Revista Exame

Na bolsa americana a crise já acabou

O avanço no mercado de ações americano segue um ritmo mais vigoroso que os próprios sinais de melhora da economia — e estimula a volta dos IPOs no país

Bolsa de Nova York: otimismo resistente até mesmo a más  notícias  da economia (Shen Hong/Xinhua Press/Corbis)

Bolsa de Nova York: otimismo resistente até mesmo a más notícias da economia (Shen Hong/Xinhua Press/Corbis)

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Da Redação

Publicado em 26 de abril de 2012 às 11h07.

Nova York - Após o aguardado lançamento da nova versão do iPad, na primeira semana de março, a notícia mais espantosa sobre a Apple passou longe de sua incensada capacidade de inovação tecno­lógica. Tinha a ver com dinheiro — uma quantidade astronômica dele.

Num intervalo de apenas um mês, a Apple acrescentou 100 bilhões de dólares a seu valor de mercado. A empresa vale atualmente 565 bilhões de dólares, mais do que todas as varejistas americanas somadas. Neste ano, seus papéis já acumulam uma valorização de 50% — e representam 1,1% do mercado global de ações.

Além de observar o ritmo das vendas do novo iPad, que chegou a quase 1 milhão de unidades por dia, os investidores ficaram radiantes com o anúncio de que a Apple voltaria a distribuir dividendos, depois de quase duas décadas.

O desempenho da Apple é o exemplo máximo do otimismo que tomou conta do mercado de ações americano nestes primeiros meses do ano. Em março, os principais índices retornaram a patamares iguais ou melhores do que os registrados antes do estouro da última crise financeira mundial.

O índice Nasdaq Composite, que reúne papéis negociados na bolsa eletrônica americana, bateu novamente os 3 000 pontos pela primeira vez desde dezembro de 2000 — e encerrou no dia 23 de março a sexta semana consecutiva de alta.

O Standard & Poors 500, que reúne as 500 maiores companhias listadas no país, subiu 12% no ano. “É um cenário melhor do que se esperava para os primeiros meses do ano”, diz Craig Drill, diretor do fundo de hedge Craig Drill Capital, com sede em Nova York.

A empolgação dos investidores resistiu até mesmo a algumas más notícias, como a segunda queda consecutiva na venda de imóveis nos Estados Unidos, anunciada num momento em que os analistas projetavam uma recuperação. O preço da gasolina continua em alta.

Os sinais de melhora na economia americana vêm do mercado de trabalho, com a lenta diminuição da taxa de desemprego, e do varejo, cujas vendas subiram 1,1% em fevereiro. Ainda não dá para soltar fogos de artifício, convenhamos. Então, por que as ações subiram tanto?


Embora modestos, os indicadores positivos da economia foram suficientes para garantir certa tranquilidade aos investidores. Além disso, em termos relativos, há muito para comemorar. Os Estados Unidos são o paraíso quando comparados à Europa — e muitos analistas acreditam que investidores assustados com a situação no Velho Mundo levarão seu capital para lugares mais seguros, como o mercado americano.

Com taxas de juro baixíssimas e um mercado imobiliário ainda errático, a bolsa é de longe a opção mais atraente no país neste momento. “Avaliamos que chegou a hora de dizer adeus aos títulos públicos e comprar ações, que deverão entrar numa tendência de alta nos próximos anos”, escreveu Peter Oppenheimer, chefe de estratégia para o mercado de ações do banco Goldman Sachs, num relatório publicado no dia 20 de março.

Por enquanto, não há indícios de que exista uma bolha, hipótese quase imediata para quem vê a Nasdaq de volta a níveis registrados em dezembro de 2000 e se lembra dos estragos causados pela bolha ponto-com. Em primeiro lugar, a massa de companhias listadas atualmente é bem diferente do que se via naquela época.

Em 2000, quando a Cisco chegou a valer mais de 500 bilhões de dólares, o preço de suas ações equivalia a mais de 100 vezes seu lucro. Hoje, as ações da Apple valem 22 vezes mais do que seu lucro em 2011. No quadro geral, as previsões apontam para uma melhora nos resultados das empresas listadas.

O Bank of America Merrill Lynch estima que o lucro das companhias incluídas no S&P500 cresça 6,4% neste ano. “O mercado tem muito espaço para se recuperar depois de uma década em que não chegou a lugar algum, seguida por uma queda abrupta em 2008”, diz Charles Krusen, diretor da gestora de investimento Krusen Capital, de Nova York.

Estoque de IPOs

O ânimo incentivou uma volta das estreias de empresas na bolsa. “Existe um estoque de centenas de companhias que ameaçaram abrir o capital em 2011 e desistiram”, diz Drill, do Drill Capital. O número de IPOs caiu 20% em 2011, para 134 operações. Segundo um estudo da consultoria BDO, os banqueiros preveem um aumento de 6% no número de lançamentos neste ano.


O mais aguardado deles é o do Facebook. Outras companhias que vinham adiando os planos de ingressar na bolsa também já anunciaram a intenção de acelerá-los — entre as quais o fundo de private equity Carlyle e a empresa de venda de pacotes de viagem pela internet Kayak.

A desenvolvedora de jogos eletrônicos Zynga, que decepcionou em sua estreia, em dezembro, já vê sinais de recuperação em suas ações neste ano. “O mercado está otimista, mas não existe ganho fácil”, diz o analista Krusen. “Só quem apresenta bons resultados convence os investidores.”

O risco de uma inversão da tendência de alta está sempre à espreita, sobretudo num contexto de instabilidade global. Uma piora no cenário europeu, um solavanco chinês ou no próprio mercado americano podem estragar a festa. A bolsa chegou a registrar uma ligeira queda por três pregões seguidos em março após notícias de crescimento abaixo do esperado na China, mas o otimismo voltou a prevalecer.

“Mais para a frente, as eleições também podem afetar o mercado”, diz Paul Larson, analista-chefe de estratégia para o mercado de capitais da consultoria de investimento Morningstar. Se o otimismo na bolsa não representa o fim da crise, pode ser pelo menos um bom começo.

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