APPLE: o lucro da companhia caiu 27% no trimestre, mas a receita surpreendeu positivamente: 42 bilhões de dólares / China Daily/ Reuters
Da Redação
Publicado em 29 de abril de 2016 às 16h51.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h25.
As coisas já foram mais fáceis para a gigante de tecnologia Apple. Na última terça-feira 27, a empresa anunciou queda em sua receita trimestral pela primeira vez em 13 anos. Os 50,5 bilhões de dólares obtidos até o final de março representam um recuo de 13% em relação ao mesmo período do ano passado. O fato não acontecia desde 2003, quando a empresa lançou a loja de downloads iTunes, atrelada à terceira geração dos players iPod, e revolucionou o mercado de música. De lá para cá, a Apple aumentou dez vezes seu valor de mercado e passou a figurar com frequência no topo da lista de empresas mais valiosas do mundo.
O resultado apresentado nesta semana, portanto, preocupou investidores. Como consequência, em algumas horas, as ações da empresa caíram 8% e geraram uma avalanche de perguntas. A principal delas: seria esse o começo do fim da Era Apple?
“Não vejo os números como um grande problema, pelo menos não por enquanto”, diz Patrick Moorhead, diretor da empresa de análises Moor Insight & Strategy. “Se isso se repetir por três ou quatro trimestres, então teremos um problema.” O que parece preocupar são os sinais de que não se trata de um evento isolado. A estimativa oficial da Apple para o próximo trimestre, de abril a junho, é que a receita fique entre 41 bilhões e 43 bilhões de dólares, abaixo da expectativa do mercado, de 47 bilhões de dólares. Nesse cenário, o iPhone é o principal responsável pela queda, justamente porque representa a maior parte da receita da Apple (65%).
Desde que foi lançado em 2007, suas vendas só subiram. Porém, no último trimestre, a empresa anunciou 51,2 milhões de aparelhos vendidos, 16% menos do que no mesmo período há um ano.
Dependência do iPhone
O que piora a situação da Apple é que, em seu portfólio, nenhum outro produto compensou o gap do iPhone. Os números do iPad, por exemplo, estão em queda há dois anos e, somente no último trimestre, suas vendas recuaram 19%. “A Apple vem consistentemente conquistando fatias de mercado e expandindo para novas áreas, mas está começando a desacelerar”, diz Moorhead.
Alguns fatores externos ajudam a entender o ritmo mais lento. Em primeiro lugar, a economia chinesa, segundo maior mercado da Apple, já não anda mais no mesmo ritmo de alguns anos atrás. O fortalecimento do dólar também não ajuda a empresa a emplacar as vendas em países como o Brasil, onde um iPhone pode custar quase 5.000 reais. Por fim, a Apple teria se tornado vítima do próprio ciclo de lançamentos. Acostumados a uma nova versão do smartphone apresentada anualmente, os usuários do iPhone 6, bastante popular, teriam pulado a geração 6S/6S Plus no ano passado e estariam aguardando o lançamento de um novo celular no segundo semestre de 2016.
Todos esses motivos fazem sentido e ajudam a entender o momento, mas o que está por trás da queda nas vendas de iPhone — e, consequentemente, da receita da Apple — parece ser um problema muito mais amplo: o setor de smartphones está estagnado. Dados divulgados na quarta-feira 27 pela consultoria IDC mostram que as vendas de smartphones no primeiro trimestre de 2016 cresceram apenas 0,2% em comparação com o mesmo período do ano passado. É a menor taxa já registrada. “Conforme o mercado de smartphones se torna mais maduro, ele também fica mais saturado. A maioria das empresas está sofrendo com isso”, diz o americano Jefferson Wang, analista da IBB Consulting. Em outras palavras: a Apple tem um problema, mas não está sozinha.
Inovar e baratear
“As expectativas dos consumidores estão ultrapassando o ritmo de inovação das fabricantes”, afirma Wang. A estratégia adotada por alguns concorrentes foi combinar produtos. Um exemplo é o que a Samsung está fazendo com os óculos Gear VR, de realidade aumentada, oferecidos gratuitamente aos usuários que adquirirem o smartphone Galaxy S7. No caso da Apple, o periférico mais notável de seu portfólio é o iWatch. Embora a empresa não divulgue os números individuais de venda de seu relógio inteligente, analistas estimam que cerca de 12 milhões de unidades tenham sido vendidas.
Outra estratégia possível para as fabricantes é investir em serviços. Programas ou plataformas capazes de facilitar a conexão entre os gadgets dos usuários devem ganhar espaço. No caso da Apple, a área que mais cresceu em receita no último ano foi justamente a de services — faturou 1 bilhão de dólares a mais do que no ano passado. O segmento engloba, entre outras coisas, o Apple Pay, plataforma que permite ao usuário fazer pagamentos em lojas físicas com o iPhone.
Com o mercado saturado, o preço também pode ser um fator crucial para conquistar mais usuários. Segundo o relatório da IDC, a Apple e a Samsung vêm apresentando quedas em fatias de mercado ano a ano, enquanto nomes menos conhecidos ganham popularidade. Em 2016, a grande surpresa são as fabricantes chinesas Oppo e Vivo, que substituíram a Lenovo e a Xiaomi na quarta e na quinta posição do ranking mundial. A interpretação do IDC é que essas empresas estão mais bem preparadas para competir na categoria abaixo dos 250 dólares.
Para brigar pelos usuários que não têm acesso aos aparelhos topo de linha, a Apple investiu em 2013 no iPhone 5C e, neste ano, anunciou o iPhone SE. Com tela menor, de 4 polegadas, preço de 399 dólares e muitas das funções do irmão maior iPhone 6, como processador e reconhecimento de digitais, o iPhone SE esgotou nas lojas. Como começou a ser vendido no dia 31 de março, não entrou nos resultados trimestrais apresentados nesta semana.
O único problema é que, ao descer do pedestal de topo de linha, a Apple começa a encarar outros tipos de concorrência. “Conforme busca esse novo usuário intermediário, empresas como Samsung e Huawei podem se tornar fortes concorrentes, porque já têm bons aparelhos para esse segmento”, diz Moorhead.
São diversos desafios à frente. Daí a dizer que a Apple está em crise vai uma enorme distância. A empresa lucrou mais de 10 bilhões de dólares só neste trimestre. Sua margem de lucro ainda é mais que o dobro de sua maior concorrente, a Samsung.
(Paula Rothman)