Rubenstein, do Carlyle: os grandes fundos estão comprando empresas no Brasil para fugir da pasmaceira (Tim Sloan/AFP Photo)
Da Redação
Publicado em 3 de maio de 2011 às 06h00.
Seis anos atrás, a revista britânica The Economist publicou uma reportagem especial sobre fundos de private equity — firmas especializadas em levantar dinheiro com grandes investidores para comprar e vender empresas. A chamada: “Os novos reis do capitalismo”.
Muita gente achou exagero: os reis do capitalismo não seriam, na verdade, os empreendedores que fazem a roda da economia girar? O fato é que o poder dos “novos reis” continuou a aumentar exponencialmente nos anos seguintes. Em uma década, fundos como o Carlyle, do americano David Rubenstein, investiram 2,5 trilhões de dólares na compra de empresas como a montadora Chrysler, a rede de hotéis Hilton e a rede de lanchonetes Dunkin’ Donuts.
As festas organizadas pelos controladores desses fundos davam uma boa medida da farra financeira em que viviam. Um deles contratou os Rolling Stones por 7 milhões de dólares. Outro, Rod Stewart. Mas veio a crise, e os reis do capitalismo foram à guilhotina. No ano passado, 183 gestoras fecharam no mundo, um recorde, e espera-se que outras 150 encerrem suas atividades até dezembro.
No caso dos fundos de private equity, não há uma data a ser lembrada como seu 14 de Julho particular. Seu poder começou a minguar antes mesmo da quebra do Lehman Brothers, momento considerado marco zero da crise que abalou o mundo a partir de setembro de 2008.
O poder desses fundos era explicado em grande medida pela fartura de crédito disponível no mercado mundial no pré-crise. Assim, gigantes como Blackstone e KKR podiam fazer aquisições bilionárias usando uma quantidade mínima de dinheiro — em alguns casos, cerca de 80% dos recursos eram emprestados por grandes bancos.
Já a partir de 2007 essa fonte começou a secar. Em 2008, secou de vez. E, desde então, as coisas nunca voltaram ao patamar de antes. A crise dos private equities só ficou mais evidente agora, e não logo depois da quebra do Lehman, em razão da característica de longo prazo desses fundos: eles levam, em média, 16 meses para captar recursos e cerca de cinco anos para investir. “Muito do que vemos hoje é fruto da atividade dos fundos em 2009, que foi um período muito ruim”, diz Tim Friedman, da Preqin, empresa de pesquisa especializada em investimentos de risco.
O cavalo de pau por que o mercado de private equity passou acabou gerando um tremendo paradoxo. Após uma década captando dinheiro a toque de caixa, esses fundos ainda têm uma quantidade recorde de recursos para investir. São cerca de 500 bilhões de dólares, segundo um estudo da consultoria Bain & Company.
É dinheiro suficiente para, por exemplo, comprar Vale, Petrobras e Itaú. Qual é o problema, então? Há, aqui, uma mistura de fatores. O primeiro é que, como já se viu, a crise de crédito tornou o financiamento de bancos mais escasso e caro. Assim, para fazer uma grande aquisição, um fundo teria de entrar com mais dinheiro próprio — o que torna mais difícil obter os retornos alcançados nos anos de euforia.
Além disso, essa dinheirama toda está pulverizada em mais de 4 000 fundos, o que tem impedido alguns deles de levantar o capital necessário para fechar qualquer negócio relevante. Nos últimos 12 meses até março, as aquisições de private equity somaram 213 bilhões de dólares, quase 80% menos que o volume aplicado entre julho de 2006 e junho de 2007.
Como geram poucos negócios, as firmas penam para convencer os investidores a colocar mais dinheiro em seus fundos, e a captação fica estagnada. No primeiro trimestre deste ano, os private equities levantaram 42 bilhões de dólares, o menor patamar para o período desde 2003. Assim, os fundos estão fechando as portas às centenas, mesmo com os cofres cheios de dinheiro.
Reis em outra freguesia
Como sempre acontece, essa crise está tendo efeito desigual. O setor vive sua seleção natural: os grandes fundos concentram a maior parte dos poucos negócios que têm ocorrido, enquanto os demais saem do mercado. “Fundos que surgiram no auge da bolha não têm o histórico ou a reputação para manter suas atividades num mercado mais difícil”, diz David Robinson, professor da Universidade Duke.
Ter escala também é fundamental para buscar negócios nos países emergentes, onde os fundos enxergam alternativas de investimento em tempos de estagnação no mundo rico. Em 2010, 11% do total captado foi destinado aos emergentes, o dobro de cinco anos atrás. Carlyle, Blackstone e outros grandes fundos vêm abrindo operações próprias em países como o Brasil. Eles querem voltar a ser reis, nem que seja em outra freguesia.