(Nelson Jr./STF/Divulgação)
J.R. Guzzo
Publicado em 30 de janeiro de 2017 às 05h55.
Última atualização em 8 de fevereiro de 2017 às 10h39.
São Paulo – O Brasil está realmente vivendo um momento esquisito. Rogaram praga? Não pode ser, porque praga não existe. Uma soma de coincidências infelizes, em que novos fatores são adicionados quase sem interrupção — e por isso não permite que a adição seja concluída? O fato concreto é que a noite não acaba; o relógio avança, o mundo gira e tudo continua escuro. Em 2017, para ficar no presente mais próximo, está difícil encontrar alguma coisa positiva no Brasil.
O ano, por sinal, havia começado debaixo de uma apavorante tempestade de sangue em penitenciárias do Norte do país, fruto de guerras internas que se travam sem o menor controle deste “Estado forte” e doente que temos aí. Antes de chegar ao final do primeiro mês, 2017 nos traz, agora, a morte súbita de um homem-chave para o encaminhamento e a conclusão dos processos mais críticos que estão hoje na Justiça brasileira.
A morte do ministro Teori Zavascki, num desastre aéreo no litoral do Rio de Janeiro, priva a Operação Lava-Jato de seu magistrado mais graduado — e, no fim das contas, mais decisivo para o desfecho do caso todo. Tudo, agora, promete atrasar ainda mais — bom para os réus, como sempre acontece quando a Justiça não anda, ruim para o país. Enquanto os processos de Curitiba não se definirem, a vida política brasileira continuará travada e, enquanto a política estiver travada, a economia não deslanchará.
Num país mais funcional do que o Brasil de hoje, o acidente no qual morreu Teori Zavascki ficaria dentro de seus limites naturais — uma cruel tragédia humana para as famílias do ministro e dos outros mortos na queda do avião particular em que viajavam. Mas o Brasil vive, há anos, uma situação de colapso simultâneo da maioria dos órgãos que compõem a máquina do Estado; perdeu a capacidade de resistir a dificuldades não previstas no calendário e entra em situação de histeria a qualquer problema que apareça.
O poder público brasileiro, na verdade, não consegue lidar nem com o calendário — não consegue mais nada, deixou de ser um conjunto de sistemas e de pessoas que fazem algum tipo de trabalho coordenado. Vive todos os dias à beira de um ataque de nervos. Manda embora ministros ao primeiro relâmpago que aparece em volta deles; ninguém nem sequer se preocupa mais em fazer a conta de quantos já foram para a rua.
Quer tirar dinheiro do contribuinte para dar uma “indenização” de 60 000 reais à família de cada presidiário morto nas últimas badernas nas prisões. Por que não 600 000? Porque não pediram — este é um governo no qual quem grita leva, e leva na hora. O governo aceita, passivamente, conviver com uma máquina estatal que foi destruída, peça por peça, ao longo de mais de cinco anos seguidos. Não conserta nada, tem medo de tudo.
Deixa-se paralisar por uma oposição que não tem voto, está desmoralizada pela corrupção e cujos líderes vivem sob a ameaça do Código Penal. As decisões corretas que tomou só estão de pé porque ninguém deu um berro para protestar contra elas.
A morte do ministro Zavascki já está sendo explorada, desde o primeiro minuto, por quem pretende tirar algum tipo de proveito dela. Seria muita inocência acreditar que as coisas pudessem se passar de outra maneira, é claro — não há ninguém bem-intencionado, ou consciente de suas obrigações cívicas, entre os réus e os possíveis implicados nas investigações contra a corrupção centradas na Operação Lava-Jato.
É importante, nessas circunstâncias, não ceder ao pânico e achar, mais uma vez, que “agora acabou tudo”. Não acabou nada. Os únicos interessados em fazer as pessoas pensar isso são os que querem sabotar a ação da Justiça para fugir de suas responsabilidades penais — e, mais ainda, voltar a mandar no país para garantir sua impunidade e continuar roubando. Mesmo com um Estado disfuncional e com um governo sujeito a estados constantes de cegueira, surdez e mutismo, um país com 200 milhões de habitantes não acaba de um dia para o outro nem pode mais ser controlado no grito ou na esperteza por meia dúzia de malfeitores.