Mozart Ramos: “Crianças não têm partido e precisam de educação boa” | Silvia Costanti/Valor/Folhapress /
Da Redação
Publicado em 17 de janeiro de 2019 às 05h00.
Última atualização em 17 de janeiro de 2019 às 05h00.
Na campanha eleitoral, a principal promessa do presidente Jair Bolsonaro para a educação girou em torno da influência ideológica nas escolas. A realidade e os números mostram que há problemas mais urgentes. Para Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna, a prioridade deveria ser pôr em prática a base comum curricular, além de ampliar a alfabetização. Cotado para o Ministério da Educação antes da escolha de Ricardo Vélez, Ramos falou a EXAME sobre o panorama da educação.
Quais medidas devem ser prioridade na área de educação?
É preciso formar bons professores e elaborar materiais didáticos de acordo com a base nacional comum curricular. Também temos de melhorar indicadores, com a educação integral e a adoção de tecnologias adequadas ao mercado de trabalho 4.0. Se o país quiser ser um protagonista, não pode ter 55% dos alunos do 3o ano do ensino fundamental sem saber ler, contar nem escrever. Este governo tem condições de equacionar o problema em quatro anos, principalmente se mobilizar o país. Pode fazer o que Lula fez com o Fome Zero e criar o Analfabetismo Zero.
Como fazer que toda criança de até 7 anos seja alfabetizada?
É essencial melhorar a gestão em termos de metas, resultados e financiamento. Em 2000, o Brasil investia anualmente 2 100 reais por aluno. Agora, investe 6 300 reais. Triplicamos o investimento e continuamos num patamar baixo de aprendizado.
Algum projeto serve de modelo para mudar essa situação?
Existem escolas no interior do Piauí com resultados fabulosos. Já o Ceará avançou porque lá a redistribuição do ICMS não tem como base só o número de crianças matriculadas, mas, sim, o total de alunos alfabetizados. Desse modo, o prefeito cobra do secretário de Educação que as crianças sejam alfabetizadas.
Uma das promessas de Bolsonaro é o projeto Escola Sem Partido, que foi arquivado. A ideia perdeu força?
Havia a expectativa de que o projeto de lei passasse pela comissão da Câmara no fim de 2018 e fosse votado em plenário neste ano. Mas, como nem sequer saiu da comissão, a princípio perdeu força. Como o Congresso agora contará com muitos deputados do PSL, pode ser que o tema volte a ganhar terreno.
Acredita que o governo mudará a base nacional curricular?
Certos pontos da base curricular se chocam com valores de integrantes do governo. O que a equipe pode fazer é influenciar na formulação do material didático. No entanto, é importante lembrar que o Estado brasileiro é laico e não pode haver ideologia política nem religiosa nas escolas. Isso está na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
O senhor chegou a ser cotado para assumir o Ministério da Educação. Por que não deu certo?
Em geral, existe mais de um fator a ser levado em conta na hora de escolher um ministro. Além da competência técnica, precisa haver apoio dos aliados e ficou claro que a bancada evangélica buscava outro perfil. Isso é natural. Mas estou motivado a ajudar o ministro Ricardo Vélez e sua equipe, porque crianças e jovens não têm partido e precisam de educação boa.
Nesse sentido, qual é o papel do corpo técnico do Ministério?
Quem opera o dia a dia no Ministério são os funcionários de segundo e terceiro escalão. Esses servidores podem ajudar parte da equipe que não tem tanta experiência na área pública. Bolsonaro e o ministro Vélez escolheram a educação básica como prioridade, o que eu concordo, mas não podem deixar de reconhecer que as universidades federais precisam de cuidado.