com, eles preferem um .com.br ou um .com.br. Por fim, embora tenhamos empresas enormes na América Latina que se inscreveram para se tornar donos de novos gTLDs, ainda foi um número baixo. Não vemos muitas empresas que aceitam arriscar capital para investir nisso. Mas o que fizemos até o ano passado foi só o “primeiro round” de inscrições. Acreditamos que até o final do ano teremos algumas datas e mais informações sobre uma segunda rodada, e temos certeza que esse cenário atual vai mudar.

Creio que isso dependa mais das companhias, mas há alguma previsão do ICANN para quando elas começarão a usar esses novos gTLDs?

De fato, isso depende delas mesmo. O que sei é que algumas empresas e organizações estão, no momento, em uma fase inicial, analisando os domínios potenciais que querem registrar. Outras, como a responsável pelo .london, já estão até vendendo endereços – ou seja, já está acontecendo. Dá até para dizer que, no decorrer deste ano, começaremos a ver todos eles “nascendo”, de certa forma.

E quando o ICANN finalizará a distribuição dos gTLDs no mundo todo?

Isso depende do porquê de eles não terem sido delegados até agora, e alguns casos são apenas questão de tempo mesmo. Pode ser por causa do contrato, por exemplo, e nessa situação, é só uma papelada impedindo esses gTLDs de “nascer. Mas algumas situações podem envolver questões legais, como no caso de um nome relacionado a cidades, estados ou países. Nessas, talvez as partes ainda não tenham chegado a um acordo. Ou vamos supor que haja duas ou três empresas querendo o mesmo domínio: pelas regras do programas, podemos sugerir uma parceria, um joint-venture. Mas os lados podem não ter chegado a um acordo. Portanto, algumas aplicações precisam de mais tempo, mas a grande maioria das 1.300 das quais falei vão ao ar no próximo mês mesmo.

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