Protesto em Nova York: Warren Buffett, quem diria, é um dos ídolos dos manifestantes (Julie Dermansky/Latin Stock)
Da Redação
Publicado em 7 de novembro de 2011 às 18h48.
Nova York - Os mapas e as placas indicam Parque Zuccotti, em homenagem a um ex-vice-prefeito, mas os jovens que o ocupam há mais de um mês preferem Liberty Plaza, o nome antigo do lugar.
É mais charmoso e combina mais com o movimento Ocupe Wall Street, um grupo mutante e difuso de manifestantes que protesta contra um pouco de tudo: bancos e grandes empresas, os políticos, a globalização, a falta de empregos e vários outros temas.
O nome Liberty Plaza, além de mais poético, tem outra associação importante. É uma menção óbvia à Praça Tahrir, no Cairo, onde os egípcios se reuniram durante semanas até a queda do ditador Hosni Mubarak, em fevereiro deste ano.
No Egito, na Tunísia e na Líbia, os protestos provocaram mudanças políticas e, portanto, alcançaram seu objetivo. Mas o que será a vitória para os manifestantes de Nova York e das outras cidades mundo afora?
Essa é a pergunta que se fazem os políticos dos países ricos, em particular os americanos, a pouco mais de um ano de uma eleição presidencial.
Uma conquista do movimento é inegável: o que começou com um punhado de jovens em Nova York tornou-se um movimento mundial e um ponto obrigatório na agenda política dos países desenvolvidos.
É compreensível a insatisfação com o estouro da bolha imobiliária, seguido pelo trilionário pacote de resgate dos bancos e uma recessão duríssima — e talvez ela tenha demorado para aparecer.
“Em crises financeiras passadas, houve muita convulsão social, algo que não tínhamos visto até agora”, diz Beverly Gage, professora da Universidade Yale e autora de um livro sobre um atentado a bomba em Wall Street que deixou dezenas de mortos e que marcou um período turbulento nas relações entre trabalhadores e patrões no país. “Acredito que estejamos só no começo desse movimento.”
Para onde vai esse movimento é o que ninguém sabe dizer. Na cacofonia das exigências, que vão de mais impostos sobre os ricos a ataques contra empresas que simbolizam a globalização, como o Walmart, não se distingue uma voz única nem uma ideia clara do que deve ser feito para corrigir a crescente desigualdade.
“O Ocupe Wall Street faz muitas reclamações, mas ninguém apresentou propostas”, diz Josh Barro, analista do instituto de pesquisas conservador Manhattan Institute.
Barro compara o OWS ao Tea Party, um grupo de republicanos à direita da linha do partido que faz oposição ao presidente Barack Obama e cuja bandeira maior é o corte de impostos e a redução do tamanho do governo.
O Tea Party de fato tem propostas — e candidatos — para levar adiante sua ideia de um governo mínimo. Mas seu principal impacto é levar toda a oposição republicana um pouco mais à direita e acirrar a divisão política nos Estados Unidos. O Ocupe Wall Street pode fazer o mesmo com o Partido Democrata, de Obama — mas apontando para a esquerda.
Campanha presidencial
Uma pesquisa da agência Associated Press e do instituto GfK mostrou que um terço da população americana apoia o protesto, e 58% dos entrevistados se disseram “furiosos” com a política do país. Segundo o levantamento, o número de insatisfeitos vem crescendo de forma constante.
Esse é um ponto importante do movimento: apesar de levar Wall Street no nome, boa parte das reclamações é dirigida contra os políticos.
A taxa de desemprego entre os americanos com menos de 25 anos de idade é de 17%, e não há sinais de que vá baixar tão cedo. A economia segue patinando.
A crise do teto da dívida ainda não foi resolvida, e democratas e republicanos não conseguem se entender sobre o equilíbrio das contas do governo: aumentar os impostos ou cortar gastos sociais?
Como o assunto vai ser tratado na campanha presidencial é uma questão delicada. Há quem especule que Obama esteja tentando se apropriar do descontentamento expressado pelo Ocupe Wall Street — mas os manifestantes deixam claro que o movimento não é partidário e não quer se ver associado a ninguém.
Ou a quase ninguém. Um dos improváveis ícones do movimento nos Estados Unidos é o bilionário Warren Buffett. O investidor mais famoso do mundo publicou um artigo em agosto defendendo o aumento dos impostos para os mais ricos.
“Buffett está certo. Já passou da hora de os multimilionários ajudarem a pagar a conta”, diz Jesse Smith, um dos acampados no centro financeiro de Nova York. Smith é artista de rua e diz que se juntou ao movimento porque tem tempo livre. “E também porque estou desempregado e não vejo perspectiva de conseguir trabalho.”
Como Smith, muitos dos manifestantes têm algo a dizer, mas outros querem apenas fazer parte da bagunça. Não existe lugar no mundo mais obcecado consigo mesmo do que Nova York, e o acampamento tornou-se um dos assuntos favoritos da cidade.
Os protestos, que acontecem por toda parte, têm sido pacíficos. A tensão que existe é mais prosaica: os manifestantes têm sido barrados nas lojas e nos restaurantes da região por causa da confusão nos banheiros. Os vizinhos reclamam do barulho, da sujeira e do mau cheiro.
Além do sucesso na mídia tradicional, o movimento tem seu próprio jornal virtual, ampla divulgação no Twitter (com a palavra-chave #occupy) e vai ser tema de um documentário. Se a resistência térmica dos manifestantes vai permitir que esse fenômeno midiático continue, é uma das perguntas no ar.
Ainda é começo de outono, mas a temperatura não costuma passar dos 10 graus já a partir de novembro. Mas, antes que o frio afugente os menos determinados, pelo menos um milionário famoso pode ser afetado pelos “99%”.
Bruce Wayne, o Batman, vai estar em Wall Street no fim de outubro para as filmagens do próximo blockbuster. O estúdio Warner Brothers diz que tudo segue como planejado. Santa expectativa, Batman.