Região de Mata Atlântica, no Rio de Janeiro: investir em sustentabilidade é ainda mais relevante para empresas que dependem de recursos naturais (Frans Lanting/Corbis)
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2012 às 06h00.
São Paulo - Logo que a multinacional alemã henkel — dona de marcas como Super Bonder e Pritt — comprou a Alba Adesivos, fabricante de colas do interior de São Paulo, em 2006, seus executivos receberam uma missão.
Seguindo as práticas da matriz, a primeira grande tarefa era eliminar o uso do solvente toluol, o que dava à Cascola Tradicional, carro-chefe dos produtos da Alba, o cheiro característico da “cola de sapateiro”.
Do início ao fim, a mudança na fórmula do produto envolveu custos. Primeiro, encontrar o substituto ideal para o toluol. Depois, absorver os gastos com a produção, encarecidos em 10%, sem aumentar o preço final.
O mais difícil, no entanto, foi convencer uma legião de marceneiros, principal público do produto, de que o cheiro diferente da nova versão lançada em 2009 não era sinônimo de cola mais “fraca”. Foi necessário organizar cursos e palestras para 40 000 marceneiros de norte a sul do país sobre as vantagens do produto e como usá-lo adequadamente.
“Felizmente, a ideia pegou”, diz Sérgio Crude, responsável pela área de sustentabilidade da empresa. Segundo a Henkel, as vendas caíram no ano da mudança, mas voltaram a subir nos anos seguintes.
Custos adicionais com substituição de matérias-primas ou aperfeiçoamento de processos produtivos são considerados pelo alto escalão das grandes companhias a principal barreira para a adoção de medidas ambientalmente responsáveis, aponta um levantamento exclusivo realizado pela Confederação Nacional da Indústria com 60 presidentes, vice-presidentes e diretores de sustentabilidade brasileiros.
A pesquisa Os Desafios da Sustentabilidade na Indústria Brasileira indica também que o país ainda sofre com a pouca valorização dada ao tema da sustentabilidade. Embora as pesquisas mais recentes sugiram que mais da metade dos brasileiros ouvidos está disposta a pagar mais por um produto ambientalmente correto, na prática o que se vê é o oposto.
Menos de um quinto opta pelas alternativas mais sustentáveis ou deixa de lado produtos nocivos ao meio ambiente. “Não dá para esperar que o consumidor desembolse além de 10% mais por um produto verde”, diz Alfred Hackenberger, presidente da Basf no Brasil.
Nem mesmo empresas dedicadas a vincular a marca à sustentabilidade, como a fabricante de cosméticos Natura, enxergam nesse atributo isolado o grande atrativo para o consumidor. No Brasil, a proposta verde é apenas parte da história.
A situação é semelhante para quem tem o governo como cliente. As medidas adotadas para mitigar os efeitos ambientais custam, em geral, até 1,5% do valor das grandes obras executadas pela construtora Camargo Corrêa. O problema é que esse acréscimo não é levado em conta pelos contratantes.
“Chegamos a abrir mão de margem para manter os preços competitivos”, diz Marcelo Bisordi, vice-presidente de relações institucionais da construtora. Para a maioria dos executivos ouvidos pela CNI, as regras do jogo deveriam mudar.
O governo, dizem os entrevistados, poderia ser o indutor de práticas sustentáveis. “Além do preço, as licitações públicas deveriam atribuir valor a critérios mínimos de sustentabilidade. Isso é política pública, não subsídio”, avalia Adriana Machado, presidente da americana GE no Brasil.
Mesmo sabendo que o governo e o consumidor não desembolsam mais por um serviço ou produto sustentável, muitas empresas decidem correr atrás de alternativas para viabilizar seus projetos verdes.
“Desenvolver tecnologias que permitam cortar custos é uma. Montar projetos em parceria com fornecedores, em que cada lado assume parte dos custos, é outra”, diz Marcelo Martins, presidente da multinacional do setor agrícola Cargill no Brasil.
Para muitas empresas, ignorar a busca por práticas mais sustentáveis não é uma opção — por questões que vão desde possíveis danos para a imagem até a crença de que em breve a tal cultura pró-sustentabilidade irá criar raízes por aqui.
“É uma questão de tempo”, afirma Kami Saidi, diretor de sustentabilidade da fabricante de computadores HP. Há seis anos a empresa recolhe e recicla equipamentos descartados pelos consumidores.
Os cartuchos de tinta novos têm 70% de componentes reutilizados, mas os ganhos com o reaproveitamento não cobrem nem 10% dos custos. Quase tudo é bancado com o objetivo de a HP ser reconhecida quando o movimento dos consumidores conscientes se tornar mais evidente.
A onda verde
Essa aposta é uma tendência mundial. Segundo uma pesquisa da escola de negócios Sloam, do Massachusetts Institute of Technology, a percepção de que os consumidores vão preferir produtos sustentáveis foi o fator crucial para a adoção de práticas verdes para 41% das 3 000 empresas ouvidas.
De acordo com um levantamento da consultoria americana PricewaterhouseCoopers com 17 dos maiores fundos de private equity, adotar ações sustentáveis gera valor para as companhias que compram. A maior parte dos presidentes ouvidos pela CNI vai na mesma linha.
No total, quase 40% afirmam que deixar de agir de forma sustentável pode custar a sobrevivência do negócio. “Investir em práticas ambientalmente mais corretas é um caminho sem volta”, diz Walter De Simoni, presidente da mineradora Anglo American no Brasil.
Ainda de acordo com a pesquisa CNI, dois terços das empresas ouvidas reconhecem que a adoção de práticas sustentáveis tem um forte impacto sobre a imagem.
“Desdenhar a sustentabilidade pode causar um dano irreparável”, afirma Robson Braga, presidente da CNI. Apesar da percepção generalizada de que o tema é estratégico, basta assistir a comerciais de televisão e comparar o que dizem as empresas e o que elas efetivamente fazem para constatar que ainda existe muita gente que confunde sustentabilidade com ações de marketing.
Há também aquelas que tentam desviar a atenção de suas verdadeiras obrigações — são, por exemplo, grandes consumidoras de eletricidade sem nenhuma meta para aumentar a eficiência energética, mas que montam programas ambientais voltados para outros temas e fazem um grande alarde disso.
No caso de algumas companhias dependentes de recursos naturais, porém, os investimentos em sustentabilidade são inevitáveis. “Sem reflorestamento, simplesmente ficamos sem matéria-prima”, diz Paulo Brant, presidente da Cenibra, do setor de celulose.
O exemplo da fábrica da Unilever na cidade mineira de Pouso Alegre, onde são produzidos caldos, molhos e produtos derivados de soja, mostra que nem sempre sustentabilidade é sinônimo de custos maiores. Para dar conta da demanda, a empresa decidiu construir uma nova caldeira, que será inaugurada em agosto.
A opção por instalar uma movida a biomassa no lugar de uma tradicional, alimentada a óleo diesel, vai sair 60% a mais. A partir do quarto ano de operação, no entanto, a caldeira alimentada por restos de madeira se tornará mais barata.
Além de, no longo prazo, baixar os custos, a empresa se livrou do que poderia se transformar mais adiante em um passivo ambiental — um fator cada vez mais presente nos cálculos de parte do meio empresarial brasileiro.