under the dome (Reprodução)
Da Redação
Publicado em 3 de março de 2015 às 08h53.
Ao mais puro estilo Al Gore, uma renomada ex-jornalista chinesa revolucionou a internet com um documentário sobre a poluição, que superou 100 milhões de visualizações em apenas dois dias, segundo as plataformas de divulgação, e reavivou o debate sobre a grave contaminação do ar no país asiático.
Sua filha foi quem chamou sua atenção. "Antes não dava importância à poluição. Nunca colocava máscara. Agora tenho alguém entre meus braços que tem que respirar", declara Chai Jing nos primeiros momentos do documentário Under The Dome ("Sob a Cúpula"), que usa emprestado o nome da série americana de televisão na qual uma cidade inteira se vê presa sob uma misteriosa doma.
"Nós somos como essa cidade (...). Tenho que prender minha filha em casa", assegura Chai no documentário, no qual aparece falando com um público em um palco, imitando o estilo do ex-presidente americano Al Gore em "Uma Verdade Inconveniente", o premiado filme sobre a mudança climática.
Após o nascimento de seu bebê - que foi diagnosticado antes de nascer com um tumor e teve que ser operado antes de sua mãe pegá-lo no colo pela primeira vez -, a jornalista decidiu abandonar no ano passado sua bem-sucedida carreira na televisão nacional chinesa, "CFTV", para se dedicar a este projeto.
"Sem esse motivo tão emocional (sua filha), teria sido impossível realizar este projeto", explicou Chai em entrevista ao "Diário do Povo", o único meio de comunicação ao qual aceitou oferecer declarações após o repentino sucesso do documentário.
Em 103 minutos de duração, com um discurso alinhado que é intercalado com suas reportagens pela China sobre a indústria do carvão, entrevistas com altos funcionários, vários dados oficiais e de organizações como Greenpeace, Chai tenta responder a três perguntas fundamentais: "De onde vem a poluição?, Como me afeta? e O que posso fazer para remediá-la?".
Em sua busca de respostas, Chai revela, entre outras coisas, que apesar de existirem normas para reduzir as emissões, os limites não são cumpridos em alguns setores e não há castigo para os que descumprem, como no caso dos caminhões com motores diesel que não têm sistemas de controle de emissões.
Suas respostas viraram um êxito na internet e, desde que o vídeo foi publicado no sábado em diferentes plataformas como Tencent e Youku, as visualizações não pararam de aumentar e atualmente já superam as 100 milhões.
"É um acontecimento único. É um estupendo trabalho, muito bem fundamentado e explicado", opinou Li Yan, diretora da unidade de Clima e Ação do Greenpeace da Ásia Oriental, em declarações à Agência Efe.
Além disso, lembra Li, o documentário chega em "um momento-chave", depois que em janeiro entrou em vigor a nova Lei de Proteção Ambiental e nesta semana tomou posse do cargo o novo ministro encarregado desta pasta, Chen Jining.
Além disso, durante os próximos dias, será iniciada a sessão anual da Assembleia Nacional Popular, o Legislativo chinês, onde a poluição será um assunto-chave.
"Esse vídeo chega em uma nova era e já ajudou a reabrir o debate", enfatizou Li, uma das impulsoras de outro recente documentário sobre a poluição dirigido pelo famoso diretor de cinema Jia Zhangke, Smog journeys.
Em um momento no qual calcula-se que até 500 mil pessoas morrem prematuramente na China a cada ano por causa da poluição, segundo dados oficiais, Li espera que haja mais intelectuais com projetos como o do jovem diretor Jia ou o da influente ex-apresentadora, famosa por suas coberturas do terremoto de Sichuan em 2008 e do mortal vírus do Sars em 2003.
E Lia espera também que as autoridades façam cumprir a lei de maneira firme. "Há muitas grandes empresas estatais, como as petrolíferas, que estão apresentando resistência", comentou o responsável do Greenpeace, que concorda com a ex-apresentadora de televisão que a atitude das autoridades melhorou.
De fato, o novo ministro do Meio Ambiente não demorou em reagir ao documentário e em entrevista coletiva no domingo, se comprometeu a "fazer cumprir" as normas e felicitou Chai por seu projeto.
No entanto, e apesar desta "boa atitude", Li considera que terá de haver uma grande determinação política para "parar os poderosos gigantes".
Por enquanto, a jovem estrela da televisão propõe que a sociedade chinesa ajude na luta contra a poluição denunciando qualquer violação das normas.
"A gente faz história quando milhares de pessoas comuns dizem 'não, não estou satisfeito. Não quero esperar. Me levantarei e farei algo. Aqui e agora'", conclui Chai.