Tecnologia

Criador do Twitter busca um antídoto à internet extremista

Ev Williams lê mais livros e revistas e investe no Medium como uma resposta ao lado negro das mídias sociais

Ev Williams: um dos fundadores do Blogger e do Twitter e executivo-chefe do Medium, ele transformou a maneira como milhões publicam e consomem informações on-line

Ev Williams: um dos fundadores do Blogger e do Twitter e executivo-chefe do Medium, ele transformou a maneira como milhões publicam e consomem informações on-line

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Da Redação

Publicado em 22 de maio de 2018 às 17h40.

Última atualização em 22 de maio de 2018 às 18h59.

Por anos, Ev Williams se viu cercado de dúvidas.

Como um dos fundadores do Blogger e do Twitter e, mais recentemente, como executivo-chefe da plataforma de publicação digital Medium, Williams transformou a maneira como milhões de pessoas publicam e consomem informações on-line.

À medida que seu império crescia, no entanto, ele começou a ter um pressentimento de que alguma coisa não ia bem. Editores de alta qualidade estavam perdendo público para fábricas de factoides. Os usuários gastavam muito tempo nas redes sociais, mas não ficavam necessariamente mais felizes ou mais bem informados. As plataformas construídas para dar poder às massas vinham, em vez disso, premiando extremistas e aqueles que apenas buscavam atenção a qualquer custo.

Williams não desistiu do Twitter, seu maior e mais influente projeto até agora. (Ele deixou a empresa em 2011, mas permanece no conselho e ainda é um acionista importante.) Ainda acredita que, no geral, um mundo com mídias sociais é melhor do que um sem. Um ano atrás, porém, começou a lamentar o fato de a internet estar “quebrada” – uma observação confirmada por, bem, basicamente tudo que aconteceu desde então.

“Acho que estava um pouco à frente de algumas pessoas na hora de ver o lado negro”, disse-me Williams recentemente.

Boa parte do Vale do Silício está chegando agora exatamente a essa fase. Nos últimos meses, os primeiros funcionários do Google, do Facebook e de outros gigantes da tecnologia já fizeram declarações públicas de seus arrependimentos, chamando os produtos que ajudaram a construir de excessivamente viciantes e destrutivos para a sociedade. Líderes da indústria, entre eles Mark Zuckerberg, executivo-chefe do Facebook, e Jack Dorsey, chefe do Twitter, fizeram exames de consciência. Este mês, o chefe do Google, Sundar Pichai, afirmou que a empresa estava fazendo uma “reflexão” sobre suas responsabilidades. E a revista New York publicou recentemente uma coleção de entrevistas com especialistas em tecnologia que vêm passando por crises de consciência chamada “A Internet Pede Desculpas”.

Porém, enquanto outros líderes da indústria de tecnologia entram no confessionário, Williams, de 46 anos, parece estar emergindo com uma nova perspectiva – uma mistura do antigo otimismo do Vale do Silício temperada com a cautela de um veterano do setor, que já viu produtos bem intencionados serem sequestrados por pessoas terríveis.

Recentemente, Williams me mandou um tipo de minimanifesto – um documento de duas páginas contendo seus pensamentos sobre o potencial da tecnologia, os problemas com a mídia financiada por anúncios e a regulamentação das plataformas de redes sociais. Nós continuamos a conversar em uma entrevista por telefone, na qual ele falou mais sobre suas ideias, algumas das quais vem pensando e refinando por anos, mas que ainda não haviam sido divulgadas.

Muitas das ideias mais recentes de Williams têm a ver com o negócio da publicidade digital, aliada com o crescimento das mídias sociais, que prendeu editores em uma competição feroz pela atenção das pessoas. Essa busca, que favorece naturalmente vozes mais altas e extremistas, por sua vez, levou mais organizações de mídia a publicar histórias sensacionalistas e de baixa qualidade.

“Quando uma editora ganha dinheiro apenas com anúncios, acaba sendo incentivada a gastar o mínimo possível enquanto maximiza a busca por atenção”, escreveu ele.

Repetindo o testemunho de Zuckerberg ao Congresso em abril, Williams disse que agora acredita que foi muito otimista durante o começo das redes sociais e não conseguiu perceber os riscos de colocar, com pouquíssima supervisão, ferramentas tão poderosas nas mãos dos usuários.

“Uma das coisas que vimos nos últimos anos é que a tecnologia não só acelera e amplifica o comportamento humano. Ela cria ciclos de retroalimentação que podem fundamentalmente mudar a natureza de como as pessoas interagem e as sociedades se movem (de algumas maneiras que provavelmente nenhum de nós foi capaz de prever)”, escreveu Williams.

Ele é apenas parcialmente um herege. Reconhece que as empresas de mídias sociais não fizeram o suficiente para promover conteúdo de qualidade, mas também culpa os editores por usar o sensacionalismo para aumentar o tráfego. E quando perguntei se ele concordava com a recente declaração de Zuckerberg de que “o mundo vai perder se o Facebook acabar”, ele hesitou.

“Honestamente não tenho uma resposta para isso. Acho que provavelmente está certo”, disse.

Mas se Williams ainda não está pronto para denunciar as redes sociais, ele pelo menos está diminuindo os efeitos em sua própria vida. Mesmo ainda usando o Twitter, desligou a maioria das notificações do celular e tenta deixar o telefone de lado quando está com os amigos ou os filhos. Hoje, lê menos notícias diárias e mais livros e artigos longos.

“Tem sido saudável para mim. Sinto os efeitos dessas ações”, contou.

Ouvir um arquiteto da internet, que vive em constante mudança, exaltar os benefícios dos livros e das revistas é um pouco estranho. Mas Williams não está sozinho entre os líderes tecnológicos em sua busca por regime mais leve e equilibrado de produtos da mídia. (Dorsey, executivo-chefe do Twitter desde 2015, fez um retiro de meditação silenciosa de dez dias em dezembro.)

O que quer que se pense de suas lamentações, vamos dar um crédito a Williams por pelo menos isto: como bilionário que já levou para casa uma grande parte da riqueza que conseguiu com a tecnologia, ele poderia estar filosofando em uma cabana nos trópicos. Em vez disso, arregaçou as mangas e está tentando consertar as coisas.

Agora, seu foco é a Medium, a editora digital que lançou em 2012. Por anos, a estratégia da Medium foi projetar uma plataforma de blogs elegantes, atraindo uma multidão ao seduzir celebridades e escritores para usá-la, e esperando que a publicidade pagasse as contas.

No ano passado, depois que essa estratégia se mostrou falha, a Medium dispensou parte de sua equipe e optou por um modelo de assinatura. Os usuários agora pagam US$5 por mês para acessar as histórias premium, e os escritores podem ganhar pequenas quantidade de dinheiro quando suas histórias conseguem um retorno positivo (conhecido como “palmas”) de outros usuários. (Para ficar claro, vários anos atrás, escrevi algumas histórias para a Medium, então periodicamente recebo alguns centavos quando alguém “aplaude” alguma das minhas publicações antigas.) A empresa também contratou editores humanos para melhorar o conteúdo.

“Esse é um problema muito específico causado pelo modelo econômico de publicação na internet. É isso que estamos tentando resolver”, explicou Williams.

Não é difícil ver o projeto de Williams para a Medium como um tipo de antídoto ao Twitter – uma tentativa de cultivar um espaço para ideias ponderadas e bem elaboradas que premiam a profundidade em detrimento do imediatismo. A Medium não é lucrativa, e eles se recusam a dizer quantos assinantes o site possui, mas Williams publicou em abril que eles têm cerca de 80 milhões de visitantes por mês, e um porta-voz da empresa afirmou que a receita das assinaturas está crescendo 50 por cento a cada trimestre.

Williams quer que as pessoas achem que a Medium é valiosa o suficiente para que paguem por seu conteúdo, mas não quer necessariamente que seja o tipo de site que o usuário visita dez vezes por dia. Ele se tornou fã do trabalho de Tristan Harris, antigo especialista em design ético do Google que criticou as qualidades viciantes de serviços populares na internet.

No começo das redes sociais, segundo Williams, “o vício era o objetivo”.

“Não como o cigarro – não era tão cínico. Era apenas um jogo, tipo: ‘Isso é divertido. Como podemos tornar isso mais divertido e viciante?'”

E quanto ao Twitter, que continua a ser um aplicativo altamente viciante com milhões de usuários compulsivos? Bom, disse, a empresa está trabalhando para consertar os problemas, entre eles excluir alguns dos mais nocivos infratores das regras do serviço. (Recentemente, ela solicitou propostas de ferramentas que ajudem a medir “a saúde das conversas”.)

No entanto, ele não está convencido de que os problemas com as plataformas sociais poderão algum dia ser totalmente resolvidos, nem acredita que as empresas de tecnologia devam ser as únicas obrigadas a lidar com eles. Em última análise, segundo Williams, os usuários é que precisam escolher e manter seus próprios regimes de obtenção de informações.

“O bufê é imenso. Se você comer tudo que está na sua frente, não vai necessariamente fazer as melhores escolhas”, compara ele.

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