Às 4h50, no Parque Nacional Kasanka, no norte da Zâmbia, turistas em uma plataforma construída sobre uma árvore assistem ao nascer do sol acompanhados pelo som de milhões de asas.
Cerca de 10 milhões de morcegos-frugívoros-cor-de-palha (Eidolonhelvum) estão voltando depois de uma noite de alimentação. Alguns voaram até 100 quilômetros para encher a barriga de bagas e figos.
Esses animais poderiam guardar um segredo essencial para a cura do ebola, doença que matou mais de 8.000 pessoas na África Ocidental na maior epidemia já registrada, de acordo com Aaron Mweene, professor da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Zâmbia.
A culpa dessa epidemia, que ainda não foi controlada, recaiu sobre os morcegos.
Pesquisadores, inclusive cientistas da Universidade Hokkaido, do Japão, realizaram um estudo que identificou uma alta prevalência de anticorpos de ebola nos animais que realizam a segunda maior migração entre os mamíferos, da República Democrática do Congo até a Zâmbia, onde se alojam, disse Mweene. Isso indica que eles entram em contato com o vírus e conseguem se curar.
“Os anticorpos foram encontrados em cerca de 10 por cento dos animais. É uma parte significativa do total”, disse Frank Willems, ecologista em Kasanka, em entrevista no parque. “É bem possível que essa espécie especificamente guarde um segredo para encontrar a cura do ebola”.
Morcegos e ratos
No entanto, alguns cientistas são céticos.
“Com vírus como o ebola e o Lassa, o vírus e o hospedeiro – como morcegos e ratos – estão muito bem adaptados um ao outro, pois passaram milhares de anos juntos”, disse Ben Neuman, virologista da Universidade de Reading, do Reino Unido, em entrevista. “Os anticorpos podem ajudar, mas não constituem em si uma solução para um vírus”.
A febre de Lassa, como o ebola, provoca hemorragia. O vírus de Marburg também está intimamente relacionado ao ebola.
Testes de tratamentos experimentais com os anticorpos encontrados em humanos que sobreviveram à doença já estão sendo realizados na Guiné.
“Não podemos afirmar categoricamente que a cura para o ebola está nos morcegos, mas com certeza eles possuem determinadas características que fazem com que sobrevivam à infecção”, disse Mweene em resposta a perguntas enviada por e-mail.
Reservatório natural
Nenhum dos morcegos encontrados estava infectado com o vírus.
“Eles pegam o vírus, mas têm um mecanismo de defesa muito eficiente contra ele”, disse Willems enquanto hipopótamos resfolegavam no lago atrás dele.
Embora se presuma que os morcegos sejam o reservatório natural do ebola, isso não foi provado.
Os morcegos também poderiam ajudar a localizar o reservatório natural de ebola. Neste ano, pesquisadores colocaram pela primeira vez aparelhos de GPS em alguns animais para acompanhar os movimentos deles no caminho de volta à República Democrática do Congo, disse Willems.
As baterias duram cerca de três meses, que é aproximadamente o tempo que eles demoram para chegar ao destino, disse ele.
Isso pode ajudar a fornecer pistas sobre onde os animais entram em contato com o vírus e, possivelmente, levar à sua origem, disse ele.
A primeira pessoa a contrair ebola no último surto na África Ocidental pode ter sido infectada por morcegos insetívoros de cauda livre na Guiné, de acordo com uma pesquisa publicada no dia 29 de dezembro pela revista EMBO Molecular Medicine, com sede em Heidelberg, Alemanha.
Durante a epidemia da África Ocidental, o vírus matou principalmente pessoas na Guiné, em Serra Leoa e na Libéria, de acordo com a Organização Mundial de Saúde.
Sopa de morcego
Embora a Zâmbia não tenha registrado casos de ebola, a epidemia na África Ocidental está arruinando a reputação dos morcegos em todo o continente.
Propagandas emitidas na TV em países tão distantes como a África do Sul recomendavam que as pessoas não comessem morcegos, uma iguaria em algumas partes da África Ocidental, onde são defumados, grelhados ou preparados em sopa.
A relação entre o ebola e os morcegos já levou algumas pessoas a deixarem de visitar o parque Kasanka, na Zâmbia, disse Willems. Ele calcula que o número de turistas que observa os morcegos caiu até um quinto neste ano.
A Kasanka Trust Ltd., que administra o parque, disse em comunicado no dia 15 de outubro que “não há risco” na observação de morcegos.
De volta à plataforma na árvore, o som estridente dos morcegos que estão voltando preenche o ar. Pela segunda manhã consecutiva, apenas dois turistas estão testemunhando o espetáculo.
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1. Descoberta
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1/20 (Domínio Público/Wikimedia)
O vírus ebola foi descoberto por cientistas em 1976. Naquela ocasião, houve dois surtos da doença em diferentes locais da África. Um deles em Nzara, no Sudão. O outro em Yambuku, na República Democrática do Congo. A segunda localidade ficava perto do Rio Ebola, que terminou dando nome à doença causada pelo vírus. As informações são da Organização Mundial da Saúde (
OMS).
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2. Contágio
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2/20 (Rodger Bosch/AFP)
Para ser infectada pelo vírus ebola, uma pessoa precisa entrar em contato com sangue, suor, saliva ou outros fluidos corporais de pessoas ou animais contaminados. "Ebola não é uma doença transportada ou transmitida pelo ar", explicou em entrevista a EXAME.com Fredi Quijano, epidemiologista da
Universidade de São Paulo.
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3. Sintomas
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3/20 (AFP)
A doença causada pelo vírus ebola é caracterizada por febre, fraqueza intensa e dores musculares, de cabeça e de garganta. "Isso é seguido de vômitos, diarreia e perda da função dos rins e do fígado", afirmou em entrevista a EXAME.com Fredi Quijano, epidemiologista da Universidade de São Paulo. Segundo ele, os pacientes também apresentam quadros de hemorragia interna e externa em alguns casos.
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4. Tratamento
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4/20 (Christopher Black/AFP)
O tratamento oferecido a pessoas infectadas por ebola deve consistir em reidratação intravenosa ou por via oral. A recomendação é da OMS. Além disso, a organização afirma que é positivo o tratamento dos sintomas específicos da doença – como febre e dor. "Nenhum tratamento licenciado até o momento se mostrou eficaz em neutralizar o vírus", afirma a OMS em seu site.
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5. Mortalidade
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5/20 (WHO/Tarik Jasarevic/Divulgação via Reuters)
A OMS afirma que o nível médio de mortalidade registrado nos surtos de ebola registrados até hoje é de cerca de 50%. Porém, há registros de epidemias com níveis de mortalidade menores (na casa dos 25%) e maiores (perto de 90%) do que isso.
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6. Transmissão
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6/20 (Pascal Guyot/AFP)
"Há pouca chance de transmissão de ebola enquanto o paciente não manifeste os sintomas", afirmou em entrevista a EXAME.com Otília Luz, médica infectologista ligada à Fiocruz. De acordo com a OMS, uma pessoa infectada pelo vírus pode demorar até 21 dias para manifestar os primeiros sintomas.
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7. Surtos
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7/20 (Dominique Faget/AFP)
Da descoberta do vírus ebola até hoje, a OMS contabiliza mais de 15 surtos da doença. Em geral, eles aconteceram em vilas isoladas perto de florestas tropicais na África Central. Entretanto, o atual surto da doença (que começou a ser monitorado pelo órgão no fim de março) acontece tanto em regiões rurais quanto zonas urbanas da costa oeste da África.
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8. 2014
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8/20 (Pierre-Philippe Marcou/AFP)
O número de casos e mortes causados por ebola em 2014 supera a quantidade de ocorrências do tipo registradas em todos os outros surtos da doença desde sua descoberta em 1976. De acordo com a OMS, Guiné, Libéria e Serra Leoa foram os países mais afetados pela epidemia até o momento. Também registraram casos da doença o Senegal, a Nigéria e outros países – como Espanha e Estados Unidos.
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9. Diagnóstico
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9/20 (Pornchai Kittiwongsakul/AFP)
Atualmente, o diagnóstico de contaminação pelo vírus ebola depende da manifestação de sintomas pelo paciente – que pode demorar até três semanas. Por conta disso, o Pentágono desenvolveu um novo método para confirmar os casos da doença. Baseado na análise de amostras sanguíneas, a técnica é capaz de identificar um caso de ebola em cerca de quatro horas.
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10. Vacina
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10/20 (Steve Parsons/Pool/Reuters)
A multinacional britânica GlaxoSmithKline (GSK) desenvolve em parceria com órgãos do governo americano uma vacina para tentar conter o atual surto de ebola. Criado há cerca de uma década, o projeto teve seu andamento acelerado em função da epidemia.
Material genético e uma versão enfraquecida do vírus são os componentes da vacina. Juntos, eles estimulam o corpo a produzir anticorpos para a doença. O medicamento foi testado com sucesso em macacos em 2010.
Em setembro, pacientes que participaram dos primeiros testes com o medicamento não apresentaram reações adversas. Além da GSK, a Johson & Johnson também trabalha numa vacina contra o vírus ebola.
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11. Favipiravir
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11/20 (Philippe Huguen/AFP)
O favipiravir é um medicamento desenvolvido para combater o vírus influenza, que causa gripe. Em testes com ratos realizados por pesquisadores europeus, a droga protegeu os animais da contaminação pelo vírus ebola. No mês que vem, o Instituto Francês de Saúde e Investigação Médica vai começar a testar o favipiravir contra Ebola em humanos. O tratamento experimental vai consistir em dosagens elevadas da droga, que tem como grande vantagem o fato de poder ser ministrada na forma de comprimido.
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12. Cepas
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12/20 (Frederick Murphy/CDC/Handout via Reuters)
Um estudo publicado em abril na revista New England Journal of Medicine afirma que a atual epidemia de ebola é causada por uma nova versão do vírus.
Entre as características dessa cepa, está a menor ocorrência de quadros de hemorragia entre os pacientes infectados. Eles eram mais comuns entre os contaminados pelos cinco tipos já conhecidos de ebola.
Segundo os cientistas, os primeiros casos de pessoas contaminadas pela nova variação do vírus datam de dezembro do ano passado.
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13. Mutações
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13/20 (Cynthia Goldsmith/AFP)
Cientistas da universidade de Harvard e do Instituto de Tecnologia do Massachussets analisaram 99 amostras da versão do vírus ebola característica do surto atual.
No trabalho, eles identificaram 300 diferenças genéticas em relação a versões do vírus presentes em surtos anteriores.
As amostras foram fornecidas por 78 pacientes de Serra Leoa que foram diagnosticados com a doença nos 24 primeiros dias de epidemia. Um artigo sobre o experimento foi publicado em agosto na revista Science.
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14. Economia
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14/20 (Getty Images)
Os Produtos Internos Brutos de Guiné, Libéria e Serra Leoa devem encolher entre 1% e 1,5% em 2014 por conta da epidemia de ebola nesses países. A projeção foi divulgada pelo Banco Africano de Desenvolvimento. Outro cálculo, feito pelo Banco Mundial, afirma que o impacto econômico gerado pela doença pode ultrapassar a marca dos 30 bilhões de dólares.
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15. França
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15/20 (Alastair Miller/Bloomberg News)
Um estudo realizado pela universidade britânica de Lancaster calculou a probabilidade do vírus ebola chegar à França e Grã-Bretanha. Segundo os cientistas, as chances de ebola chegar a esses países até 24 de outubro estavam em torno de 75% e 50%, respectivamente. Porém, com a redução do número de voos entre esses locais e os países onde acontece a epidemia, esses índices caíram para 25% para França e 15% para Grã-Bretanha.
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16. Transfusões
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16/20 (Marcello Casal Jr./ABr)
A OMS autorizou no começo de setembro que terapias baseadas em transfusões sanguíneas fossem usadas no tratamento de ebola. A ideia da técnica é que pacientes contaminados recebam sangue de pessoas que já se recuperaram da doença. Assim, o doente passa a contar com anticorpos para combater o vírus. Esse tipo de tratamento foi testado com sucesso nos EUA em Rick Sacra, missionário cristão de 51 anos contaminado na Libéria.
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17. Doenças
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17/20 (James Gathany / CDC)
Uma projeção de cientistas da Escola Londrina de Higiene e Medicina Tropical estimou que o surto de ebola na Guiné, Libéria e Serra Leoa pode aumentar de 100 mil para 400 mil o número de mortes causadas por malária. A razão disso seria a sobrecarga dos sistemas de saúde da região e a morte de médicos e enfermeiros, que fragilizariam o tratamento dos pacientes com outras doenças nos hospitais.
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18. Epidemia
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18/20 (Bindra/Unicef)
Estimativas realizadas pela ONG Save The Children indicavam que, a cada hora, o vírus ebola contamina cinco pessoas em Serra Leoa. Segundo a organização, há apenas 327 leitos no país, que está no centro da epidemia da doença. De acordo com as projeções, se nada for feito, o número de novos casos de ebola por hora em Serra Leoa poderia subir de cinco para dez até o fim de outubro.
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19. Desconhecimento
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19/20 (Samaritans Purse/Divulgação via Reuters)
Mais de mil pessoas participaram de uma pesquisa realizada em agosto pela universidade de Harvard. Nela, quatro em cada 10 entrevistados afirmaram que temem a possibilidade de uma grande epidemia de ebola nos Estados Unidos.
Além disso, 26% dos participantes disseram que estão preocupados com a possibilidade de serem infectados (ou ter alguém da família nessa situação) no próximo ano.
Num sinal de desconhecimento da doença, quase 70% dos entrevistados disseram que o ebola é um vírus de fácil transmissão e um terço dos participantes afirmou que existe remédio para a doença.
As duas informações não correspondem à realidade, já que a transmissão de ebola depende de um contato com fluidos contaminados pelo vírus e não há medicamentos que curem a doença.
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20. ZMapp
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20/20 (Reuters)
Criado pela empresa Mapp Biopharmaceutical, o ZMapp é um medicamento experimental usado no tratamento de ebola. O soro é composto basicamente de anticorpos que, quando ministrados a pessoas ou animais infectados, têm apresentado resultados positivos no combate à doença.
Em testes realizados com macacos 24 horas após a contaminação por ebola, o ZMapp apresentou 100% de eficácia (isto é, nenhum macaco morreu). Já em experimentos com macacos realizados 48 horas após a infecção, só metade dos animais sobreviveu.
O ZMapp já foi usado com sucesso para tratar americanos com ebola na África.