Urna: "Em 5 minutos, descobrimos uma forma de desfazer o armazenamento embaralhado dos votos" (Elza Fiúza/ABr)
Da Redação
Publicado em 13 de agosto de 2014 às 06h00.
São Paulo - Você confia na urna eletrônica? Especialista em segurança digital e votação eletrônica e professor do Instituto de Computação da Unicamp, Diego Aranha não põe a mão no fogo pela maquininha. E ele diz ter motivos para isso.
Em 2012, Aranha participou de testes abertos realizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e detectou falhas no software da urna. Por conta disso, ele decidiu criar, para as eleições 2014, o Você Fiscal - app que se propõe a realizar uma apuração paralela do pleito.
Com meta inicial de captar 30 mil reais, o Você Fiscal já levantou cerca de 50 mil reais no site de financiamento coletivo Catarse.
Em entrevista a EXAME.com, o especialista explicou por que não confia no atual modelo de urna eletrônica e como funciona o app que está criando. A seguir, leia os melhores trechos do bate-papo
EXAME.com - Você confia na urna eletrônica?
Diego Aranha - Desde 2012, não confio. Naquele ano, participei de testes realizados pelo TSE que apontaram vulnerabilidades no sigilo do voto e na totalização dos resultados. O sistema é baseado num software que não fornece, ao eleitor, um recibo que diga em quem ele votou. Se alguém com acesso ao sistema o manipula, nenhum dos mecanismos de segurança disponíveis consegue barrar o ataque.
EXAME.com - Que falhas você detectou em 2012?
Diego Aranha - Detectei erros que 80% dos meus alunos conseguem resolver em provas. Tivemos cinco horas para analisar entre 10 e 20 milhões de linha de código. Em cinco minutos, descobrimos uma forma de desfazer o armazenamento embaralhado dos votos. Isso permite que você saiba em quem votou certo eleitor. Basta conhecer o horário em que ele foi à urna. Encontramos, ainda, falhas relacionadas à soma dos votos e outros problemas.
EXAME.com - E foi por isso que você decidiu criar o Você Fiscal?
Diego Aranha - Sim. O Você Fiscal será um app para Android. Em desenvolvimento há duas semanas, ele vai instruir o usuário a tirar uma sequência de fotos dos boletins de urna. Esses boletins chegam a ter dois metros de comprimento e relacionam todos os votos registrados por cada urna. No dia da eleição, teremos um servidor recebendo essas fotos e somando os votos. No fim, teremos uma base de dados comparável à do TSE.
EXAME.com - Quantos boletins devem ser analisados?
Diego Aranha - Ao todo, são cerca de 430 mil urnas. Para cada uma, haverá um boletim. Eu ficaria muito satisfeito se a gente tivesse de 3% a 5% dos boletins de urna. Seria um número bem significativo. Ainda mais se a gente considerar o viés específico dos eleitores com smartphone Android no Brasil.
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EXAME.com - E em quanto tempo vocês esperam encerrar essa apuração paralela?
Diego Aranha - Uma coisa que a gente não vai ter é pressa. Nossa intenção é tentar publicar os dados entre o primeiro e o segundo turno. Eleições não precisam bater recorde de velocidade. Nosso objetivo não é fazer como o TSE, que oferece rapidamente um resultado que não pode ser verificado. Tanto que as fotos e o nosso código-fonte estarão disponíveis na internet.
EXAME.com - Existe algum planejamento em relação a fotos falsas e outros problemas que possam acontecer?
Diego Aranha - Temos um grupo que vai monitorar possíveis casos de fotos alteradas de boletins. Além disso, partidos e Justiça Eleitoral têm acesso a cópias físicas dos boletins. Então, no caso de uma discrepância muito grande entre os nossos resultados e os oficiais, podemos enviar uma notificação à Justiça pedindo esclarecimentos.
EXAME.com - Vocês se preocupam com essa possibilidade?
Diego Aranha - Estamos trabalhando com muita cautela e responsabilidade. Nosso objetivo não é criar ruído. As fotos não têm valor jurídico, mas podem servir como indício se algo estranho acontecer. E, em último caso, temos o documento oficial da Justiça para resolver qualquer discrepância.
EXAME.com - Como o Você Fiscal está sendo recebido pela sociedade?
Diego Aranha - Vou ser sincero: a gente não esperava nem bater meta no Catarse. Fiz um vídeo bem porquinho e a coisa deu mais certo do que eu imaginava. Temos uma página com 3 mil likes no Facebook, 30 mil visualizações do vídeo que explica o app e mais de 800 pessoas que já doaram dinheiro para nossa ideia. Acho que, para quem doou, não faz sentido não usar.
Resposta do TSE
Procurado por EXAME.com, o TSE informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que a urna eletrônica é segura, tem "100% de eficácia comprovada" e, por isso, não deve passar por testes ou mudanças drásticas nos próximos meses.