Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama (Larry Downing/Reuters)
Da Redação
Publicado em 1 de outubro de 2015 às 10h53.
São Paulo — O debate entre os pré-candidatos do Partido Republicano à Presidência dos Estados Unidos em setembro contou com a presença dos 11 principais postulantes ao cargo.
Por longas 3 horas, falou-se de imigração, saúde, drogas e até se Donald Trump manteria uma insinuação feita anteriormente sobre a suposta falta de beleza de Carly Fiorina, ex-presidente da empresa de tecnologia HP, que agora quer chegar à Casa Branca. Fora um ou outro comentário sobre impostos e salário mínimo, não houve uma análise profunda sobre a saúde da economia americana.
É bem possível que essa ausência se deva ao fato de que, passados oito anos do estouro da crise, os atuais dados econômicos apresentados pelo governo do democrata Barack Obama sejam, em larga medida, positivos.
O crescimento do PIB no segundo trimestre foi 60% superior ao esperado; a abertura de vagas foi a maior desde o início da atual série histórica, em 2000; a taxa de desemprego, atualmente em 5,1%, é a menor em dez anos. Grande parte das novas vagas de trabalho está sendo criada no varejo e no que os americanos chamam de trabalhos de escritório — o que inclui de secretárias a engenheiros de software.
É certo que ainda há muito o que melhorar — a renda dos trabalhadores está estagnada há cerca de seis anos —, mas hoje a confiança dos americanos no futuro é, sem dúvida, muito maior.
Com essas notícias, o mercado está revisando para cima a previsão de elevação do PIB em 2015. O novo consenso é que o percentual fique em torno de 2,5%. Caso essa previsão se materialize, os Estados Unidos terão crescido num ritmo anual acima de 2% por dois anos consecutivos, algo que não acontece desde a crise.
Nada mal para uma economia que teve seu potencial de crescimento reduzido por uma grande recessão — a economia encolheu 0,3% em 2008 e 2,8% no ano seguinte. Um estudo do banco Barclays diz que, nos anos 90, o país conseguia ter uma taxa de aumento do PIB de 3% sem gerar grandes distorções, como o aumento da inflação.
Agora não mais. O teto estaria perto de 2,5%. A explicação passa pela crise, mas também inclui questões mais estruturais, como o envelhecimento da população. O que agora está fazendo a locomotiva americana andar numa velocidade perto do novo limite são as famílias.
“O aumento do consumo, que responde por 70% do PIB, está garantindo a recuperação que estamos vendo”, diz Jesse Hurwitz, economista do banco Barclays em Nova York. A movimentação nas caixas registradoras da Home Depot, principal rede de material de construção do país, confirma esse diagnóstico.
No segundo trimestre, as vendas da varejista aumentaram 5,7% em comparação com o mesmo período de 2014 — um percentual acima dos 4,7% esperados pelos analistas de mercado. “As pessoas estão se sentindo confiantes e, com isso, investem mais em suas casas”, disse Craig Menear, presidente da Home Depot, numa apresentação em agosto.
Nas lojas do varejista Walmart está sendo observado o mesmo fenômeno. No segundo trimestre, houve um aumento de vendas 50% maior do que o mercado previa. Esses resultados ficam ainda mais expressivos quando se leva em conta a atual conjuntura da economia mundial. No começo deste ano, o FMI acreditava que o PIB global teria uma alta de 3,8% em 2015. Agora já está em 3,3% — e com viés de baixa.
O cenário internacional, por sinal, foi uma das razões apontadas por Janet Yellen, presidente do Federal Reserve, banco central americano, para não elevar a taxa de juro — há quase sete anos próxima de zero — na reunião realizada em meados de setembro.
Apesar de toda a expectativa por um aumento, o Fed passou a mensagem de que teme uma piora da situação na Ásia (leia-se China) e na América Latina, algo capaz de afetar negativamente o crescimento americano — e o bom momento do mercado de trabalho, uma das metas da política monetária dos Estados Unidos.
Com a Europa e o Japão quase paralisados, o Fed decidiu esperar mais um pouco para elevar os juros. Também contou muito o fato de a inflação ainda estar abaixo da meta de 2% — lá, ao contrário daqui, o esforço é para aumentar o índice de preços, e não baixá-lo. Toda essa cautela tem um bom motivo. A atual recuperação americana é a mais lenta das últimas cinco décadas.
Tomando como base seu histórico, a economia deveria estar crescendo entre 10% e 20% mais. Nas recessões anteriores, o foco do problema tinha sido mais doméstico. É sintomático que, agora, os economistas focados nos Estados Unidos estejam de olho no que está acontecendo na China para tentar prever os próximos passos do Fed.
Os perigos que rondam o bom momento americano incluem outros fatores, como a valorização do dólar. Desde meados do ano passado, a moeda teve uma elevação de quase 20%, o que encarece as exportações e deverá afetar negativamente o PIB no ano que vem. Com o preço do barril do petróleo abaixo de 50 dólares, o setor de gás e petróleo de xisto está puxando o freio de mão e dando sinais de crise.
As empresas de energia nos Estados Unidos não param de dar calote — o nível atual é o maior desde 1999. Mesmo com todos esses riscos, os Estados Unidos parecem ser um porto seguro. O fato de Janet ter ressaltado seus temores sobre os países emergentes fez com que o mercado respondesse, no dia seguinte, com a alta da demanda por títulos do Tesouro americano.
Quando os juros de fato subirem, aumentando a rentabilidade desses papéis, é provável que muitos investidores hoje presentes nos emergentes decidam migrar suas aplicações para os Estados Unidos.
Nas contas de alguns analistas, o Brasil deverá ser um dos mais afetados. Nos próximos debates, os pré-candidatos republicanos poderão continuar falando sobre temas risíveis, como os atributos pessoais de Carly Fiorina, mas o que realmente interessa ao Brasil e ao restante do mundo é a saúde da economia americana.