João Pedro Cury, CEO do Grupo Santa Clara: a governança corporativa é um pilar essencial da sua gestão (Grupo Santa Clara/Divulgação)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 25 de julho de 2024 às 06h00.
O agronegócio brasileiro é tech, é pop... Mas é, sobretudo, familiar. Atualmente, apenas 24% dos líderes da atual geração à frente das empresas familiares no Brasil têm um plano de sucessão bem estruturado, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Entre eles está o CEO do Grupo Santa Clara, especializado em bioinsumos e fertilizantes e que controla Santa Clara Agrociência, Hydromol, Linax e Inflora Biociência. Fundado em Ribeirão Preto, em São Paulo, e com foco no setor de nutrição e proteção vegetal, além do desenvolvimento de pesquisas — a empresa tem seis depósitos de patentes no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi), sendo uma patente concedida até o momento —, o Grupo Santa Clara atua há mais de 50 anos no mercado.
Presente na empresa desde 2011, mas como CEO do grupo desde 2017, João Pedro Cury entende como ninguém as dores e os desafios de suceder ao fundador, seu pai, que ficou à frente da companhia por mais de 40 anos.
Engenheiro agrônomo, o CEO entrou na companhia depois de terminar o mestrado em produção vegetal (Fitotecnia) na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e cursar MBA em administração de organizações na Universidade de São Paulo (USP).
Em entrevista à EXAME, Cury traça a estratégia que permitiu elevar o faturamento do grupo de 5 milhões para 200 milhões de reais nos últimos sete anos, por meio de rebranding e parcerias estratégicas voltadas para a inovação, em um setor que cresceu 15% em 2023, de acordo com pesquisa realizada pela CropLife Brasil, e conta como o grupo investiu na governança corporativa para fazer uma sucessão familiar bem-sucedida.
Neste ano, você completa 13 anos de Grupo Santa Clara e sete anos à frente como CEO. Como era o grupo em 2011?
Pequena, com um faturamento de aproximadamente 5 milhões de reais anuais, liderada por meu pai, já em idade avançada e buscando um merecido descanso após anos de dedicação intensa. Inicialmente, a empresa tinha como funcionários apenas alguns vendedores de campo. Não possuía site nem participava de feiras do setor.
Depois de concluir meu mestrado, comecei a implementar mudanças, introduzindo novas práticas aprendidas nas disciplinas voltadas para o agronegócio, como fertilização e manejo de culturas. Colaborei com a equipe para atualizar materiais de apresentação e expandir nossa presença de mercado. Mantive os valores e os conceitos fundamentais estabelecidos por meus pais, mas modernizei e diversifiquei as operações para impulsionar o crescimento.
A participação na Agrishow, em 2011, foi a virada de chave da companhia?
Durante o evento, fizemos mais de 150.000 reais em vendas em apenas dois dias, superando os custos da feira e marcando um ponto crucial para a empresa. A partir daí, começamos a reformular nossos materiais de marketing e apresentações, atualizando a imagem da marca e adotando tecnologias.
Em 2013, ainda como gerente, propus à minha família a entrada no mercado internacional, apesar das dúvidas iniciais de meu pai sobre nosso marketing limitado no Brasil.
No entanto, eles reconheceram a necessidade de diversificar nossa base de clientes e minimizar a sazonalidade de nossas operações, que dependiam fortemente das vendas de safras específicas e pagamentos concentrados no final do ano. A decisão nos permitiu abrir novos mercados e aumentar as vendas internacionalmente.
Como é o papel de seus pais na empresa atualmente?
Minha mãe foi presidente do conselho até junho do ano passado. Foi nesse período que meus pais decidiram sair completamente do capital social da empresa, transferindo 99,9% das ações de forma igualitária para mim e minhas duas irmãs.
Minha mãe ficou com apenas 0,1% das ações, mas com o direito de veto dourado, que só se aplica se os irmãos decidirem vender mais de 50% da empresa. Atualmente, meu pai vai diariamente à empresa, e interage de forma informal com as pessoas. Ele ainda mantém o hábito de discutir o andamento geral dos negócios comigo pela manhã, porém sem entrar em detalhes de microgestão.
Como o Grupo Santa Clara planeja aproveitar o crescimento de 15% no setor de bioinsumos e quais são as estratégias de expansão?
Projetamos alcançar a marca de 1 bilhão de reais de faturamento até 2030, o que representaria um crescimento notável para o grupo. Em 2023, enquanto a maioria das empresas brasileiras de insumos agrícolas enfrentava desafios significativos, como as incertezas geopolíticas e climáticas, o Grupo Santa Clara registrou um crescimento excepcional de quase 20%.
Isso pode ser atribuído a alguns pilares estratégicos que implementamos, como a governança corporativa. Desde 2018, temos um conselho de administração independente e auditorias rigorosas anuais. Além disso, nossa capacidade de diversificar globalmente tem sido fundamental. Operamos em 31 países e atendemos a uma vasta gama de culturas agrícolas.
Quais estratégias de governança corporativa foram implementadas para a sucessão familiar?
Avançamos significativamente em governança corporativa ao estabelecer protocolos claros para a sucessão familiar no Grupo Santa Clara. Implementamos um conselho de família e um conselho de administração, além de criar diretrizes estruturadas para a entrada de futuras gerações na empresa — cada cargo dentro da organização possui critérios rigorosos estabelecidos.
Por exemplo, para qualquer descendente interessado em ocupar uma posição, um processo de seleção é conduzido com a participação de consultores externos. Essa consultoria independente garante que apenas os mais qualificados sejam selecionados para as funções, qualquer que seja o vínculo familiar.
O protocolo não apenas promove a meritocracia mas também garante uma preparação adequada, exigindo que todos os candidatos adquiram experiência externa de três anos antes de considerarem uma posição dentro do grupo.