Revista Exame

O problema de Slim no brasil

Por que o empresário mais influente do México e terceiro mais rico do mundo ainda não ganhou dinheiro com a Claro

Loja da Vivo, em São Paulo: concorrência no Brasil é mais acirrada

Loja da Vivo, em São Paulo: concorrência no Brasil é mais acirrada

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Da Redação

Publicado em 15 de março de 2011 às 11h23.

Quando começou a montar a filial brasileira de seu império de telecomunicações, o mexicano Carlos Slim Helú, terceiro homem mais rico do mundo, escolheu a telefonia celular como ponto de partida. De 2002 a 2003, Slim investiu cerca de 5 bilhões de dólares entre aquisições de empresas, licenças e investimentos em infra-estrutura para montar a Claro e torná-la o segundo maior grupo de telefonia móvel do país.

Acostumado à posição de líder nos mercados em que atua por toda a América Latina, sua meta para o Brasil não era diferente. Slim nunca escondeu que queria ser o maior. "O grupo Telmex trabalha para ter a liderança da telefonia celular brasileira", afirmou na ocasião Carlos Henrique Moreira, o então comandante da Claro.

Em 2003, a Claro fez seu maior movimento ao adquirir a BCP, empresa de telefonia que atuava em São Paulo. Passados quase três anos, a Claro vive uma situação bem diferente da planejada -- e está proporcionando a seu principal acionista a rara experiência de perder dinheiro.

No ano passado, a Claro foi a única companhia do setor a perder dinheiro com a operação -- mesmo tendo dobrado sua base de clientes desde 2003 e aumentado as receitas em 50% no mesmo período. Sua margem Ebitda (a capacidade de geração de caixa sobre o faturamento) caiu de 25,6% em 2003 para 3,2% negativos em 2005 (a empresa não revela o resultado final).

Trata-se do único negócio da América Móvil, a holding da Telmex que controla as 12 operações celulares na América Latina, que não teve lucro no período. Os outros dois negócios de Slim no Brasil -- a operadora de telefonia fixa Embratel e a empresa de TV por assinatura Net -- também passaram por problemas.

Mas no ano passado, após movimentos de reestruturação, registraram pequenos lucros. Hoje, a Claro é o maior desafio financeiro de Slim no país. Um desafio que, evidentemente, não pode ser vencido do dia para a noite. "O quadro de 2005 é uma fotografia isolada da empresa, cenário que faz parte de um plano muito maior", afirma o guatemalteco Julio Porras, diretor de operações da Claro e homem de confiança de Slim.


Segundo Porras, os números da empresa foram afetados pelo investimento de 400 milhões de reais, feito na construção da rede em Minas Gerais e na expansão da atual cobertura em mais de 700 cidades do país. "Nossa meta de longo prazo continua sendo a liderança do mercado, em número de usuários e rentabilidade."

Em parte, os problemas que a Claro enfrenta hoje podem ser explicados pelo perfil de sua clientela. Mais de 80% de sua base é formada por usuários de serviço pré-pago -- o índice mais alto entre as empresas do setor.

Em sua grande maioria, esses clientes gastam pouco (em média, 23 reais por mês), são conquistados graças a fortes subsídios e são pouco fiéis à operadora. Outro motivo é que, apesar dos esforços para ampliar o número de usuários, a Claro só aumentou sua participação de mercado em 1% entre 2003 e 2005. A tímida expansão acabou lhe custando a perda da vice-liderança para a italiana TIM. "O Brasil é um mercado mais complexo do que o restante dos latino-americanos", diz Porras.

O Brasil também foi o único lugar em que os mexicanos tiveram de criar uma marca. Em geral, a América Móvil compra uma empresa com uma marca já conhecida pelos consumidores e a mantém. "Não faz parte da filosofia dos mexicanos trabalhar marketing. Eles são bons mesmo no quesito preço", diz Swain, do Yankee Group.

Um ex-executivo da Claro, que acompanhou os esforços da empresa para consolidar sua marca no mercado, afirma que entre preço baixo e serviço, a orientação do México é optar pelo primeiro. "Até agora essa escolha se mos  trou equivocada", diz ele. O desconhecimento do mercado local também levou a empresa a tomar decisões que acabaram custando caro.

De acordo com um grande fornecedor de aparelhos celulares, no Natal do ano passado a Claro comprou um estoque para 120 dias (o normal do mercado é para 30 dias), confiante em que os concorrentes repetiriam a guerra de preços ocorrida no ano anterior. Como Vivo, TIM e Oi não aderiram a subsídios mais pesados, a Claro ficou com um estoque de 1 milhão de peças. (Porras não confirma o número e argumenta que faz parte da estratégia de qualquer operadora trabalhar com flexibilidade no estoque.)

Para especialistas do setor, essa complexidade a que o executivo da América Móvil se refere é a principal razão das dificuldades enfrentadas pelos mexicanos. "A entrada no mercado brasileiro teve peculiaridades com as quais eles não estavam acostumados", afirma Wally Swain, ex-presidente da operadora colombiana Comcel, adquirida pela Telmex em 2003, e atualmente consultor do instituto especializado Yankee Group.


Para começar, o Brasil foi o único mercado em que a América Móvil precisou consolidar cinco empresas diferentes em uma só operação. As antigas ATL (Rio de Janeiro), Tess (interior de São Paulo), Americel (Região Centro-Oeste), BSE (Nordeste) e BCP (na capital paulista) passaram por um processo complicado -- e  caro -- de unificação de sistemas que vai desde a central de atendimento até a emissão de contas telefônicas.

"Elas tiveram dificuldades em unificar as diferentes tecnologias", afirma um fornecedor de equipamentos que prefere não se identificar. "Em algumas regiões de São Paulo isso causou atraso na emissão de contas de até quatro meses e confusões de valores cobrados." Os problemas operacionais da Claro geraram uma onda de reclamações em órgãos de defesa do consumidor e na Anatel, a agência que regula o setor. No ano passado, metade de todas as reclamações registradas no Procon de São Paulo contra as três principais operadoras celulares referia-se à Claro.

Desde o final de 2005, a matriz tem procurado alternativas que possam trazer a empresa de volta ao crescimento. "Minha meta é levar a Claro de volta ao lucro em 2006", diz Porras, que promete anunciar nas próximas semanas resultados positivos referentes ao primeiro trimestre deste ano. Seu passo inicial nessa jornada é um agressivo programa de corte de custos, que começou no ano passado. O segundo é conquistar o maior número possível de clientes.

A operadora lançou recentemente uma promoção para consumidores de serviço pós-pago na qual vende o aparelho celular por apenas 1 real e também retomou a venda de pré-pagos por 99 reais. Paralelamente, a Claro tem investido milhões de reais em ações de marketing que possam valorizar a marca, a exemplo do patrocínio dos shows internacionais dos Rolling Stones e do U2, ambos ocorridos em fevereiro. "O objetivo agora é tornar a marca conhecida entre usuários do pós-pago", diz Roberto Guenzburgo, diretor de marketing da Claro.

Trata-se de um grande desafio, sobretudo quando se leva em conta que a venda de aparelhos celulares começa a desacelerar no Brasil. Nas últimas semanas, redes de varejo como Renner e Leroy Merlin decidiram suspender a venda em suas lojas. De cada 100 brasileiros, 47 já possuem celular -- e o restante está fora do jogo em grande parte por não poder bancar a conta.

Slim, dono de uma fortuna estimada em 30 bilhões de dólares, tem demonstrado publicamente certa tranqüilidade em relação aos negócios da Claro. Durante um evento promovido na Cidade do México, no final de março, o empresário afirmou que o importante é continuar aumentando o volume de assinantes e de receita da empresa. Os analistas financeiros, como sempre, têm mais pressa por resultados.

"A empresa precisa avaliar com cuidado se vale a pena passar mais um ano perdendo dinheiro", afirma Luciana Leocádio, analista de telecomunicações do banco BES.

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