Farmácia da DPSP: uma estratégia no Rio de Janeiro e outra em São Paulo (Germano Lüders/EXAME)
Da Redação
Publicado em 9 de junho de 2014 às 06h39.
São Paulo - Um dos principais objetivos de uma fusão é reduzir custos. Quando duas empresas integram suas operações, o total de empregados não dobra. Há funcionários que têm a mesma função, e todo mundo sabe que alguns vão ser demitidos — ou, na hipótese otimista, realocados em outra área.
A nova empresa também costuma ter mais poder de barganha para negociar com fornecedores e conseguir contratos mais baratos. Foi esse tipo de raciocínio que levou, em 2011, à fusão das redes de farmácias Drogaria São Paulo e Pacheco. Juntas, as duas empresas — fortes em regiões diferentes do país — poderiam resistir à onda de consolidação do setor.
Mas, passados três anos, as empresas continuam funcionando de forma separada. Os antigos donos das duas drogarias — Samuel Barata, da Pacheco, e Ronaldo Carvalho, da São Paulo — têm visões diferentes para o futuro da nova empresa. Pelo acordo da fusão, o controle da companhia é compartilhado.
Mas a família Barata tem 51% da nova empresa; e os 12 acionistas da São Paulo, 49%, com o poder de indicar o presidente executivo. Até agora os dois lados não tinham feito grande esforço para unificá-las. Porém, um cheque de 4,5 bilhões de reais está obrigando a turma a pisar no acelerador.
Barata e Carvalho precisam decidir se vendem a DPSP (nome dado à nova companhia) para a americana CVS Caremark, que fez a proposta bilionária, ou se resolvem fazer, eles mesmos, a parte complicada da fusão, de integrar as operações das empresas. A proposta foi recusada, essencialmente, por uma questão de preço.
O valor oferecido pela CVS representa 13 vezes a geração de caixa da DPSP, múltiplo bastante inferior ao que a própria CVS pagou para comprar a drogaria Onofre em fevereiro do ano passado (de 25 vezes a geração de caixa, o mais alto já oferecido por uma rede de farmácias no Brasil, segundo executivos do setor). Mas há, ainda, um fator complicador: segundo pessoas próximas às negociações, Samuel Barata resiste à ideia de vender.
Aos 83 anos, Barata participa ativamente do dia a dia da empresa. Funcionários dizem que Gilberto Ferreira, que presidia a Drogaria São Paulo e foi nomeado presidente da DPSP logo depois da fusão, toma decisões relativas sobretudo aos negócios da empresa em São Paulo.
No Rio de Janeiro, quem manda de verdade é mesmo Barata, que preside o conselho de administração da DPSP. Ele aprova desde negociações com fornecedores até a escolha dos imóveis em que serão abertas drogarias no Rio (a maior parte das lojas da Pacheco fica em imóveis próprios).
Irmão de Jacob Barata, dono de 11 empresas de ônibus no Rio, Samuel Barata começou a preparar seu sucessor na DPSP: o neto, Bruno Barata Adler, que é conselheiro da empresa. “O Samuel não precisa de dinheiro e ainda não decidiu se vende a participação ou se quer preservar o negócio para a família”, diz um executivo que já negociou com ele.
Sua filha, Helena, é conselheira da drogaria. Segundo pessoas que acompanham o processo, a CVS, presidida por Larry Merlo, estuda fazer uma nova oferta pela DPSP levando tudo isso em conta — por exemplo, fazendo com que Barata tenha participação ativa no negócio depois.
Ex-diretores da DPSP disseram a EXAME que, como acontece com determinados tipos de telefone celular, trabalhavam com “dois chips”, ou seja, sabiam que tinham de conduzir estratégias diferentes para a Pacheco e a São Paulo. A estrutura logística das drogarias é separada, assim como as políticas comerciais, a estratégia de expansão e parte das negociações com fornecedores.
A maioria das compras de medicamentos é feita de forma conjunta, o que reduz preços. Mas, no caso dos remédios genéricos, a Pacheco tem um acordo de longo prazo com o laboratório EMS e ele não se estende à Drogaria São Paulo (que faz leilões periódicos para escolher uma marca de genéricos como a principal).
Para evitar brigas entre as duas redes pelos melhores pontos na abertura de lojas, o plano de expansão é dividido geograficamente: os estados de Minas Gerais, Goiás, Paraná e Rio de Janeiro ficam com a Pacheco; o estado de São Paulo e a Região Nordeste, com a empresa de São Paulo.
A holding DPSP foi criada, mas os CNPJs da Pacheco e da São Paulo ainda são separados. Por e-mail, Gilberto Ferreira afirmou que a empresa é administrada por ele e sete diretores “de maneira integrada”.
Segundo ele, foram mantidas razões sociais separadas para evitar o descredenciamento do programa Farmácia Popular, em que o governo subsidia a venda de alguns remédios. Procurada, a CVS não deu entrevista.
Apesar dessa forma de operar, o negócio vai bem. Segunda maior rede de farmácias do país, atrás apenas da RaiaDrogasil, a DPSP tem a maior margem de lucro entre os principais concorrentes (veja quadro).
A operação da Pacheco, especificamente, tem rentabilidade alta em razão da fraca concorrência no Rio e do grande volume de vendas de produtos de higiene e beleza, que têm margens maiores do que as dos remédios.
Ainda assim, o faturamento da DPSP cresceu um pouco menos do que a média do varejo farmacêutico em 2013: 13% ante 15%, enquanto a RaiaDrogasil, sua maior concorrente, fechou o ano com expansão de 16%.
É consenso que, se as operações fossem de fato integradas, os resultados da DPSP poderiam ser ainda melhores. “O comprador deve estar de olho nesse potencial de ganho”, diz um executivo da concorrência.
EXAME apurou que os acionistas do lado São Paulo da empresa estão mais inclinados a vender sua participação. Ronaldo Carvalho tem sócios minoritários — os irmãos Ricardo e Marcos Arede, que eram donos da rede de farmácias Drogão, comprada pela Drogaria São Paulo em 2010, e o advogado José Roberto Ópice, um dos fundadores do escritório Machado Meyer, entre outros.
Antes da fusão, Carvalho já estava preparando a empresa para abrir o capital na Bovespa, uma forma de oferecer uma saída para os minoritários. Mas, apesar da resistência de Barata, ninguém duvida que, no preço certo, a CVS conseguirá fechar negócio — mais especificamente, algo na casa dos 6 bilhões de reais, segundo executivos próximos à empresa.
Seria o maior negócio do setor no mundo desde a fusão das gigantes Walgreens (americana) e Boots (inglesa). Até o fechamento desta edição, o impasse entre Rio de Janeiro e São Paulo continuava.