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A possível inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet e os impactos para o futuro

Decisão do STF pode mudar regras de responsabilidade civil de plataformas, com possíveis impactos na liberdade de expressão e na gestão de conteúdos online

STF inicia julgamento: decisão pode redefinir regras para plataformas digitais e o artigo 19 do Marco Civil da Internet (Fellipe Sampaio /SCO/STF/Flickr)

STF inicia julgamento: decisão pode redefinir regras para plataformas digitais e o artigo 19 do Marco Civil da Internet (Fellipe Sampaio /SCO/STF/Flickr)

Publicado em 26 de novembro de 2024 às 15h59.

Última atualização em 26 de novembro de 2024 às 16h00.

Há quem defenda que, caso seja confirmada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que estabelece o regime de responsabilidade civil das plataformas de internet pelo conteúdo gerado por seus usuários, a sociedade ficará livre de atos criminosos, imorais ou delinquentes cometidos no ambiente online.

Por esse raciocínio, bastaria uma decisão do Judiciário para que o comportamento humano sofresse uma metamorfose, sem se considerar todos os fatores políticos, socioeconômicos, culturais e antropológicos que regem o comportamento das pessoas tanto na vida real quanto no ambiente online.

Isso ocorre porque se tem atribuído à opção legislativa atual a causa preponderante para a disseminação de conteúdo ilegais nas redes sociais. Conforme a redação vigente artigo 19 do Marco Civil da Internet, um conteúdo só deve ser retirado do ar após uma decisão judicial específica.

A solução agora cogitada é a responsabilizar as plataformas independentemente de ordem judicial, caso estas não removam proativamente conteúdos que caracterizem violação à lei. O que se deseja é que a remoção de conteúdo passe a ser gerida pelas plataformas sem ingerência ou participação do Judiciário, bastando a mera notificação por um terceiro.

É relevante que se recorde que já há iniciativas legislativas – como o Projeto de Lei 2630/2020 (Projeto de Lei das Fake News) – que pretendem revisar o Marco Civil da Internet mediante um processo participativo e democrático, que deve ser incentivado.

É nesse sentido a manifestação do Senado ao STF. O objetivo é que seja respeitada a opção do legislador como corolário de um processo legítimo, participativo, estruturado e ponderado. Esse processo não pode estar sujeito à interferência do STF na ausência de deficiências no processo decisório do Congresso.

Não se desconsidera, obviamente, a massificação da comunicação possibilitada com o advento e o crescimento da amplificação de discursos individuais ou coletivos pelas plataformas de internet, que possibilitam ao cidadão comum, bem ou mal-intencionado, ter uma audiência que não teria no passado.

Contudo, foi o mesmo sistema de responsabilidade civil criado pelo Marco Civil da Internet, hoje criticado, que possibilita que vozes dissonantes não sejam caladas. Desta forma, a liberdade de se expressar, de se informar e ser informado e a de criticar não fica sujeita à censura prévia. Quando necessário, exige-se a atuação do Judiciário para dirimir questões limítrofes entre direitos e garantias constitucionais.

Não obstante o Marco Civil da Internet tenha sido internacionalmente reconhecido como uma legislação moderna, equilibrada e bem-sucedida, há quem sugira também a importação de alternativas legislativas milagrosas.

Nessa toada, o Digital Services Act, promulgado pela Comunidade Europeia como um conjunto de regras para regular as atividades das plataformas de internet, é relativamente prematuro para ser utilizado como paradigma, pois entrou em vigor em fevereiro de 2024.

Já a regra alemã, conhecida como Lei de Fiscalização de Redes, a NetzDG, de 2018, tem sido utilizada como inspiração para a criação de legislações em países cuja liberdade de expressão é duramente assolada, como Rússia e Turquia.

Ainda que estejamos diante de fatos gravíssimos, cuja repressão deve ocorrer de maneira enérgica para a preservação das liberdades e garantias constitucionais de cada cidadão, não devemos sucumbir à tentação de oferecer uma solução imediata sem se aquilatar adequadamente os possíveis impactos no médio e longo prazo para a sociedade.

No campo regulatório, a proposta deve mirar a prevenção de conflitos, mas não se valer de fatos anômalos como fator determinante para a criação de novas obrigações às plataformas de internet.

A salvação da sociedade não virá de uma decisão do STF. Quiçá surgirá de um movimento de restauração dos valores democráticos, em um novo pacto social, no qual o ser humano deverá ser o centro das atenções num processo de revisão e modernização das regras atinentes ao convívio no ambiente virtual.

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