Fábrica da Volkswagen Caminhões e Ônibus: o plano é abrir um segundo turno de produção e contratar | Daniel Marenco/Folhapress /
Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2018 às 05h56.
Última atualização em 8 de novembro de 2018 às 05h56.
A Fábrica da Volkswagen caminhões e ônibus, em Resende, no Rio de Janeiro, chegou a funcionar em três turnos, incluindo os sábados, para produzir 800 veículos por dia. O ano era 2011 e o Brasil ainda vibrava com o consumo aquecido e com a crença de que seríamos a quinta potência do mundo. Quando veio a recessão, a montadora sofreu um baque: chegou a operar em apenas um turno, de segunda a quinta-feira, e a entregar não mais que 200 veículos por dia em fevereiro de 2015. À medida que a economia começou a se recuperar, a linha de montagem aos poucos voltou a trabalhar todos os dias da semana, mas ainda em um só turno.
No fim de outubro, a companhia anunciou que contratará 350 funcionários e que, depois de anos, vai retomar o segundo turno parcial em Resende em dezembro, elevando em 10%, pelo menos, a produção atual, de 400 caminhões e ônibus por dia. “Em geral, o fim do ano costuma ser mais fraco com as vendas andando de lado até o Carnaval, mas não é o que estamos vendo. Isso mais a expectativa positiva para o próximo ano nos fizeram tomar essa decisão”, diz Roberto Cortes, presidente da VW Caminhões e Ônibus. Segundo ele, 1,5 bilhão de reais devem ser investidos até 2021 em “inovação, digitalização e em caminhões e ônibus elétricos”.
A VW Caminhões e Ônibus não é um caso isolado. Empresários e executivos de empresas de diferentes setores têm se revelado otimistas com o futuro próximo da economia e dos negócios — e retomado planos de expansão. Uma pesquisa da consultoria de gestão BTA com 362 presidentes, diretores e conselheiros de grandes empresas, e feita com exclusividade para EXAME, mostra que 52% dos entrevistados pretendem ampliar investimentos e 46% planejam contratar em 2019. Outros 39% creem que o faturamento de suas companhias no próximo ano aumentará pelo menos 10% acima do apurado em 2018.
É possível que parte dos entrevistados já estivesse planejando investimentos e contratações há meses, motivados por uma esperada melhora nos negócios puxada pela recuperação da economia. Mas outra pergunta da pesquisa mostra que a maioria mudou de humor recentemente. Em julho, em outra pesquisa da BTA, apenas 11% dos entrevistados disseram estar otimistas ou muito otimistas com o futuro do país. No fim de outubro, a taxa passou para 77%. Outro levantamento inédito, realizado pela Associação Brasileira de Automação em parceria com a consultoria 4E e divulgado no início de novembro, indica que houve aumento de 20% na intenção das empresas de lançar produtos ainda neste ano.
O que explica essa animação? EXAME fez essa pergunta a 25 empresários, executivos de companhias e de bancos nas últimas semanas e ouviu da maioria que existe uma expectativa positiva em relação ao governo de Jair Bolsonaro. “Devemos ter um país totalmente diferente“, diz Rodolfo Riechert, presidente do banco Brasil Plural. “O novo governo tem mostrado que valoriza os empresários, que costumam ser malvistos aqui. Com essa mentalidade, deve adotar medidas que tornem o ambiente mais propício para investir.” Riechert afirma que tinha dois planos antes da eleição: se Fernando Haddad ganhasse, cortaria 30% dos funcionários; com a vitória de Bolsonaro, decidiu contratar mais 30%, especialmente para a área do banco de investimento, responsável por assessorar aberturas de capital e fusões e aquisições, e para a plataforma de investimentos Genial (três dias após o segundo turno, a Genial lançou uma campanha de marketing, estrelada pelo tenista Gustavo Kuerten, e divulgou o objetivo de dobrar a cada ano o total de clientes, que hoje está em 150.000).
Claro que os empresários geralmente gostam de elogiar o governo em público. A empolgação com o futuro da economia pode ser sentida no varejo, nos serviços e em certas áreas da indústria. Apesar de ter acumulado um prejuízo de 1,6 bilhão de reais de janeiro a setembro deste ano, a companhia aérea Gol resolveu manter o plano de gastar 600 milhões na compra de aeronaves e na ampliação de rotas e destinos. “Nosso cenário-base é de crescimento. Com uma economia mais forte, as famílias devem viajar mais a lazer e os executivos devem retomar a agenda de viagens de negócios. Também prevemos que haverá menos volatilidade no câmbio, um dos componentes mais importantes de nossos custos”, diz Paulo Kakinoff, presidente da Gol (as ações da empresa, movidas pelo anúncio da reintegração da Smiles, seu braço de programas de fidelidade, subiram 85% apenas em outubro e novembro, a maior alta entre os papéis do Ibovespa).
A Lojas Cem, uma das maiores fornecedoras de móveis e eletrodomésticos do interior paulista, que fatura 5 bilhões de reais por ano, prevê aportar 150 milhões, 50% acima do investido em 2018, para colocar em operação 12 lojas e um novo centro de distribuição em 2019. A rede de varejo de moda Riachuelo planeja investir 600 milhões de reais na reforma de lojas e na abertura de 20 filiais no próximo ano. Segundo Flavio Rocha, sócio da companhia, o valor do investimento foi elevado após a vitória de Bolsonaro (ele não revela o montante anterior). Rocha foi pré-candidato à Presidência da República e, depois que desistiu, passou a apoiar Bolsonaro.
Outros dois entusiastas do capitão desde antes do primeiro turno também anunciaram investimentos. Salézio Martins, dono da Kyly, fabricante catarinense de roupas infantis que fatura 400 milhões de reais por ano, pretende comprar novas máquinas no valor de 40 milhões para ampliar a produção em 2019. Luciano Hang, dono da loja de departamentos Havan — que, durante a campanha eleitoral, divulgou um vídeo nas redes sociais dizendo que, se Bolsonaro não ganhasse, haveria demissão de 15.000 funcionários — afirmou que investirá 500 milhões de reais para abrir 20 lojas.
Um grupo diferente de empresas está na fase de revisar os planos, redobrando a aposta no país. A Motorola Solutions, multinacional especializada em fabricar equipamentos de segurança, prepara novos aportes em pesquisa e desenvolvimento no Brasil. Está no radar a expansão de parcerias já existentes com centros de pesquisa, como o Cesar, em Recife, e a Universidade Federal de Campina Grande, na Paraíba. “O Brasil deve se consolidar como um dos dez maiores mercados para a empresa em 2019”, diz Elton Borgonovo, presidente da Motorola Solutions no Brasil.
A montadora japonesa Nissan pretende aumentar em 20% a produção da fábrica em Resende, no Rio, em 2019 e avalia a possibilidade de contratar mais funcionários e abrir um terceiro turno. Até empresários da China — as aquisições chinesas de ativos brasileiros foram criticadas por Bolsonaro — estão animados. Segundo o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, presidente no Brasil da fabricante chinesa de caminhões Foton, executivos da sede da companhia virão ao Brasil em novembro para avaliar novos investimentos. “Eles estão eufóricos, porque mudou a percepção sobre a economia brasileira. Pela primeira vez, temos um presidente com um discurso liberal e com um desejo de política econômica que parece ser o correto considerando os nossos desafios”, diz Mendonça de Barros.
O impacto da confiança
O movimento que se vê agora no meio empresarial começou ainda durante a campanha eleitoral na bolsa de valores. Depois que a vitória de Geraldo Alckmin, o preferido dos investidores, começou a se mostrar improvável, gestores e analistas passaram a torcer por Bolsonaro e a comprar ações sempre que ele subia nas pesquisas de intenção de voto. Com isso, o Ibovespa subiu 10% apenas em outubro — enquanto a maioria das bolsas de países emergentes perdia valor — e bateu recorde de pontuação no início de novembro (as ações de empresas do setor imobiliário e de estatais estão entre as que mais valorizaram). O sentimento de empresários e investi-dores passou a ser referendado pelos economistas, que começaram a prever uma economia mais forte se Bolsonaro vencesse as eleições.
O clima de confiança, por si só, já pode ajudar a economia e os negócios. Um exemplo: a queda do dólar, que foi de 12% desde meados de setembro, colabora para conter a inflação. Por isso, alguns analistas estão revisando as projeções para os juros, acreditando que o aumento previsto para 2019 pode demorar mais para ocorrer. Juros mais baixos significam um custo de financiamento menor, tendendo a beneficiar empresas e consumidores.
“Cria-se um ciclo virtuoso, em que os empresários se sentem mais confortáveis para investir. O crescimento se torna quase uma profecia autorrealizável”, diz Betania Tanure, sócia da BTA. Alguns executivos ouvidos por EXAME dizem que parte da motivação para traçar planos de expansão tem justamente o objetivo de contribuir para fazer o país crescer. “Os empresários precisam fazer sua parte”, diz Besaliel Botelho, presidente da fabricantes de equipamentos Bosch, que pretende investir 130 milhões de reais no Brasil no próximo ano, o mesmo valor de 2018.
Em meio à euforia, as escorregadas de Bolsonaro e o fato de ele entender pouquíssimo de economia, como já admitiu, têm sido minimizados. Para muitos empresários e analistas, o novo presidente tem dado sinais de que abraçou a agenda liberal e de reformas defendida por Paulo Guedes, anunciado como seu ministro da Economia. “Bolsonaro não escolheu Paulo Guedes para comandar a economia porque achou que ganharia votos com isso. A agenda liberal não dá votos. Escolheu porque deve concordar com ele”, diz José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial.
“Para investir, o empresário precisa de estabilidade de regras e confiança de que caminhamos na direção de resolver os principais problemas do país e destravar a economia. Temos essa expectativa”, diz José Luiz Rossi, presidente da empresa de análise de informações de crédito Serasa Experian. Bolsonaro votou contra o projeto do cadastro positivo, base de dados sobre o histórico de pagamentos de consumidores, defendido pela Serasa como algo que contribuirá para reduzir os juros na ponta. Rossi não vê problema. “Ele deve ter votado contra por falta de informação”, diz. Essa votação se deu neste ano. Num passado mais distante, Bolsonaro votou contra as principais tentativas de reforma da Previdência e também foi contrário às privatizações — propostas que defende agora.
Mas existem, claro, empresários que enxergam essas contradições, e outros que estão céticos em relação ao que deve ser o próximo governo. Como era de esperar, há industriais nesse grupo — numa das primeiras declarações à imprensa depois da vitória do chefe, Paulo Guedes disse que o governo “salvaria a indústria brasileira apesar dos industriais” e criticou o fato de esses empresários, segundo ele, defenderem o protecionismo. Para Fernando Figueiredo, presidente da Associação Brasileira da Indústria Química, é “injusto” afirmar que apenas a indústria busca subsídios e medidas protecionistas. “Se tivéssemos toda a ajuda que tem o agronegócio, a indústria brasileira estaria facilmente entre as melhores do mundo.”
Robson Braga de Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, diz que essas empresas só vão investir “para valer” quando — e se — vierem “sinais mais concretos” da parte de Bolsonaro. “O mercado precisa entender as propostas que estão sendo colocadas”, afirma Andrade (leia a entrevista completa). Walter Schalka, presidente da fabricante de papel e celulose Suzano, diz: “Só ficarei otimista de fato se o governo emplacar as reformas da Previdência e tributária, se avançar no plano de equilibrar as contas públicas e retirar subsídios”. Para que o país cresça de fato, na visão de Schalka, é preciso ter um plano de aumento da produtividade. Segundo a Fundação Getulio Vargas, um brasileiro gera, em média, 16,80 dólares por hora trabalhada, índice que coloca o Brasil na 50a posição em uma lista com 68 países.
Na visão dos entrevistados na pesquisa da BTA, o maior risco do governo Bolsonaro é a inexperiência na gestão pública e na articulação política — isso poderia dificultar (ou, no limite, impedir) a realização das reformas. Mas apenas em torno de 20% dos empresários apontaram esses problemas. Os demais não indicaram nenhum risco particular. O ponto é que, se as reformas não forem aprovadas, a expectativa positiva para a economia poderá se esvair, e isso significa que muitos dos investimentos anunciados agora não se materializem ou se transformem em capacidade ociosa no futuro. O entusiasmo atual, então, ficaria sendo apenas mais uma onda passageira.
O governador eleito de Minas Gerais, Romeu Zema, encara o desafio de colocar em prática na gestão pública algumas iniciativas que deram resultado no setor privado | José Roberto Caetano, de Belo Horizonte
O empresário Romeu Zema, sócio de um grupo varejista que vende de combustíveis a eletrodomésticos, com faturamento anual de 4,5 bilhões de reais, tem um grande desafio a partir de 1o de janeiro de 2019: governar Minas Gerais, um dos estados mais endividados do Brasil. Eleito no segundo turno com 72% dos votos válidos, o candidato do partido Novo promete enxugar a máquina pública e criar um ambiente mais favorável para os negócios. “Quero sentar boa parte do meu tempo com quem investe e com quem gera empregos”, afirma Zema.
Em uma entrevista recente, o senhor declarou que os empresários sempre atuaram na promiscuidade ou foram totalmente ausentes da política. O que o senhor quis dizer com isso?
Temos dois tipos de empresário. Um deles eu fui até um ano atrás: sempre fui totalmente ausente da política. Até falava aos meus executivos: “Já temos problemas demais. Vamos focar na empresa e deixar os problemas do Estado para os políticos”. Mas, depois que o Novo me procurou, comecei a ver que nós, empresários, somos apenas uma cabine dentro do navio. Se o navio estiver indo para o lugar errado, e é geralmente o governo que dirige esse navio, corremos o risco de sermos uma excelente empresa numa Venezuela. Aí decidi encarar esse desafio. Queria mostrar que há empresários que não precisam ficar ausentes, como fiquei durante 53 anos, nem precisam se aproximar do governo por interesses próprios, que é a tal promiscuidade. Estou aqui desinteressado, tanto que só vou receber salário de governador quando a folha de Minas estiver em dia.
Minas Gerais tem uma dívida estimada em mais de 100 bilhões de reais. Como o senhor pretende melhorar as finanças públicas?
Já enviamos uma equipe a Brasília para começar uma conversa para renegociar a dívida com a União, que é de 70 bilhões a 80 bilhões de reais. Essa conversa poderia ter sido feita pelo atual governador, Fernando Pimentel. Não foi feita porque ele se negou a adotar medidas de austeridade, que vamos adotar. Vamos ter uma condição diferente. O pagamento de juros pode ser postergado e a taxa de juro pode ser revista. Tudo isso vai ajudar, porque a situação financeira do estado é muito frágil.
Como Minas Gerais chegou a esse ponto?
O Estado no Brasil funciona de forma extremamente perniciosa para a população. Vamos eliminar de 5 000 a 10 000 postos desnecessários, muitos deles com salários altíssimos. Além disso, há uma ‘força aérea’, vários helicópteros e aviões disponíveis para o governador e o vice-governador. Por que não usar táxi aéreo ou um avião de carreira? Quero começar a mudar essa cultura que vigora em muitas áreas públicas no Brasil, de que quem está no Estado em certos cargos tem de viver com esse fausto todo, com essa quantidade enorme de privilégios.
Um de seus pilares, então, é desmontar as estruturas ineficientes. Quais seriam os outros objetivos de seu governo?
Há várias empresas que querem se instalar em Minas. Existe um projeto de mineração em análise na Secretaria do Meio Ambiente há mais de dez anos com a ideia de gerar 550 empregos. Isso só numa das empresas. Aí você multiplica isso por várias outras. Uma coisa que atrapalha muito é a falta de agilidade nos processos ambientais. Parece que esqueceram que há gente que quer investir, que quer produzir, que quer criar emprego, e a participação de Minas na economia do Brasil nos últimos 20 anos só decresceu. Os últimos governadores de Minas Gerais perderam contato com o mundo produtivo. Quero sentar boa parte do meu tempo com quem investe e com quem gera empregos.
Para atrair empresas, sua ideia, então, é reduzir a burocracia…
A legislação do ICMS de Minas tem 1.000 páginas. A quantidade de obrigações acessórias que o contribuinte mineiro tem de cumprir não serve para nada. É como se todo dia você tivesse de dizer ao Estado o seu peso. É até bom para sua saúde, mas o que o Estado vai fazer com a informação? É mais ou menos isso que a Secretaria da Fazenda exige dos contribuintes, coisas que não melhoram a arrecadação. Quero simplificar isso.
O senhor pretende colocar em prática no governo iniciativas que deram certo no setor privado. Mas nem tudo dá para ser transplantado automaticamente.
Você tem razão. Mas há muita coisa possível de ser feita imediatamente. Uma delas é a redução de cargos. Não vou extinguir vagas, mas vou deixá-las em aberto. Isso vai gerar uma economia gigantesca, pois tanto as empresas estatais quanto as autarquias se transformaram em cabide de empregos.
E como vai ser sua relação com Jair Bolsonaro? O senhor concorda com o discurso dele como um todo ou há diferenças?
Posso dizer que estou muito confortável com o governo do presidente Bolsonaro. Na área econômica, tudo o que ele disse que quer fazer é o que o Novo propõe. É diminuir esse carrapato que está hoje maior do que a vaca, para que a população tenha uma vida melhor, com menos sacrifício, menos impostos e menos perturbação. Eu sempre falo que nem com a esposa a gente está alinhado em tudo. Uma diferença ou outra sempre vai haver, mas temos tudo para ter um diálogo excelente.