Fábrica da Braskem: prejuízo nos últimos 12 meses e pressão para mudar sua produção (Mirian Fichtner)
Da Redação
Publicado em 5 de julho de 2012 às 09h36.
São Paulo - Pode até pegar mal admitir, mas todo empresário sonha, mesmo que secretamente, em transformar seu negócio num monopólio. A vida vira uma alegria — cobra-se mais, sobra dinheiro no fim do mês, dorme-se melhor à noite e por aí vai. Em janeiro de 2010, a petroquímica brasileira Braskem chegou perto de se transformar num monopólio.
Controlada por Odebrecht e Petrobras, a empresa comprou a concorrente, a Quattor, e se tornou a única companhia brasileira a vender as principais matérias-primas para as fabricantes de plásticos do país. Com a compra, o faturamento anual da empresa soma 33 bilhões de reais.
Os órgãos de defesa da concorrência aprovaram a aquisição entendendo que o setor dependia de escala para competir com as grandes companhias estrangeiras. Passados dois anos e meio, porém, esse poder todo não vem se transformando em lucros de dar inveja, muito pelo contrário — e, como era de esperar, tamanha concentração nas mãos de uma empresa está gerando um tremendo mal-estar no setor.
Principalmente, a vida dos acionistas da Braskem está longe de ser alegre. No último ano, as ações da maior petroquímica brasileira caíram quase 50% na Bovespa. Depois de alcançar um lucro de 1,9 bilhão de reais em 2010, a empresa teve prejuízo de 675 milhões de reais nos 12 meses acumulados até março deste ano.
O que está acontecendo com a Braskem? Por um lado, a união com a Quattor rendeu tudo o que se poderia esperar: de fato, nasceu ali um dos mercados mais concentrados do mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, há cerca de 30 petroquímicas que produzem resinas plásticas e a maior, a Exxon, tem menos de 15% de participação de mercado.
No Brasil, a Braskem tem 68% do mercado, e nos seus principais segmentos só concorre com empresas estrangeiras que exportam para o Brasil. Segundo a clientela da Braskem, a união com a Quattor, como era de esperar, distorceu os preços no setor.
O preço médio das resinas subiu 18% no Brasil desde janeiro de 2010, enquanto caiu ou subiu de forma modesta no mercado internacional, segundo um recém-concluído relatório da Abiplast, entidade que reúne os fabricantes de plásticos, ao qual EXAME teve acesso. De novo, é algo até certo ponto natural num mercado tão concentrado.
À época da fusão com a Quattor, a Braskem chegou a dizer a clientes que os preços cairiam após a integração, porque seus custos diminuiriam com a sinergia gerada (que, segundo a empresa, foram de 400 milhões de reais).
Para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que aprovou a operação, o poder de fogo da Braskem seria regulado pelo mercado externo: se os valores subissem aqui, as fabricantes de plásticos poderiam comprar a resina no exterior.
Mas, como o recente aumento de preços demonstra, não é bem isso que vem acontecendo: importar resinas como as produzidas pela Braskem não é tão simples quanto parecia.
O Brasil tem um dos maiores impostos de importação de resinas termoplásticas do mundo, de 14% — só Filipinas e Venezuela cobram mais; no Chile, a taxa é de 6% e, nos Estados Unidos, de 6,5%. A chamada “guerra dos portos” entre estados brasileiros até que ajudou a concorrência estrangeira por um tempo.
Com os incentivos fiscais dados pelos estados para aumentar o fluxo de seus portos, o preço das resinas importadas caiu em média 10%. Foi um baque para a Braskem. Sua participação de mercado logo caiu 5%. Mas, em abril, o Senado acabou com esses incentivos, e as coisas voltarão a ser o que eram a partir de janeiro, quando a medida entrará em vigor.
Procurada, a Braskem diz que os preços que cobra refletem o custo Brasil. “Pagamos 50% mais caro pela energia elétrica do que uma companhia americana, nossa carga tributária é altíssima, os juros também. Não dá para competir em pé de igualdade”, diz Marcela Drehmer, vice-presidente financeira da companhia.
Segundo ela, a economia de custos foi, sim, repassada aos clientes, mas na forma de mais investimentos em inovação e tecnologia — foram 155 milhões de reais em 2011, mais que o dobro do valor gasto no ano anterior.
Custos elevados
Mesmo assim, no entanto, está difícil ganhar dinheiro. Como cobra preços mais altos, a Braskem tem margem Ebitda (relação entre a geração de caixa e a receita líquida) maior que suas concorrentes lá fora — ficou em 11% em 2011, o dobro da média de empresas de perfil semelhante, segundo analistas.
A má notícia para a Braskem é que essa rentabilidade vem caindo: a margem de 2011 é 23% menor que a do ano anterior. O motivo para a recente queda é a forte dependência que a empresa tem da nafta, subproduto do petróleo usado para fabricar quase 80% das resinas vendidas pela Braskem.
Os preços da nafta subiram 31% no ano passado e continuam em alta. É uma situação que afeta especialmente a Braskem: lá fora, empresas do setor utilizam outras matérias-primas, como gás natural e etanol.
Com isso, vêm conseguindo melhorar os resultados, já que seus preços estão em baixa (o valor do gás, por exemplo, diminuiu 80% nos últimos quatro anos, graças ao aumento da produção nos Estados Unidos).
À redução da margem, soma-se o efeito da desvalorização do real — 70% da dívida da empresa e 80% de seus custos são atrelados ao dólar. Como a moeda americana valorizou 10% em 2012, é de se esperar que esse continue a ser um peso para os resultados neste ano.
Diante dessa ameaça, a maior petroquímica brasileira tem sido pressionada a mudar suas fábricas e a produzir usando insumos mais baratos. O problema é que o processo de conversão é naturalmente lento. “É quase como começar do zero, porque a fabricação com base em outra matéria-prima é totalmente diferente.
É mais fácil comprar empresas ou construir novas fábricas”, diz Hassan Ahmed, diretor da Alembic Global Advisors, empresa de pesquisa dos Estados Unidos especializada no setor petroquímico. Em 2010, a Braskem inaugurou uma nova fábrica de 500 milhões de reais em Triunfo (RS), que utiliza etanol.
Agora, tem projeto para construir um complexo à base de gás no México. A meta é reduzir a importância da nafta dos atuais 80% para 52% até 2018 — e a esperança é que a poderosa Braskem volte a dar boas notícias a seus acionistas antes disso.