Arminio Fraga: “Se as pessoas votarem olhando para a frente, talvez pensem em mudança” (Oscar Cabral/Veja)
Da Redação
Publicado em 22 de janeiro de 2014 às 07h44.
São Paulo - O carioca Arminio Fraga tem, aos 57 anos, um dos melhores currículos entre os economistas brasileiros. Ele acumula experiência em cargos nos setores público e privado e na academia.
Antes de ser presidente do Banco Central, de 1999 a 2002, no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, Fraga trabalhou seis anos ao lado do investidor húngaro-americano George Soros e no banco de investimento Salomon Brothers, nos Estados Unidos. Deu também aulas em universidades americanas.
Desde 2003, comanda a Gávea Investimentos, gestora que administra mais de 16 bilhões de reais. Nos últimos meses, Fraga tem aconselhado o senador Aécio Neves, pré-candidato do PSDB à Presidência da República. Fraga falou a EXAME sobre os desafios do próximo governo e o que, em sua visão, deve ser feito para atacá-los. A seguir, os principais trechos da entrevista.
EXAME - Qual o maior desafio do presidente que assumir o cargo em 2015?
Arminio Fraga - Na última década, o país viveu um ciclo de crescimento impulsionado por crédito farto e alta no preço das exportações. O desemprego era alto e caiu. Foi bom. Mas, de uns anos para cá, os limites surgiram.
O modelo econômico vigente desde o segundo mandato do ex-presidente Lula não consegue entregar crescimento alto. Ao contrário. O Brasil vive uma situação incômoda de crescimento baixo e inflação alta. Isso gera incertezas e paralisa as decisões de investimento.
Quem quer que seja eleito vai ter de encontrar um modelo que incentive o aumento dos investimentos e da produtividade para o país crescer de forma sustentável.
EXAME - Como se consegue isso?
Arminio Fraga - Será preciso fazer ajustes macroeconômicos — fiscais e monetários. E também ajustes pontuais: o governo precisa funcionar melhor e entregar resultados. É necessário um ataque frontal ao chamado custo Brasil. É bom que os salários cresçam. Mas isso tem de vir acompanhado de ganho de produtividade para manter a rentabilidade das empresas.
De modo geral, falta o que podemos chamar de uma “visão século 21” da situação. Há uma cobrança da sociedade por isso. A população exige melhores serviços públicos. E só com serviços de qualidade teremos um país com igualdade de oportunidades.
EXAME - Uma das críticas feitas aos oito anos do PSDB no governo é que o partido administrava mais para as empresas e menos para a população.
Arminio Fraga - Quem criou essa visão foi o PT. Curioso. No governo, o próprio PT comprometeu recursos e capital político em subsídios, proteções e créditos para algumas empresas. A proposta do PSDB era, e é, criar um ambiente de igualdade de oportunidades.
É criar as condições adequadas para que o setor privado se preocupe apenas em aumentar a produtividade. Mas, do jeito que as coisas estão, as empresas têm de gastar energia em fazer lobby no governo para sobreviver às dificuldades.
EXAME - Não foi no governo do PT que houve a maior redução da pobreza?
Arminio Fraga - A queda na pobreza ocorreu e é uma ótima notícia. Mas não podemos nos iludir. O brasileiro continua pobre para os padrões globais. Para avançar, precisamos voltar a crescer. Programas como o Bolsa Família são vitais. Mas o crescimento é ainda mais importante na redução da pobreza. Hoje, o que frustra é ver o país com dificuldade em crescer.
EXAME - Na era Fernando Henrique, o PIB pouco cresceu. Seria diferente num eventual governo Aécio Neves?
Arminio Fraga - Vários fatores explicam o baixo crescimento daquele período. Mas olha que coisa interessante: com todos os ajustes que fizemos na economia e com todas as crises que enfrentamos, o Brasil cresceu, no período, pelo menos tanto quanto os países da América Latina. Agora não.
Nos últimos três anos, a América Latina cresceu mais que o dobro do Brasil. Tem algo errado por aqui. Houve crescimento durante o governo Lula. Mas, infelizmente, foi um longo período de pouco investimento e pouco foco em produtividade.
EXAME - Historicamente, a taxa de investimento no Brasil se mantém abaixo de 20%. Como mudar isso?
Arminio Fraga - Tirando alguns anos durante o regime militar, os investimentos nunca deslancharam. No fim da década de 70, começou um longo período de caos, e era natural investir menos. Nos anos 90, o governo de Fernando Henrique foi de arrumação e com crises aqui e ali.
Depois houve as incertezas sobre o governo Lula. Elas foram dissipadas no começo de seu mandato graças ao bom trabalho feito pela dupla Antonio Palocci, na Fazenda, e Henrique Meirelles, no Banco Central. E aí uma surpresa, pelo menos para mim, foi que a taxa de investimento não decolou.
É comum que uma queda na incerteza política seja seguida por forte alta nos investimentos. Isso ocorreu no Chile, na Indonésia. Aqui não. A taxa subiu um pouco, de 16% para 19% do PIB. Por quê? Porque faltou criar um ambiente de segurança aos investimentos. Só o aumento do consumo não basta.
Nos últimos anos, o governo mostrou que não tinha apreço pelas agências reguladoras, que são as guardiãs das regras do jogo. Não mostrou convicção no modelo de concessões ou privatizações. É preciso melhorar esse aspecto.
EXAME - Como o senhor tem colaborado para a campanha de Aécio Neves?
Arminio Fraga - No momento, não participo diretamente da campanha. Mas, às vezes, sou chamado pelo Aécio a opinar. Creio que (se eleito) ele vá contribuir para a remoção de obstáculos ao crescimento. Acredito que um governo deva planejar. O fato de eu ser um liberal não significa que não acredite em planejamento. Eu sinto falta de uma visão de longo prazo.
EXAME - Aceitaria voltar ao governo no caso de uma vitória de Aécio Neves?
Arminio Fraga - Quero ajudar no que eu puder.
EXAME - A economia cresce pouco, mas a renda está em alta. Como a oposição deve se situar diante disso?
Arminio Fraga - Há quem diga que a economia vai mal, mas a sociedade vai bem. É uma ilusão. Se as pessoas votarem olhando para trás, talvez optem pela continuidade. Se olharem para a frente, talvez pensem em mudança, já que a situação atual não é sustentável. O governo tem a favor o desemprego baixo e a melhora nos indicadores sociais.
E contra, o fato de as pessoas estarem mais exigentes. As pesquisas mostram que, há três anos, havia uma pessoa a favor de mudanças e outras duas favoráveis à continuidade. Hoje, dois terços querem mudanças. Há uma insatisfação latente. Uma mudança seria saudável. Espero que, caso se reeleja, a presidente Dilma mude também.