Angel Ibanez, diretor de suprimentos e ESG da Tegra: mais de 30 milhões de reais destinados a projetos de economia circular. (Leandro Fonseca/Exame)
Rodrigo Caetano
Publicado em 24 de junho de 2022 às 06h00.
Quem passa diante de uma obra da construtora Tegra encontra um cenário diferente da maioria dos empreendimentos do tipo. A começar pelos tapumes, que não são de madeira, mas de plástico. A empresa utiliza um material totalmente reciclado para a produção dos chamados ecotapumes, que são, inclusive, mais bonitos do que os tradicionais. Agregado a eles, há um painel com uma série de indicadores. São números relacionados aos compromissos públicos assumidos pela Tegra, como redução do consumo de água e energia, uso de material reciclado e horas de treinamento, além do número de empregos gerados pelo empreendimento.
No ano passado, a Tegra se engajou em um profundo processo de revisão de sua estratégia ESG — a empresa abriu o capital no ano anterior. Desse processo, surgiu o plano Cidades Regenerativas 2030. “Buscamos descobrir o que faz uma empresa sustentável e o que era relevante para nós”, afirma Angel Ibanez, diretor de suprimentos e ESG da Tegra. O que surgiu, a partir das respostas, foram quatro compromissos: zerar o balanço líquido de emissões, impulsionar a economia circular, promover negócios transparentes e gerar impactos positivos na sociedade.
A Tegra colocou como meta reduzir em 50% suas emissões diretas e direcionar a redução de 15% das indiretas. O restante será compensado em 110% — ou seja, incluindo emissões de fora da atuação da empresa e de seus fornecedores. Para chegar ao objetivo, a Tegra está migrando sua matriz energética para fontes renováveis. Também trabalha para reduzir as emissões nos canteiros de obras e o consumo de energia por metro quadrado. “Um empreendimento leva dois anos para ser concluído, mas sua vida útil passa de 50 anos. Precisamos pensar em todo esse ciclo”, afirma Ibanez.
Nesse sentido, a Tegra tem instalado painéis solares em seus condomínios. Na economia circular, Ibanez afirma que a construtora envia apenas 3% do entulho para aterros, e a maior parte dos resíduos é reaproveitada. Uma das metas relacionadas ao tema é investir 30 milhões de reais em inovação, com o apoio a práticas acadêmicas e o desenvolvimento de programas e projetos circulares. Um exemplo de como se dá essa circularidade nas obras da Tegra está nos ecotapumes.
O plástico que sobra da construção é destinado à produção do polipropileno reciclado. A preocupação com a sociedade obriga a empresa a olhar para fora da obra. A Tegra reconhece que seus canteiros geram transtornos como barulho e sujeira. Por isso, realiza integrações com as comunidades no entorno, promovendo o que chama de gentilezas urbanas. Há também projetos para adotar praças e realizar ações em escolas públicas. A meta é impactar 2,4 milhões de pessoas com práticas sociais, educação, cultura, capacitação, voluntariado e filantropia. Outra preocupação é realizar projetos integrados com a região, olhando para a disponibilidade de transporte público, por exemplo. No campo da diversidade, a Tegra quer aumentar a presença feminina nos canteiros de obras. Há também um programa com refugiadas, que já empregou 16 venezuelanas.
A construtora MRV possui 32.000 funcionários. É um público diverso, que abrange pessoas de diferentes classes sociais e níveis de escolaridade. Para Eduardo Fischer, CEO da companhia, de todos os aspectos da estratégia ESG da MRV, tratar bem os funcionários é o que faz mais sentido. “Precisamos criar um ambiente em que as pessoas queiram ficar”, diz Fischer.
Não que os outros aspectos sejam negligenciados. Na área ambiental, a construtora alinha suas metas de redução de emissões à Science Based Target initiative (SBTi). Também investe em energia solar para seus empreendimentos, o que reduz emissões e tem um efeito social com a redução da conta de energia dos moradores. Fischer, no entanto, ressalta que o ciclo de vida dos empreendimentos é longo, superior a dez anos. Uma alta rotatividade prejudica o relacionamento com o cliente.
“O conceito de ESG é muito amplo e regionalizado. Na Europa, o ‘E’ (ambiental) é o principal. No Brasil, a pauta é diferente, e o ‘S’ (social) fala mais alto”, diz o CEO. Segundo o executivo, é uma questão de responsabilidade. Alguns stakeholders podem não ligar para essa agenda, mas as empresas e a elite econômica e intelectual têm um papel a cumprir no desenvolvimento da sociedade.
Comprometer-se com a agenda é o passo inicial. Ele cita como exemplo o Instituto MRV, criado em 2014 e que, no início, não teve repercussão. “Queríamos falar, mas não fazia eco”, explica. “Até que o mercado financeiro acordou para a agenda e, agora, todas as empresas sentem a necessidade de falar o que estão fazendo.” Para ele, a maior parte das iniciativas ESG do mundo empresarial é sincera. Mas quem tem o que mostrar sai ganhando.
A Votorantim Cimentos utiliza mais de 200.000 toneladas de açaí para produzir cimento. É isso mesmo. A indústria cimenteira tem um problema: para fabricar seu produto, é preciso alimentar fornos que chegam a 1.500 graus Celsius. Os combustíveis fósseis, em especial o coque de petróleo, são os mais utilizados. A Votorantim, no entanto, tem uma meta de reduzir o uso dos fósseis para menos da metade do total até 2030.
Para isso, a companhia aposta na tecnologia do coprocessamento. A técnica consiste em substituir o coque por biomassa, obtida de resíduos orgânicos que não vão para a reciclagem. São dois principais: o chamado combustível derivado de resíduo (CDR) e o caroço de açaí. Entre 2020 e 2021, os fornos da Votorantim receberam 214.000 toneladas de caroço e 185.000 toneladas de CDR. A redução das emissões com o coprocessamento é dupla — nos fornos, pela substituição do petróleo, e nos aterros sanitários, que deixam de receber esses resíduos orgânicos, cuja decomposição emite o gás metano, altamente poluente.
“Precisamos descarbonizar”, afirma Marcelo Castelli, CEO Global da Votorantim Cimentos. “A sociedade está mais consciente. Por isso adaptamos a empresa, revisitamos nossas metas e lançamos um plano para 2030.” A companhia assumiu o compromisso de substituir 53% do combustível fóssil até o final da década. No mundo, o índice atual está em 22,4% e, no Brasil, em 26% — mas algumas unidades já chegam a 70% de coprocessamento. E, como não dá para ser ESG sozinho, a Votorantim criou um negócio, a Verdera, que faz a gestão dos resíduos e oferta o coprocessamento para outras companhias.