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Quem tem medo do Japão? Chineses e coreanos

Depois de seis meses no poder, o primeiro-ministro Shinzo Abe aumenta as esperanças de que a enferma economia japonesa vá finalmente se levantar — e deixa chineses e coreanos de cabelo em pé


	Shinzo Abe: ele promoveu um dos planos econômicos mais audaciosos das últimas décadas
 (Toru Hanai/Reuters)

Shinzo Abe: ele promoveu um dos planos econômicos mais audaciosos das últimas décadas (Toru Hanai/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 16 de julho de 2013 às 20h45.

São Paulo - "É minha tarefa fazer o Japão acordar e sair desse longo período de deflação e falta de confiança.” A frase é do senhor da foto acima, Shinzo Abe, primeiro-ministro japonês, e foi dita em um encontro recente com empresários em Tóquio. Mensagens semelhantes foram proferidas à exaustão nos últimos anos por outros políticos sem que ninguém desse a menor importância.

Desta vez é diferente. Desde que assumiu, em dezembro, Abe tem promovido uma das experiências econômicas mais audaciosas já vistas em todo o mundo nas últimas décadas. O Banco Central deu início a um gigantesco programa de injeção de dinheiro na economia. Com a compra de títulos da dívida, o governo pretende dobrar a quantidade de moeda em circulação até o final do ano que vem.

Abe promete também elevar o gasto público e promover um amplo leque de reformas para aumentar a competitividade. Por tudo isso, cresce a impressão, dentro e fora do país, de que a enferma economia japonesa pode estar prestes a se levantar. Ótima notícia para o mundo. Bem, para quase todo mundo.

Para os sul-coreanos e os chineses, o “abenomics”, neologismo para a nova política econômica do Japão, é motivo de preocupação. Um de seus efeitos (alguns dizem “objetivos”) foi a valorização de 20% do dólar em relação ao iene, o que deu um impulso às exportações japonesas. Hyun Oh-Seok, ministro da Economia da Coreia do Sul, resumiu o tom reinante entre os competidores dos japoneses.

Ele disse recentemente que a questão cambial é mais perigosa para seu país do que as ameaças nucleares do ditador norte-coreano Kim Jong-un. A agressiva política de Abe já fez com que o won, moeda sul-coreana, valorizasse mais de 25% em relação à moeda japonesa neste ano, e os estragos começam a ser notados no setor produtivo.

A Hyundai divulgou uma queda de 15% no lucro líquido no primeiro trimestre e, pelas estimativas do mercado, as vendas crescerão apenas 4% neste ano. Caso isso se confirme, será o menor avanço em uma década. Enquanto isso, do outro lado do estreito da Coreia, as montadoras japonesas comemoram.

A Toyota registrou um aumento no lucro líquido de 240%, e a Mitsubishi, de 73% no ano fiscal terminado em março. No mesmo clima otimista, a Honda anunciou em maio que voltará a ter uma equipe na Fórmula 1 em 2015.

“Esperamos que nossa decisão ajude o Japão a se tornar um lugar vibrante outra vez”, disse Takanobu Ito, presidente da Honda, durante o anúncio. Até mesmo a fabricante de eletroeletrônicos Sony, que estava no vermelho, divulgou um balanço com resultados positivos.

Em visita a Pequim na última semana de maio, oficiais do Fundo Monetário Internacional — que, por sinal, apoia o abenomics — ouviram reclamações de funcionários de alto escalão do governo comunista. Os chineses dizem que a mudança de rumo no Japão tem potencial para desestabilizar os países da região.

O maior temor do Banco Central da China é que o capital especulativo acabe saindo do Japão numa eventual queda da taxa de juro e inunde o mercado chinês. O barulho só não tem sido maior porque, na avaliação do governo da China, o programa de recuperação de Abe deve ter vida curta, opinião compartilhada por alguns executivos japoneses. 

Osamu Suzuki, presidente da montadora Suzuki, é um dos que têm medo do Japão de Abe. Na apresentação de resultados no dia 9 de maio, Suzuki disparou: “Investimos na Índia, na Tailândia e na Indonésia e não vamos trazer essa produção de volta para o Japão de uma hora para a outra porque o iene está barato.

No longo prazo, vamos fazer o contrário. Vamos acelerar nossa expansão internacional”. O motivo da desconfiança é a experiência da década passada. A moeda também desvalorizou, as montadoras foram pressionadas a direcionar sua produção para o Japão, mas logo as margens desapareceram com um novo ciclo de alta do iene.

Nas últimas semanas, a Bolsa de Valores de Tóquio teve queda, o mercado de títulos japoneses ficou volátil e houve uma pequena valorização cambial, uma prova de que o abenomics tem mesmo uma longa batalha até que possa firmar sua credibilidade.

“O Japão está há anos em um ciclo de falta de confiança que tem se provado muito difícil de superar”, afirma Janet Hunter, professora de história econômica especializada em economia japonesa da London School of Economics, de Londres.

Um dos pontos que devem definir o sucesso da nova política econômica é  a batalha contra a deflação. No Japão, o cidadão comum resiste a gastar porque existe a expectativa de que os produtos continuem baixando de preço. O consumo reprimido afeta o resultado das empresas, que cortam custos, não contratam e não dão aumento salarial.

Nesse contexto, os consumidores são levados a poupar e esperar mais pela queda dos preços, fechando um círculo que frea a expansão do PIB. Com a injeção de mais dinheiro na economia, a expectativa do governo é que a inflação chegue a 2% ao ano. O objetivo é que a alta de preços venha acompanhada de uma política de aumento de salários.

Abe tem pedido aos empresários para compartilhar com a população os benefícios do novo plano econômico. “Se os salários continuarem estagnados, os gastos das famílias continuarão represados e o plano corre o perigo de morrer na praia”, diz Mireya Solís, chefe da divisão de Japão no centro de pesquisas Brookings, com sede em Washington.

Mesmo com altos e baixos, o saldo da gestão Abe até aqui é positivo. No primeiro trimestre deste ano, o PIB cresceu 0,9%, a maior expansão entre os países ricos. As exportações avançaram 3,8% de janeiro a março em relação ao trimestre anterior. De abril do ano passado a março deste ano, as vendas para os Estados Unidos cresceram 10% — os americanos são agora os maiores compradores de produtos do Japão.

Os gastos dos japoneses com imóveis, roupas e sapatos deram um salto, uma mudança visível nas ruas de Ginza, o bairro considerado ícone da sofisticação em Tóquio. Com um índice recorde de aprovação de 76% e um partido que detém a liderança nas pesquisas de voto para as próximas eleições da Câmara Alta (o órgão correspondente ao Senado), Abe parece ter todas as condições para promover reformas.

O primeiro-ministro tem falado da necessidade de aumentar as exportações da indústria de transportes e de energia atômica, incentivar as mulheres e os jovens a entrar no mercado de trabalho e liberalizar o setor agrícola.

Ainda que coreanos e chineses reclamem, um plano que levante a terceira maior economia global será muito bem-vindo. Com a Europa numa crise sem fim, os Estados Unidos numa recuperação ainda incerta e a China em desaceleração, o mundo precisa de novas locomotivas.

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