A mineradora Vale, um ícone da bolsa: o investidor estrangeiro foge da BM&F Bovespa (Gianluigi Guercia/AFP)
Da Redação
Publicado em 15 de junho de 2012 às 14h06.
Nova York - Não faltou otimismo, um recurso cada vez mais escasso no mundo, para atrair a atenção — e bilhões dólares — para o Brasil nos últimos anos. O B do Bric, o grupo de elite entre os países emergentes, passou a figurar como um eldorado diante da turbulência nos países ricos.
Já há sinais, porém, de que a euforia — pelo menos como se viu até agora — pode perder fôlego. Um deles é a acelerada fuga de investidores estrangeiros na Bovespa, com saldo negativo de 2,5 bilhões de reais entre os dias 1o e 18 de maio. Desde janeiro, a bolsa desvalorizou mais de 10%.
Analistas começam a mudar a perspectiva para o Brasil. Em maio, o Morgan Stanley reduziu a recomendação de investimento no país, diante do fraco crescimento econômico. Em dezembro, o Credit Suisse fez o mesmo.
“Está cada vez mais claro que a economia do país se baseia em premissas instáveis, como o preço de commodities”, diz Ruchir Sharma, diretor do Morgan Stanley para mercados emergentes.
A mudança de percepção não se deve a uma alteração repentina nas bases da economia. Ao contrário. Alguns indicadores demonstram que, sob vários ângulos, o Brasil continua numa situação bem mais confortável que boa parte do mundo. A taxa de desemprego é uma das mais baixas da história.
O investimento estrangeiro direto bateu recorde e chegou a 67 bilhões de dólares em 2011. O ambiente político é tido como o melhor entre os pares do Bric — Rússia, China e Índia. O que parece ter mudado é a aversão a risco dos investidores — sobretudo com o agravamento da crise europeia.
Nesse contexto, o baixo crescimento econômico do país é um sintoma capaz de ofuscar o brilho do país aos olhos dos investidores. Em 2011, o país apresentou a menor expansão entre os pares no Bric, com uma taxa de 2,7%. As projeções indicam que o mesmo acontecerá em 2012.
Medidas tomadas recentemente para acelerar o crescimento, como a desvalorização do real e a redução dos juros, também não animaram os estrangeiros — sobretudo os investidores da bolsa, cujas aplicações em reais automaticamente perderam valor equivalente na moeda americana.
Em dólares, a queda na Bovespa chegou a 15% apenas em maio. “Com a desvalorização do real, os investidores estrangeiros tendem a ser mais cautelosos com o Brasil”, afirmou em relatório Michael Simpson, chefe de investimento para a América Latina do Barings, com sede em Dublin.
Neste ano, o fundo reduziu o investimento em ações brasileiras de 63% para 56% de sua carteira — um número, diga-se, ainda para lá de expressivo.
Economistas defendem que a desvalorização do real e o corte de juros também não vão — sozinhos — impulsionar para valer o crescimento da economia. “As mudanças devem ter efeito marginal na expansão do país”, diz Carlos Langoni, diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro e ex-presidente do Banco Central.
“Diferentemente do que aconteceu até pouco tempo atrás, o endividamento dos brasileiros já está grande e a disposição de concessão de crédito dos bancos deve se retrair com o agravamento da crise financeira na Europa.” Se depender do contexto externo, é uma situação que não vai melhorar tão cedo.
“A situação deve se manter crítica pelos próximos dois anos”, afirma Cam Harvey, professor de economia da escola de negócios da Universidade Duke.
Custo Brasil
É inevitável que, com o baixo crescimento interno e um contexto internacional desfavorável, projetos de expansão das empresas também sejam repensados. Recentemente, o grupo siderúrgico francês ArcelorMittal anunciou o adiamento da expansão de duas obras avaliadas em cerca de 1,5 bilhão de reais — previstas inicialmente para este ano.
“Sem o atrativo de rápida expansão, os problemas de competitividade no Brasil tornam-se mais evidentes”, diz Langoni. De acordo com a empresa de pesquisa de mercados emergentes Frontier Strategy Group, com sede em Washington, a margem de lucro das empresas no Brasil é metade da registrada em outros países da América Latina.
Num relatório, a consultoria cita o depoimento de um cliente: “O Brasil é fundamental para nosso crescimento, mas, para cada ponto percentual de crescimento no país, perdemos rentabilidade na América Latina”.
Há o consenso de que o país tem uma lição de casa a ser feita para a economia deslanchar. Nem mesmo prognósticos otimistas ignoram a necessidade de tornar o ambiente de negócios menos burocrático e caro. Segundo relatório recente da OCDE, o PIB brasileiro deve crescer 3,2% neste ano e 4,2% no ano que vem.
Mas o documento deixa claro que, para combater o fraco desempenho da indústria, deveria haver simplificação tributária e investimento em infraestrutura. “Se o Brasil quiser crescer, terá de fazer reformas”, diz o economista Ken Rogoff, professor de Harvard. Otimismo, claro, sempre ajuda. Mas, daqui para a frente, será preciso muito mais do que isso para garantir prosperidade.