Revista Exame

O dólar tem a força

No início da crise que abalou o mundo nos últimos anos, muitos disseram que a moeda americana estava prestes a perder o brilho - a realidade mostrou justamente o contrário

Casa da Moeda americana: a busca por ativos seguros fortaleceu a posição do dólar (Paul J. Richards/AFP Photo)

Casa da Moeda americana: a busca por ativos seguros fortaleceu a posição do dólar (Paul J. Richards/AFP Photo)

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Da Redação

Publicado em 28 de fevereiro de 2014 às 06h00.

São Paulo - Não foram poucas as vozes que, no início da última crise econômica mundial, afirmaram que o reinado do dólar estava com os dias contados. O epicentro da crise era justamente o mercado financeiro americano. Na tentativa de animar a economia, o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, passou a imprimir dólares num ritmo frenético — algo próximo a 1 trilhão por ano.

Ao mesmo tempo, o endividamento público aumentava a passos largos. Tudo isso parecia reforçar uma tendência histórica. Desde meados da década de 70, a força do dólar como moeda internacional vinha numa lenta queda.

Economistas famosos, como Paul Krugman, ganhador do Nobel de Economia em 2008, e Barry Eichengreen, professor de economia da Universidade da Califórnia, em Berkeley, engrossaram o coro dos que acreditavam na perda de relevância do dólar. Era só esperar para ver.  

Passados mais de cinco anos desde a eclosão da crise, dá para dizer: não foi desta vez. De 2007 a 2013, o Tesouro dos Estados Unidos emitiu 5,5 trilhões de dólares em títulos para financiar seus déficits orçamentários. Desse total, cerca de 3,3 trilhões de dólares, ou 60%, foram comprados por investidores estrangeiros, incluindo bancos centrais.

A participação do dólar nas reservas internacionais não só parou de cair como subiu desde 2010. Nos últimos três anos, a fatia da moeda americana nos mercados de câmbio subiu de 80% para 87%. O que, afinal, deu errado nas previsões? Por que o dólar voltou a ganhar peso justamente quando a economia americana estava de joelhos? 

Esse é o tema do livro The Dollar Trap (“A armadilha do dólar”, numa tradução livre), recém-lançado nos Estados Unidos pelo economista Eswar Prasad, da Universidade Cornell. Para resumir a explicação de Prasad em cinco palavras, basta dizer: não há alternativas ao dólar.

Ao escolher um título público em moeda estrangeira para compor suas reservas internacionais, os bancos centrais analisam o tamanho da economia do país que emite aquela moeda, seus fundamentos macroeconômicos, a flexibilidade do câmbio, se o sistema financeiro é aberto e se as instituições são fortes. “Por ora, nenhum país conseguiu manter um sistema que concorra com o americano em todos esses quesitos”, diz o indiano Prasad.   

Quando foi lançado, o euro parecia destinado a se tornar um rival de peso. Nos primeiros sete anos, sua participação como moeda de reserva subiu de 24% para 28%, mas desde 2008 acabou perdendo parte da credibilidade por estar na raiz da crise que abalou a Europa.

Desde então, sua fatia no total das reservas globais voltou para o patamar inicial, de 24%. O iuane era outro candidato a tirar o brilho do dólar. A China tem a segunda maior economia do mundo, recentemente tornou-se o país com o maior volume de comércio — a soma das exportações e das importações — e tem um governo ansioso por aumentar a importância de sua moeda.

Os chineses têm encorajado o uso do iuane como meio de troca em transações comerciais e estimulado os bancos centrais mundo afora a manter a moe­da chinesa em suas reservas. Os resultados, porém, têm sido modestos. No ranking das dez moedas mais usadas internacionalmente, o iuane ocupa as últimas colocações.

Fica atrás de dólar, euro, libra, iene, franco suíço, dólar canadense e dólar australiano. No Brasil, o iuane nem sequer figura no relatório do Banco Central sobre composição de reservas. Um dos maiores problemas é que não se trata de uma moeda negociada livremente em escala global.

Isso sem falar na mão pesada do governo no mercado de câmbio chinês, o que não ajuda a dissipar a desconfiança dos investidores. Com o iuane ainda cheio de limitações e o euro em crise, Prasad acredita que o dólar vai continuar reinando.  

Para os Estados Unidos, essa situação é cômoda. O país enfrentou sua maior crise em mais de sete décadas conseguindo imprimir dinheiro à vontade e se endividando. Não faltou demanda por seus papéis mesmo nos momentos em que a polarização política no Congresso americano parecia prestes a paralisar o governo.

Por que então a palavra “armadilha” no título do livro? Quem está preso ao dólar é o restante do mundo. Mesmo com os títulos da dívida americana oferecendo taxas de juro baixíssimas, bancos centrais de todos os continentes não têm pensado duas vezes antes de comprá-los para tentar se proteger de eventuais instabilidades globais. O preço da segurança tem sido alto, mas, como diz Prasad, não há outro lugar para onde correr.

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