TikTok: como a plataforma se tornou o lugar ideal para os influencers (Ricardo Jaeger/Exame)
Tamires Vitorio
Publicado em 13 de setembro de 2020 às 08h00.
Os vídeos dela rodam por toda a internet --- seja no TikTok, onde são originalmente publicados, ou no Twitter e no Instagram, quando caem no gosto de um público ainda maior e mais pulverizado. É claro que, ao falar de TikTok, não podemos deixar a presença ilustre de Lorrane Silva (ou @_pequenalo, como é conhecida na internet) de lado.
Quem acompanha as redes sociais por pelo menos um curto período de tempo já esbarrou com um vídeo dela, mesmo sem ter ideia do nome por trás dos conteúdos engraçados. Lorrane pode ser pequena na altura, mas é uma gigante em uma área que por muitos anos ignorou a presença de mulheres e, principalmente, de pessoas com deficiência: a comédia.
A comediante já vinha produzindo vídeos desde 2015, mas foi no TikTok que viu sua chance de crescer --- e nem imaginava que seria tanto. “Eu comecei a usar o TikTok na quarentena porque eu tinha baixado, mas sem nenhuma pretensão de nada. Eu comecei porque o aplicativo estava em alta e eu pensei: vou para lá também. E aí criei minha conta, comecei a postar alguns memes e foi então que um vídeo meu viralizou muito”, conta.
Os 5 anos tentando ter um lugar ao sol valeram à pena: alguns vídeos de Lorrane tem até 10 milhões de visualizações e ela já acumula 1,3 milhão de seguidores --- valor que deve aumentar expressivamente até a publicação dessa matéria
Para ela, ser elogiada por humoristas conhecidos como Tatá Werneck, Whindersson Nunes (outro fenômeno da internet) e o Tirulipa é uma gratificação extra que veio com o trabalho duro. “Meus vídeos me trouxeram a oportunidade de reconhecimento por famosos que sempre admirei”, conta.
Outro ponto importante, para ela, é mostrar que PCDs podem sim ter espaço na comédia apesar das limitações físicas --- e, como mostram os vídeos de Lorena, muito bem. “Além de levar humor, sinto que a representatividade de pessoas com deficiência aumentou muito. Eu recebo muito feedback que estou levando essa representatividade e passo a percepção de que, mesmo com limitações, a gente pode sim fazer o que a gente quer e correr atrás. E isso é muito bom”, explica.
Outra influencer que encontrou seu caminho à luz (se por assim dizer) no aplicativo é a jovem Luiza Setra. Calma, você não deve conhecê-la por esse nome, mas sim por seu @ no TikTok: luhsetra. A e-girl é um fenômeno na plataforma. Seu perfil na plataforma teve um crescimento de quase 500% no número de seguidores em cerca de nove meses.
Com 19 anos e cabelos coloridos que mudam quase que mensalmente, Setra conheceu o aplicativo no final de 2018, e passou por um período de estudo para entender melhor o que funcionava, qual estilo gostaria de seguir e qual tipo de vídeo ela gostaria de produzir.
Quando fez a conta no TikTok em janeiro do ano passado, não conseguia imaginar o alcance que teria um pouco mais de um ano depois. Os primeiros vídeos foram feitos sem compromisso, mais como uma forma de distração. “Depois que baixei o app pensei ‘ah, vou começar a gravar, por que não?’ e tinham umas quatro ou cinco pessoas que gravavam aqui no Brasil na época. Eu comecei reproduzindo memes, fazendo dancinhas que estavam na moda”, explica.
No aplicativo chinês, a jovem atualmente faz vídeos de moda, beleza e maquiagem. Para ela, o motivo de tanto crescimento em pouco tempo é a atração que o público do aplicativo sente em relação aos temas que ela aborda.
Setra também encontrou no TikTok uma forma de renda depois da demissão inesperada em plena pandemia do cargo que tinha como jovem aprendiz na Azul Linhas Aéreas Brasileiras. Com cada publicidade feita em seu perfil no TikTok, no qual tem 2,8 milhões de seguidores, ela consegue ganhar uma bagatela de 15 mil reais. “Eu fiquei desesperada quando fui demitida, achei que ia ter que trancar a faculdade, aí comecei a investir no TikTok e com isso consegui pagar dois meses dos meus estudos”, conta.
A renda das publicidades, obviamente, não é fixa e o valor mais garantido para Setra é o que ela ganha no YouTube com seus vídeos de tutoriais de maquiagem. “Com o que ganho em dois meses com o meu canal eu consigo comprar um iPhone 11”, exemplifica aos risos.
Em breve, segundo ela, o foco do YouTube deve mudar para gameplays. Para ela, o investimento no YouTube não é arbitrário. “O TikTok não valoriza os influencers da mesma forma e não rentabiliza os vídeos dos brasileiros ainda. Acho que é o que falta”, diz.
A nanocientista brasileira Catarina Valdez encontrou no TikTok a chance de explicar um pouco de seu trabalho, que pode soar complicado à primeira vista. O vídeo no qual ela mostra como é um nanorobô tem cerca de 722,5 mil visualizações --- um número bastante expressivo visto que a rede de Valdez é um pouco menor, com 194,2 mil seguidores.
Em poucos segundos, a cientista tira dúvidas sobre a ciência, seu trabalho e sua vida na Alemanha, onde cursa seu mestrado, em um mix bastante equilibrado entre os assuntos.
O que foi criado em meados de maio como uma forma de driblar o tédio na quarentena pelo coronavírus em pouco tempo se tornou um meio de comunicação ideal para a cientista. “É uma plataforma que tem muita gente jovem. Eu vejo quantas meninas entre 10 e 16 anos que me seguem e não sabiam nada sobre nanotecnologia, não sabiam o tipo de trabalho que você pode ter se você estudar ciência. O melhor ponto, para mim, é fazer com que pessoas tão novinhas entendam o poder que tem você estudar ciência e ser um pesquisador”, diz Valdez.
Quando publica um vídeo, ela ganha em torno de 5 mil seguidores por dia --- a periodicidade das publicações não é definida com assertividade uma vez que Valdez, aos 24 anos, está finalizando a sua tese de mestrado.
Sem postar nenhum vídeo, ela consegue ganhar cerca de 100 seguidores a cada 24 horas. “Eu acho que se usado de uma maneira inteligente, o TikTok tem um potencial absurdo. Acho que a gente tem tanto acesso à informação que a gente se perde. E essas pessoas de 12, 14 anos não sabem o que elas querem muito e o que elas veem no TikTok se torna o ideal para elas, se você coloca um objetivo no aplicativo, isso traz uma coisa mais alcançável”, afirma.
Embora a culinária seja uma prática que requer tempo e atenção, ela está também presente no TikTok, com pilúlas de receitas em um minuto. No Brasil, umas das figuras que mais cresceu na plataforma nos últimos meses é o chef Pedro Scalzilli de Bem, conhecido na rede como Pedro Rakun (nome que ele adotou por causa do Guaxinim, um animal que, diz ele, sempre lhe trouxe sorte). Pedro, que já foi jogador de futebol e morou na Alemanha, se interessou pelas gastronomia na Austrália, quando teve um emprego lavando pratos.
De volta ao Brasil, resolveu investir nessa carreira e começou uma faculdade na área — atualmente trancada, diante da pandemia de covid-19. Ele havia sido efetivado num restaurante de alta gastronomia em Porto Alegre, onde mora, mas que teve de parar por causa do isolamento social.
Então, começou a fazer vídeos para o TikTok com maior frequência e foi recompensado pela maior presença na plataforma: no início de junho tinha 20.000 seguidores, três meses depois ultrapassou os 350.000. Ele foi chamado em junho pelo próprio aplicativo para participar de uma live, e o número de seguidores na ocasião saltou de 30.000 para 90.000 no mesmo dia.
Com 27.000 seguidores fechou a primeira publicidade em seu canal, que já pagou mais do que ganhava. “Não teve nenhum mês que não entrou uma publi, ou duas ou três. Se mostrou uma opção mais rentável que meu trabalho”, diz Pedro, que tenta se organizar para não ser surpreendido por meses de menor faturamento.
De lá para cá, ele deixou o emprego que tinha e fechou uma empresa que vendia donuts para se dedicar exclusivamente à produção de conteúdo: alugou um estúdio perto de casa, fechou parceria com um editor de vídeos, investiu em equipamentos e se prepara para lançar um canal no YouTube.