Terminal do Porto de Santos: no topo das prioridades, a competitividade da economia (Germando Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h40.
Pode-se gostar ou não deles. Pode-se concordar ou não com suas ideias e condutas. Mas o fato é que os dois homens que antecederam Dilma Rousseff na Presidência da República podem dizer que têm um legado a oferecer ao país. De Fernando Henrique Cardoso, a maior herança foi o controle da inflação e a estabilização da moeda, pedras fundamentais de qualquer economia. Luiz Inácio Lula da Silva termina seus oito anos de mandato ostentando a retomada do crescimento, com criação de empregos e redução da pobreza.
E da presidente Dilma Rousseff, o que se pode esperar? Num país que continua a apresentar desafios gigantescos em todos os campos — do atraso vexaminoso na educação à corrupção generalizada na política —, para ficar só na área econômica, uma escolha certeira seria a inauguração de um período que poderia ficar marcado como a Era da Competitividade.
O Brasil continua a ter vantagem comparativa em diversos setores, em especial naqueles em que consegue aliar suas condições naturais favoráveis com uma boa produtividade. Até que ponto isso é suficiente para nos levar a uma condição de país próspero é a grande pergunta a ser respondida. Para um número crescente de empresas, a concorrência global tem ficado cada vez mais difícil. Trata-se de um cenário presente tanto na disputa de mercados no exterior como na competição para atender um mercado doméstico ávido por consumir. É o que ocorre em diversas frentes da indústria de manufaturados, desde brinquedos e roupas até autopeças e produtos químicos.
O real forte fez o papel de desnudar as dificuldades de muitos setores para encarar concorrentes, em particular os chineses. Até pouco tempo atrás, a moeda desvalorizada servia como uma espécie de compensação para uma série de deficiências brasileiras, da burocracia kafiana ao estrangulamento dos portos. Sem essa capa protetora, o chamado custo Brasil ficou escancarado — e um número crescente de empresas demonstra que ele se tornou insuportável. O protecionismo pode parecer o caminho mais fácil a ser trilhado para proteger um dos parques industriais mais complexos do Ocidente.
Mas já vimos esse filme no passado — e o final não é feliz. Dilma assume num momento em que fica claro que o Brasil terá, de uma vez por todas, que atacar as próprias deficiências em vez de se proteger da competência alheia. O mais recente relatório de competitividade global, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, coloca o Brasil numa modesta 58ª posição entre os 139 países analisados. Problemas como custo e dificuldade para contratar e demitir funcionários (96ª colocação), falta de segurança (93ª) e a sofrível qualidade da educação (106ª) fazem com que o Brasil fique atrás de nações bem menos desenvolvidas, como Indonésia e Azerbaijão, que ocupam respectivamente a 44ª e a 57ª posição no ranking geral. O Chile, o melhor da América Latina, está em 30º lugar.
A colocação brasileira não é apenas um desempenho constrangedor para a oitava economia do mundo. Trata-se de uma barreira pantanosa para o país continuar seu avanço. “O Brasil construiu uma base muito sólida para o crescimento nas últimas duas décadas, mas ainda é preciso resolver problemas graves, como a ineficiência do governo”, afirma a economista Irene Mia, diretora do Centro de Competitividade Global do Fórum Econômico Mundial. “As fragilidades estruturais são gargalos para o crescimento no longo prazo e deveriam ser tratadas com prioridade pela nova presidente.”
A perda de competitividade fez com que o Brasil passasse a sofrer um processo de desindustrialização que pode se agravar nos próximos anos. Um exemplo desse fenômeno já é visto na cadeia de produção de alumínio, em que teoricamente temos tudo a favor: matéria-prima, energia elétrica e mercado consumidor. Nos últimos anos, um desses ingredientes, a energia, passou de vantagem a desvantagem. A eletricidade brasileira custa hoje o dobro da média observada nos países industrializados, principalmente em razão da carga tributária embutida nas tarifas.
A diferença tem levado as empresas a rever suas estratégias para o país. No começo de dezembro, a indiana Novelis, fabricante de laminados de alumínio, decidiu fechar uma fábrica em Aratu, na Bahia, devido aos altos custos operacionais que faziam a unidade trabalhar no vermelho desde 2009. Outra empresa do ramo, a canadense Rio Tinto, estuda abrir uma fábrica de alumínio no Paraguai, onde a energia é bem mais barata, embora produzida pela mesma fonte que abastece um quinto do Brasil, a usina de Itaipu. A ideia seria processar minério brasileiro na fábrica paraguaia e depois mandar para cá o produto industrializado. Para que o Brasil não se transforme nisso, apenas em fornecedor do insumo e consumidor do produto final, espera-se que Dilma eleja as prioridades corretas — e ataque os problemas de frente. Seu inestimável legado pode ser um país mais competitivo, mais próspero e mais justo.