Ana Laura Sivieri, diretora global de marketing e comunicação corporativa da Braskem. (Eduardo Frazão/Exame)
Editor de Casual e Especiais
Publicado em 14 de junho de 2023 às 06h00.
No SXSW, festival de inovação que aconteceu em Austin em março, Ana Laura Sivieri ficou especialmente impactada com a palestra do chairman da Disney, Josh D’Amaro. “Ele disse algo que é exatamente a base da nossa estratégia: as pessoas se conectam com outras pessoas ou com marcas em momentos de lazer e emoção”, diz. É o que a executiva, à frente da cadeira de marketing da Braskem, procura ao patrocinar ações de educação de reciclagem em eventos como o Rock in Rio e o Lollapalooza.
A Braskem é uma petroquímica que produz resinas plásticas e produtos químicos para diversos segmentos, como embalagens alimentícias, construção civil, industrial, automotivo, agronegócio, saúde e higiene, entre outros, com 40 unidades industriais no Brasil, nos Estados Unidos, no México e na Alemanha. A missão de Sivieri é mostrar a utilidade do plástico e incentivar a cadeia de reciclagem. Uma tarefa difícil, como ela conta na entrevista a seguir.
Como você vê hoje os desafios do marketing em relação ao passado?
Mudou há pouco tempo, eu diria que nos últimos cinco anos. O marketing tinha uma coisa poética, institucional, campanhas grandes com manifestos, uma visão pueril, emocional da marca. Claro que havia campanhas de venda, mas a linguagem era muito trabalhada, plastificada, de um mundo ideal. As pessoas começaram a se conectar de outra forma, de um jeito mais real. Um vídeo no celular hoje tem mais veracidade do que uma megaprodução. Isso fez com que o marketing repensasse a forma de transmitir a mensagem. Quando você vai para uma visão realista, aumenta a conexão com o negócio, não só com a reputação da marca. O que aconteceu na Braskem foi que a gente tinha um marketing institucional, com campanhas de goodwill da marca, mas não falava do produto, as pessoas não sabiam o que a empresa fazia.
Como foi essa mudança na Braskem?
As pessoas têm no inconsciente coletivo que o plástico é ruim. Nosso desafio é trazer para a comunicação os benefícios do plástico e o papel das pessoas nesse ciclo de vida do material. A primeira coisa que mudamos foi dividir a comunicação por stakeholders. Os mais próximos da marca são o mercado financeiro, os clientes, os formadores de opinião em sustentabilidade, que entendem o que a gente faz. Para eles temos uma linguagem direcionada ao ESG, às nossas metas. Com a sociedade usamos linguagens mais leves, de educação ambiental, falamos da importância do plástico e como o ciclo pode ser completo. Isso trouxe aproximação para a marca.
Qual é o desafio do papel de líder de marketing de uma empresa B2B? O consumidor final tem menos importância na comunicação?
Quando falamos do institucional, sim. Mas quando falamos de um produto, como o plástico no atacado, nem tanto. A Braskem é a sétima maior empresa do Brasil, a quinta maior petroquímica do mundo. Precisávamos assumir a comunicação sobre os resíduos plásticos. No imaginário coletivo, quando se pensa numa petroquímica, vem a imagem de Cubatão. Então resolvemos trabalhar para desmistificar uma série de conceitos errados. Isso não gera vendas. Eu não vendo mais com uma campanha como essa. Mas combato um negacionismo ou um viés errado. Isso é pensar no longo prazo.
Como vocês medem o retorno do apoio a ações como a Recycle Rock Braskem, no Rock in Rio?
No Rock in Rio, a pessoa descarta o copo e ganha um brinde. Isso é o que a gente quer construir. A sociedade enxerga que a gente assumiu o problema. Existe resíduo plástico no mundo, muito, e está errado. O que podemos fazer juntos para resolver o problema? No caso de um evento, elaboramos pesquisas internas, lembrando que nosso objetivo não é construção de valor da marca. O engraçado é que a gente foca os consumidores e tem uma resposta muito boa dos stakeholders mais próximos. A economia circular só existe se três atores participam: a iniciativa privada, o consumidor e o poder público. Não há culpa, existem parcelas de ações desses três atores. Num festival de música estamos incentivando o papel do consumidor.
De que outras formas a Braskem ajuda a economia circular?
Eu tenho um desafio, a meta de produzir 300.000 toneladas de resinas recicladas até 2025. Até 2031 será 1 milhão de toneladas. Hoje são menos de 100.000. Qual é o gargalo? Não temos acesso a lixo de qualidade, lixo não contaminado. Ele é caro no Brasil, porque não existe uma estrutura. Só 18% dos municípios brasileiros têm coleta adequada. Então, quanto mais eu educar as pessoas, quanto mais eu ensiná-las a descartar corretamente, melhor será a qualidade do lixo para poder reciclar. Nós ajudamos a empresa a pensar na circularidade da embalagem desde a hora em que ela é produzida. Não adianta eu criar uma embalagem com muito material, muitas cores. A gente fala que o lixo é um erro de design. Se você tiver o design certo do produto, ele vai ser reutilizado ou reciclado.
Quais são os desafios futuros para a Braskem? A inteligência artificial, por exemplo, pode ajudar na sua comunicação?
Pensamos no uso da tecnologia para ajudar a tirar dúvidas. Se eu estou no supermercado e fico na dúvida entre dois produtos, um aplicativo pode me auxiliar na avaliação. Na hora da reciclagem, se a cooperativa consegue identificar adequadamente o material, a produtividade aumenta. Temos um gap de tecnologia que pode ser complementado pela inteligência artificial. E precisamos incentivar as marcas a assumir responsabilidades. Uma marca pode trocar uma embalagem por papel. Mas fez o estudo adequado, avaliou o impacto? Muitas vezes o plástico é a melhor solução, mas existe uma percepção de que é nocivo. E cada vez mais o marketing precisa ser educativo. As empresas têm um compromisso de ajudar a sociedade a dar passos. Se as empresas não fizerem isso, não estarão no papel delas.