Revista Exame

Sou o melhor gestor de ações, mas não espalhe

Com uma equipe formada por uma secretária e um assistente, Paulo Bodin é o melhor gestor de ações do Brasil - e, se você nunca ouviu falar nele, não é à toa

Paulo Bodin (André Valentim/EXAME.com)

Paulo Bodin (André Valentim/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.

Ao lado da ganância, a soberba é o pecado capital predileto dos profissionais do mercado financeiro. Basta conversar com um executivo do setor, escolhido ao acaso, para perceber que a vaidade, ali, corre em doses muito acima da recomendada a pessoas normais. Mesmo profissionais medianos se dizem inundados por um interminável "pipeline" de grandes transações - que, quase sempre, teimam em não se concretizar; os concorrentes não passam de beócios; e por aí vai. Essa atitude também pode ser explicada por razões de ordem prática. Aparecer bem na mídia e ser retratado como o gênio da vez ajuda a encantar potenciais clientes e a gerar negócios que podem representar alguns milhões a mais no fim do ano. Nesse panorama geral, poucos executivos destoam tanto da média de seus pares quanto o engenheiro elétrico Paulo Bodin. Aos 49 anos, Bodin é gestor de um fundo de ações, o Tempo Capital. Sua relação com os holofotes se dá na ordem inversa daquela observada na maioria de seus colegas. Recluso e tímido, ele teima em não dar entrevistas, não escreve artigos em jornais, não publica livros com suas lições de investimento, não dá as caras em palestras. E, paradoxalmente, Bodin é justamente aquele que teria lições a dar. Ele é o mais bem-sucedido gestor de ações do país - mas não parece querer que ninguém saiba disso.

Até agora, ele tem obtido razoável êxito: escondido num escritório de 150 metros quadrados no centro do Rio de Janeiro, Paulo Bodin ainda é um segredo bem guardado. Na apuração desta reportagem, EXAME perguntou a dezenas de altos executivos do mercado financeiro o que pensam de Bodin. Era comum que confundissem Paulo com seu irmão Pedro, hoje membro do conselho de administração do Itaú Unibanco. Seu desempenho nos últimos 15 anos lhe garantiria fama nacional - caso, claro, ele a desejasse. Desde 1995, o fundo de Bodin teve um retorno de quase 13 000%, o equivalente a oito vezes o Ibovespa do período. Na última década, seu fundo rendeu quase o dobro do segundo colocado num ranking elaborado a partir da base de dados da empresa de informações financeiras Economática. Para ilustrar o que isso significa, basta comparar os retornos obtidos por Bodin nos últimos dez anos ao desempenho do mais renomado gestor do país, o paulista Luis Stuhlberger, da Credit Suisse Hedging-Griffo. Os dois atuam em mercados diferentes - enquanto Bodin opera no mercado acionário, Stuhlberger tem uma carteira variada e, portanto, corre menos riscos. Mas o placar é significativo, mesmo feitas as ressalvas necessárias: 2 676% para Bodin, 1 202% para o já mítico fundo Verde, de Stuhlberger.

Além do contraste entre seu desempenho e a pouca notoriedade, o método de trabalho de Bodin o torna uma avis ainda mais rara no cenário nacional. Enquanto os concorrentes têm sócios e analistas dedicados aos diversos setores da economia, Bodin é da turma do eu-sozinho. Emprega apenas uma secretária e um jovem assistente e concentra as decisões de investimento, a análise de empresas e as relações com investidores. Claro, Bodin também não gasta um centavo com assessorias dedicadas a lustrar sua imagem. EXAME só conseguiu persuadi-lo a conceder entrevista após semanas de conversas com sua secretária. Ele aceitou responder por escrito - amigos atribuem parte de sua timidez à gagueira. "Estou digitando as respostas", anunciou, solene, a secretária Patrícia Ribeiro por telefone na manhã de sexta-feira 8 de outubro.

Àqueles que esperam para o próximo parágrafo a lista das geniais dicas de investimento do maior gestor de ações do país: não, a entrevista não ajuda em nada a decifrar seu método - as respostas datilografadas são repletas de platitudes, protegidas por uma espessa camada de humor autodepreciativo. Como ele consegue desempenho tão acima da média? "Estudo as empresas abertas. Uso apenas as informações públicas, como balanços financeiros, artigos em revistas, jornais e outros meios de comunicação. Além disso, mantenho um contato normal com empresas." Atrapalha ainda mais o fato de Bodin não escrever relatórios aos clientes explicando a estratégia para a temporada. Quem investe na Tempo Capital - a aplicação mínima é de 300 000 reais - tem mesmo de confiar, meio que cegamente, na cabeça de Bodin.

Mas como, então, ele consegue? O tamanho do fundo, tido como pequeno, certamente ajuda. Com cerca de 700 milhões de reais de patrimônio, Bodin consegue uma agilidade com a qual outros gestores sonham. A paciência, por outro lado, parece ser uma de suas principais virtudes. Em 2008, ele se salvou da crise financeira mundial por ter investido em ações do banco Nossa Caixa, anos antes de a consolidação bancária levar os papéis às alturas. Em maio, seus maiores investimentos se concentravam em Brasil Telecom, Vale e Lojas Americanas. Setores como petróleo, siderurgia, incorporação imobiliária, saúde e educação não estão entre seus prediletos. Seus cotistas esperam que a paciência de Bodin esteja prestes a render bons resultados mais uma vez - isso porque, nos últimos dois anos, a coisa não tem andado muito bem para a Tempo Capital. Seu fundo vem perdendo até mesmo para o Ibovespa. "Bodin vem mantendo ações que se desvalorizaram no último ano, como Brasil Telecom e Fibria", diz o diretor de uma gestora de patrimônio de São Paulo. Bodin, por escrito, mantém a confiança de que tudo acabará bem. "O fundo manteve essas ações porque a tese de investimento continua válida." Essa é a hora em que não ser famoso ajuda - é impossível perder sua fama de Midas antes mesmo de conquistá-la.

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