Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2018 às 05h38.
Última atualização em 8 de novembro de 2018 às 05h38.
Um duelo entre Davi e Golias se desenhava em 2012 no ramo das redes sociais. De um lado estava o Facebook, que, com oito anos de vida, já havia se tornado um gigante e dominava o segmento. A empresa tinha lucrado 1 bilhão de dólares em 2011 e caminhava para abrir o capital. Do outro, estava o Instagram. Com apenas dois anos, o aplicativo de fotografia começava a conquistar um público insatisfeito com o rival Facebook. Seu serviço já alcançava 50 milhões de usuários, número que crescia rapidamente a cada mês.
Antes que o novato pudesse andar por conta própria, sem depender de investidores, o Facebook fez uma proposta irrecusável aos fundadores do Instagram, o brasileiro Mike Krieger e o americano Kevin Systrom (que deixaram a empresa recentemente): ofereceu pagar 1 bilhão de dólares pelo aplicativo, incluindo sua marca, sua tecnologia e sua equipe de desenvolvedores. Foi uma aposta ousada — afinal, antes da aquisição, Mark Zuckerberg, fundador e presidente do Facebook, só havia gastado algumas centenas de milhões de dólares para adquirir empresas menores.
Hoje, seis anos depois da compra e com o Facebook envolvido em escândalos de privacidade e manipulacão eleitoral, é o Instagram que vem dando à companhia motivos para celebrar. Dados da eMarketer, consultoria especializada em pesquisas de mercado com sede em Nova York, abertos para EXAME, apontam que o Instagram deverá fechar 2018 com um faturamento de 9 bilhões de dólares, o dobro do ano passado. O valor já corresponde a 16% da receita total do Facebook, e a previsão é que atinja 25% até 2020.
O Instagram cresceu seguindo a mesma estratégia do Facebook, ou seja, nada de lucro nos primeiros anos. O objetivo primordial era alcançar o maior número de usuários. O app ganhou uma versão para smartphones com o sistema Android ainda em 2012, e daí em diante o serviço deslanchou. Em menos de um ano, o número de usuários dobrou para 100 milhões, até chegar a 400 milhões no terceiro trimestre de 2015. Foi só então que o Instagram passou a vender publicidade no aplicativo e a gerar receita. “O Facebook foi muito esperto na aquisição do Instagram e certamente viu o potencial da plataforma”, diz Matteo Ceurvels, pesquisador sênior da eMarketer para a América Latina e a Espanha. E o Instagram também aproveitou a sociedade com o Facebook, que já tinha mais de 1,5 bilhão de usuários, para se desenvolver e continuar crescendo.
Os primeiros passos do Instagram na publicidade digital foram como um simples braço do Facebook. As marcas que veiculavam anúncios na plataforma principal podiam optar por colocá-los também no Instagram, com a perspectiva de alcançar mais pessoas. Mas, como foca fotos e vídeos em vez de textos, o aplicativo começou a obter taxas melhores de engajamento e logo trouxe bons resultados. Hoje, três anos depois, o Instagram faz sucesso entre pequenas e médias empresas, que encontram nele um bom meio para promover os negócios e fazê-los crescer.
Segundo uma pesquisa inédita do instituto Ipsos Connect, feita com 300 administradores de contas de PMEs no Instagram, 65% dos entrevistados afirmam que o aplicativo ajuda a aumentar as vendas e 76% dizem que traz novos consumidores. “Para nossa empresa, o Instagram é um dos principais canais de contato com clientes e também nos ajuda a criar a identidade de marca”, diz o empresário Eduardo Hommerding, fundador da fabricante de carteiras Dobra, do Rio Grande do Sul. Segundo ele, sua empresa alcançou um faturamento de 2,2 milhões de reais em 2017. Desse total, 25% vieram com vendas para clientes que entraram em contato pelo Instagram ou conheceram a marca no aplicativo — em 2018, a participação do Instagram continua parecida.
Entre as microempresas a dependência do Instagram é ainda maior. A fabricante de brinquedos educativos Pigly e as lojas de roupas online Stay Ugly e Insomnie, de São Paulo, atribuem ao aplicativo de 60% a 80% das visitas em seus sites. Sem o Instagram, quase não há vendas.
Entre as grandes empresas, o Instagram também vem ganhando importância, ainda que numa proporção menor. As companhias não abrem os números exatos, mas a rede social já é um dos elementos centrais da estratégia de comunicação e marketing para empresas como a fabricante de cosméticos Avon, a bandeira de cartões de crédito Visa, a marca de cerveja Skol, a montadora alemã Volkswagen e a loja online de vinhos Evino — por vezes até ocupando o espaço que era antes do Facebook. “Estamos notando que há uma redução no uso diário do Facebook, e que as pessoas acabaram migrando para o Instagram”, diz Gustavo Schmidt, vice-presidente de vendas e marketing da Volkswagen do Brasil. “É por isso que estamos direcionando nossos esforços para crescer mais ainda no Instagram.”
A mudança não se restringe ao Brasil: um estudo do KeyBanc, um banco de investimento dos Estados Unidos, revela que, no mundo, o Instagram já corresponde a 27 centavos de cada dólar investido por novos anunciantes na empresa de Mark Zuckerberg. A proporção deverá chegar a 58% em 2020. Ou seja, o Instagram terá um papel cada vez mais importante para garantir o crescimento do império social do Facebook. E tudo sem nenhuma concorrência direta: o único rival de peso é o Google, que domina um segmento diferente, o das buscas.
Outras redes sociais que tentaram concorrer com o Facebook tiveram seus recursos copiados pelo rival. Um exemplo é o aplicativo Snapchat, que fez sucesso entre adolescentes apostando em vídeos curtos que desaparecem depois de um dia. O Facebook copiou o formato e lançou o recurso Stories no Instagram, no -WhatsApp e no próprio Facebook. O impacto foi imediato. As ações do Snapchat, que valiam 27 dólares na abertura do capital em março de 2017, estavam sendo negociadas a 6,80 dólares no começo deste mês. Práticas como essa têm aumentado as críticas em relação ao poder de monopólio das empresas de internet. Numa audiência no Parlamento Europeu em maio, a concorrência desleal do Facebook foi uma das preocupações levantadas pelos parlamentares.
O Facebook minimiza o avanço do faturamento do Instagram nos últimos anos. O crescimento é atribuído ao estágio do serviço, que tem apenas oito anos. “O Instagram está em constante evolução, e é natural que sua relevância cresça dentro da companhia”, diz Natalia Paiva, diretora de relações institucionais do Instagram para a América Latina. Mas há quem veja a expansão do aplicativo como uma boa saída para o Facebook contornar um eventual marasmo de sua rede social.
O Facebook ainda cresce em número de usuários e receita, mas numa velocidade menor. A desaceleração é motivada por escândalos recentes, dos quais o Instagram conseguiu passar praticamente ileso. “Se o Instagram continuar imune a polêmicas e mantiver o ritmo de crescimento atual, existe a possibilidade real de destronar o próprio Facebook e se tornar a marca principal. O aplicativo funciona melhor como um elo entre clientes, produtos e marcas”, diz Scott Galloway, professor de marketing na escola de negócios Stern, da Universidade de Nova York.
Comprar o Instagram, como se vê, foi uma das melhores decisões que o Facebook já tomou para garantir a continuidade do crescimento. No mundo da tecnologia, diversificar as fontes de receita é uma questão de sobrevivência.