Peça de Lucas Leão: da alfaiataria para o mundo virtual (Divulgação/Exame)
Julia Storch
Publicado em 13 de maio de 2021 às 05h18.
Um tênis por 12 dólares. Até para uma marca popular, e mesmo com a alta do câmbio, seria um preço módico. Esse foi o anúncio da Gucci, grife italiana desejo do momento, em março deste ano. Foi um furor na internet, com os fãs enlouquecidos atrás do logo GG, e que logo depararam com um item digital, sem a versão física para desfilar nas ruas ou mesmo em casa.
Roupas digitais já existem há um bom tempo. Foram criadas para vestir avatares de videogames, as chamadas skins, e logo atraíram grandes maisons, como a própria Gucci, que já lançou collabs com jogos online. Foi o caso do Tennis Clash, em que jogadores podiam vestir seus avatares com saias, viseiras, jaquetas e raquetes da grife, e com a febre do Pokémon Go, em que a grife italiana se uniu à marca de casacos esportivos The North Face. Assim como a Louis Vuitton e suas peças virtuais e coleções físicas com temática de League of Legends, o game mais jogado do mundo, e a Moschino com The Sims.
Marcas de luxo expandem portfólios e aumentam a oferta de itens de entrada com maquiagens e perfumes. Com as peças digitais, o movimento é semelhante. “As roupas digitais são um meio de comunicação com o público mais novo e uma forma de as marcas entenderem outras possibilidades de mercado que têm crescido muito com o mercado de games”, explica Mariana Santiloni, manager of client services da WGSN.
Além dos jogos, a pandemia foi outro fator que acelerou o movimento da moda digital e da profissão de alfaiates digitais. Sim, você leu certo, alfaiates digitais. Na Europa já existem cursos de moda digital, como na consagrada escola de moda London College of Fashion e no Instituto de Moda de Amsterdam. No Brasil, designers e estilistas utilizam as habilidades do métier físico para desenvolver, neste caso, peças pixeladas.
O carioca Lucas Leão vem produzindo tanto roupas digitais quanto peças físicas, com estampas que confundem à primeira vista a qual dimensão pertencem. Mas se engana quem pensa que para fazer roupas digitais basta saber usar um software. “Aprendi a costurar com o meu avô, que era alfaiate. Para fazer roupas digitais é preciso saber fazer roupas físicas também, para entender o caimento e as texturas, por exemplo”, diz.
Para a São Paulo Fashion Week de 2019, Leão fez parceria com Gabriel Massan e Lucas Guimarães, artistas digitais brasileiros, para lançar uma estamparia digital. O trio acabou apresentando também avatares usando peças digitais. Em abril deste ano, o marketplace Shop2gether escolheu Leão para participar de uma campanha de novos designers. Para o site, ele desenvolveu três peças, como um casaco tipo puffer preto brilhante que custava 120 reais e um vestido curto de 150 reais imitando as centenas de braços de uma anêmona. Para a compra, é preciso enviar uma foto para que a peça digital seja adicionada ao corpo do cliente, que recebe então a imagem devidamente alterada e vestida.
O designer lançou ainda uma camiseta branca básica por 180 reais. Ao direcionar o celular com o filtro criado em parceria com a Shop2gether, quatro opções de estampas aparecem na peça. Para Ana Isabel Carvalho Pinto, fundadora do site, o item é o mais aceito pelos consumidores. “A camiseta tem o fator de ser palpável, é mais fácil para as pessoas entenderem como funciona. Já a roupa digital desperta curiosidade, mas ainda não está no cotidiano das pessoas.”
Peças digitais estão em alta, mas mudanças podem estar a caminho. Nos Estados Unidos tem crescido a busca por sapatos de salto alto, por exemplo. Sinal de que o estilo pandêmico pode estar saindo de moda? Veremos.