Fábrica da BRF: perdas com a greve dos caminhoneiros e o embargo de importadores (Germano Lüders/Exame)
Da Redação
Publicado em 1 de agosto de 2019 às 05h42.
Última atualização em 1 de agosto de 2019 às 11h01.
O Brasil caminha para mais um ano de baixo crescimento — a previsão é de algo em torno de 0,8%, segundo os economistas ouvidos no mais recente relatório de mercado Focus, do Banco Central.
Se isso se confirmar, será uma taxa inferior à do ano passado, quando o PIB brasileiro teve uma modesta expansão de 1,1%. Apesar do lento avanço da economia, o último ano não foi perdido para a maior parte da elite empresarial do país.
Um levantamento inédito de MELHORES E MAIORES 2019, edição que chegará às bancas na segunda quinzena de agosto, aponta que 309 das 500 maiores empresas que atuam no Brasil expandiram as vendas em 2018, ante 254 no ano anterior.
Ao todo, 66 companhias fecharam o último balanço anual com prejuízo, uma ligeira melhora em relação às 80 empresas que terminaram no vermelho em 2017.
Com perda superior a 1,1 bilhão de dólares, a empresa de bens de consumo BRF teve o maior prejuízo líquido no ano passado.
Um dos fatores que atrapalharam os negócios da companhia foi a greve dos caminhoneiros ocorrida no mês de maio e que desarranjou a economia. “A paralisação dos caminhoneiros atingiu com mais força as empresas muito dependentes da logística. Os efeitos foram sentidos não somente durante a greve como também nas semanas posteriores”, diz Vitor Velho, economista da LCA Consultores.
“A BRF teve parte da produção perdida. O atraso de um dia no recebimento de ração compromete a operação, já que os processos, como o abate das aves, devem ser cumpridos rigorosamente.”
No relatório para investidores sobre o desempenho do ano passado, a BRF, além de reconhecer os impactos da greve, apontou outros fatores que pesaram para o resultado negativo. O primeiro deles foi a exclusão de 12 fábricas da lista de estabelecimentos aprovados para exportar à União Europeia.
A proibição ocorreu em decorrência da Operação Trapaça, deflagrada em março de 2018 pela Polícia Federal, que investiga supostas fraudes envolvendo fiscalização sanitária.
Também prejudicaram o negócio a imposição de tarifas antidumping pela China e a suspensão das importações pela Rússia de carne suína e bovina do Brasil.
Num período de curto a médio prazo, a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China pode ajudar na recuperação da BRF. “As divergências entre as duas potências podem favorecer a agropecuária brasileira, beneficiando quem exporta para o mercado chinês”, afirma Velho.
Também há o surto de peste suína, que está diminuindo a produção asiática. “Vamos investir em torno de 170 milhões de reais nos próximos 12 meses para aumentar a produção para a China”, diz Eduardo Takeiti, diretor de relações com investidores da BRF.
Entre as empresas que não tiveram o que comemorar em 2018, chama a atenção a presença do setor de energia — responsável por seis dos dez maiores prejuízos do ano.
Não deixa de ser uma situação paradoxal, uma vez que algumas empresas de energia também estiveram entre as que mais lucraram no ano passado.
A Biosev, produtora de etanol, energia elétrica e açúcar do grupo francês Louis Dreyfus, teve um prejuízo de 325 milhões de dólares em 2018, um resultado que atribui à variação cambial.
O dólar na última safra de cana fechou cotado em 3,90 reais, ante 3,30 na safra anterior. “Como 89% de nossa dívida está em dólar, a mudança do câmbio gerou um efeito importante. No entanto, como o primeiro vencimento da dívida será somente em 2021, o prejuízo do ano passado é meramente um efeito para lançamento contábil”, diz Gustavo Theodozio, diretor financeiro da Biosev.
Segundo ele, se desconsiderada a variação do câmbio, o resultado em 2018 foi positivo. “Mesmo com uma moagem menor, nossa margem Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização] subiu 2,2 pontos percentuais em comparação com a safra anterior.”
Além da Biosev, outras empresas do setor que tiveram os maiores prejuízos no ano passado foram a Santo Antônio Energia, a Ceron Energisa, a Energia Sustentável do Brasil, a CEEE e a Amazonas Energia.
Independentemente das características de cada uma, o mercado de energia sofre há anos com o modelo regulatório.
Para José Ricardo de Oliveira, líder de energia elétrica e utilidades da consultoria EY, a Medida Provisória número 579, editada em 2012 pelo governo de Dilma Rousseff para reduzir as tarifas ao consumidor, continua provocando efeitos negativos. “Ainda estão vigentes contratos fechados naquela época. Entre outros problemas, eles estão causando uma forte migração dos grandes consumidores para o mercado livre, forçando as distribuidoras a se livrar de uma energia já contratada”, afirma Oliveira. “Há necessidade de reequilibrar a geração e o consumo.”