Sudaneses em Juba: a agricultura é rudimentar, mas há terra e água de sobra (Paula Bronstein/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 15 de março de 2013 às 18h05.
São Paulo - O Sudão, país do nordeste africano com um produto interno bruto equivalente ao da Bahia e área comparável à do estado do Amazonas, entrou no radar dos investidores brasileiros.
Eis o que eles encontram lá: taxas de juro que aqui são um sonho, reservas de petróleo de 5 bilhões de barris — volume maior do que o da Noruega, 13º produtor mundial —, oferta de água que permite extensos projetos de lavoura irrigada e 100 milhões de hectares disponíveis para a agricultura, o dobro da área de grãos do Brasil.
É claro que isso não faz do Sudão um imediato Shangri-lá de oportunidades. Não faz dois anos que parte do país se emancipou, criando o Sudão do Sul, após duas décadas de uma guerra civil que causou 1,4 milhão de mortes.
O dinheiro é barato, mas chegar a ele é um suplício — nem sequer há cartões de crédito no país. A agricultura é rudimentar — a produtividade das lavouras de algodão equivale a 25% da obtida no Brasil. E a mão de obra tem baixíssima qualificação — pelo menos 30% dos sudaneses não sabem ler e escrever.
A isso se somam os problemas comuns na África que afugentam investidores, como os ataques a empresas estrangeiras. No ano passado, um acampamento da mineradora Vale na Guiné foi invadido e destruído. Em janeiro, radicais islâmicos fizeram reféns em um campo de gás de multinacionais na Argélia. Durante a operação de resgate, 37 trabalhadores estrangeiros morreram.
Mesmo com os riscos, as oportunidades no Sudão atraem desbravadores brasileiros, seguindo um caminho já trilhado por investidores chineses e indianos.
Ainda não se trata de um desembarque em massa. O número de empresas brasileiras no Sudão não passa de uma dezena. Mas há uma atração mútua nesse movimento. Para o Brasil, há negócios a ser explorados em áreas em que temos reconhecida capacidade, como agricultura e construção civil. E, para o Sudão, interessa, além do conhecimento técnico, o equilíbrio de forças no investimento que chega de fora.
Os chineses aportaram antes: há hoje cerca de 300 000 chineses no Sudão. São os próprios sudaneses que têm procurado atrair mais brasileiros em missões de negócios. A mais recente delas passou por São Paulo no final de janeiro. Por outro lado, para garimpar negócios de construção no Sudão, a construtora Andrade Gutierrez foi uma das quatro representantes brasileiras na Feira Internacional de Cartum (a capital do país), realizada há um mês.
Em 2011, a empresa de alimentos JBS mandou representantes ao Sudão para avaliar as condições de implantação de um frigorífico no país, onde há 50 milhões de cabeças de gado. Entre as companhias que já passaram da fase de estudos está a STR, empresa de exploração e produção de petróleo e gás natural de Winston Fritsch, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Fernando Henrique Cardoso.
O Sudão é o primeiro alvo da STR Holding, seu recém-criado braço dedicado a explorar oportunidades no exterior. A empresa tem 38 pessoas na operação. “Estamos estruturando o negócio, mas nossa licença vai até 2055”, diz Eduardo Pereira, diretor executivo da STR Holding.
Interesse pela cana
O desembarque de brasileiros no Sudão é recente e ainda restrito, mas segue um movimento vivido há pelo menos uma década em Angola, onde a presença de brasileiros vai da infraestrutura ao varejo. No momento, a tecnologia em cana-de-açúcar é um dos maiores interesses sudaneses.
Flavio Castelar, diretor executivo da união de 100 usinas de álcool da região de Piracicaba, em São Paulo, passou parte do mês de janeiro no Sudão em rodadas de negócios para oferecer tecnologia da cana brasileira ao país.
Na agricultura, já há produtor brasileiro usufruindo as vantagens do Sudão. “Produzir lá é mais barato do que no Brasil”, diz Paulo Hegg, que chegou em 2010 para cultivar soja e algodão. Hoje, ele planta também milho, feijão e arroz em uma área total de 30 000 hectares — mas que deverá chegar a 80 000 hectares até 2015.
Resta ver se os atrativos vão compensar os riscos de atuar em um país dividido, com a economia destruída pela guerra e cujo presidente, Omar al-Bashir, teve a prisão decretada pelo Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade.