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Saque da poupança encarece crédito imobiliário e abre espaço para mercado de R$ 600 bilhões

Instrumentos alternativos para financiamento do setor têm ganhado relevância nos últimos anos; CRI, LIG e LCI são destaque

Saque da poupança encarece, e o mercado  de capitais vira fonte de 600 bilhões  de reais para o setor imobiliário (Witthaya Prasongsin/Getty Images)

Saque da poupança encarece, e o mercado de capitais vira fonte de 600 bilhões de reais para o setor imobiliário (Witthaya Prasongsin/Getty Images)

Publicado em 26 de outubro de 2023 às 06h00.

A maior e mais barata fonte de financiamento do mercado imobiliário está secando: o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Próximo de 740 bilhões de reais, o saldo da poupança corresponde a 36% de toda essa estrutura de crédito para a construção e aquisição de imóveis. Mas essa fatia já foi muito maior. Em 2021, quando o pagamento de auxílio via poupança elevou seu saldo para acima de 850 bilhões de reais, o SBPE chegou a representar a metade do total, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).  A redução, impulsionada pelos resgates de pessoas físicas, tem encarecido as linhas de crédito do setor e tornado os bancos mais seletivos em sua concessão.

Esse resgate, nos primeiros oito meses do ano, foi de 66,7 bilhões de reais. “O banco empresta para as construtoras a uma taxa de rendimento da caderneta de poupança adicionada de um spread. A redução dos recursos disponíveis gerou cerca de 3 pontos percentuais de encarecimento em relação a dois anos atrás”, afirma Ricardo Paixão, CFO da MRV. As taxas mais altas e o nível de endividamento elevado para os padrões da empresa levaram a incorporadora mineira a levantar dinheiro por meio da emissão de ações. Em julho, a companhia emitiu 1 bilhão de reais em ações, em sua primeira oferta pública subsequente (follow-on) em 14 anos. A estratégia foi seguida pela Tenda e pela Direcional, que levantaram juntas mais 615 milhões de reais por oferta primária.

Apesar das vantagens do financiamento via bolsa de valores, o acesso é restrito apenas às maiores empresas e em janelas de maior apetite do investidor pelo mercado de ações. Já a porta que está sempre aberta é a de instrumentos de dívida — e é esta que tem dado suporte ao mercado imobiliário. Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI), Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e, mais recentemente, a Letra Imobiliária Garantida (LIG) são títulos que se tornaram cada vez mais importantes para o financiamento do mercado imobiliário. Em dois anos, esses três títulos passaram de 15% para 29% de toda a estrutura de funding do setor.  Juntos, o valor soma 600 bilhões de reais — o maior volume da história e 65% maior que o do ano passado.

A emersão dos CRIs

Nesse período, a representação do CRI dobrou, passando de 99 bilhões de reais para 198 bilhões de reais. “Há uma grande demanda por esse tipo de investimento, por ser de longo prazo e ter uma renda fixa, além de ter taxas de remuneração atrativas”, disse Vitor Martins, sócio-sênior e head de crédito da VBI Real Estate, gestora de fundos imobiliários com 9 bilhões  de reais sob gestão. Os fundos imobiliários são os principais compradores de CRI.

A indústria de fundos de papel, que investem em dívidas imobiliárias, cresceu 611%, desde o início de 2018, para um valor de mercado de 65,6 bilhões de reais, segundo o TC Economatica. Nesse período, o número de pessoas que investem em fundos imobiliários cresceu de 208.000 para mais de 2 milhões, segundo dados da B3. “Os fundos imobiliários foram beneficiados pelos saques da poupança por serem uma porta de entrada para a renda variá-vel”, comentou Artur Losnak, head de fundos imobiliários do TC.

Pessoas físicas trocam poupança por LIGs e LCIs

Mas são as LCIs e LIGs que têm concentrado o maior investimento direto de pessoas físicas no mercado imobiliário. Em agosto, o saldo de investidores de varejo em LCI bateu 218,4 bilhões de reais, mais de sete vezes acima do montante investido em CRIs. O crescimento desde o fim de 2017 supera 90 bilhões de reais. O LIG, que nem sequer havia sido lançado naquele ano, já acumula 80 bilhões de reais em investimentos dos segmentos private e varejo. Entre os fatores que explicam a preferência por esses instrumentos, estão a isenção de imposto de renda, a maior segurança, por terem garantia do Fundo Garantidor de Créditos, e a rentabilidade.

Hoje, com poucos cliques, o investidor encontra LCIs que pagam 100% do CDI. O maior acesso à educação financeira e a esse tipo de investimento é citado por Filipe Pontual, diretor-executivo da Abecip, como fator que explica os resgates da poupança. Em condições normais, a poupança rende 70% do CDI, mas quando a Selic supera 8,5% o rendimento é travado em 6,17% ao ano, acrescido da taxa referencial (TR). “O perfil do poupador está mudando. Com o investidor olhando para outros produtos além da poupança, o dinheiro, quando sobra, é alocado em LIG, CRI, LCI e outros investimentos. Esses instrumentos são fundamentais para suprir a demanda de crédito imobiliário, mas a queda da poupança torna esse crédito mais caro.” 

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