Falco, presidente da empresa de turismo CVC: mais lojas no interior do país (Germano Luders/Exame)
Marina Filippe
Publicado em 8 de dezembro de 2016 às 05h55.
Última atualização em 8 de dezembro de 2016 às 05h55.
São Paulo — Municípios como São Francisco do Sul, localizado numa ilha a 190 quilômetros da capital catarinense, não faziam parte do mapa de negócios da empresa de viagens CVC até pouco tempo atrás. A terceira cidade mais antiga do Brasil estava bem aquém do porte mínimo determinado como alvo para a abertura de novas lojas — três vezes maior do que seu contingente de 42 000 habitantes.
Desde fevereiro de 2015, porém, foi exatamente em cidades como essa — na qual foi aberta uma loja da companhia no último dia 16 — que a rede concentrou seus investimentos. Das 60 inaugurações neste ano, mais da metade — 38 — ocorreram em cidades como São Francisco do Sul. O movimento deve ampliar a crescente parcela das vendas vindas das 300 lojas fora das capitais, já equivalente à metade do faturamento da companhia.
A ideia é fechar 2016 com 100 novas lojas e repetir a dose em 2017. Num ano de crise, em que pacotes de viagem podem ser um dos primeiros itens cortados do orçamento de empresas e famílias, a operadora conseguiu blindar os resultados. As vendas cresceram 3,2% de janeiro a setembro deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. E o lucro líquido aumentou 16,5%. “Ainda há muita oportunidade inexplorada no interior”, afirma Luiz Eduardo Falco, presidente da CVC.
Como uma exceção em tempos difíceis, a marca CVC ascendeu neste ano à lista das 25 mais valiosas do Brasil, elaborada pela consultoria britânica Interbrand e publicada com exclusividade por EXAME. Estreante na 22a posição, seu valor é de 410 milhões de reais. Trata-se da única recém-ingressada na lista. A varejista Magazine Luiza também é uma novidade em relação ao ano anterior — mas, nesse caso, trata-se do retorno de uma velha conhecida.
Já participante em 2012 e 2014, a companhia regressou na 24a posição, com um valor de marca 4,5% maior em relação ao último ano em que integrou a lista. Ambas ocuparam o espaço deixado por duas baixas — a da Caixa, com resultados financeiros em queda, e a da empresa de telefonia Oi, dona de uma dívida bilionária. Ambas saíram do ranking após uma sequência de cinco e oito anos, respectivamente. Neste ano, as duas quedas mais expressivas são da Petrobras, epicentro da Operação Lava-Jato, e do banco BTG Pactual, atingido no desdobramento das mesmas investigações. As duas marcas perderam, respectivamente, 17% e 27% de seu valor.
Apesar das baixas, o pelotão de frente das marcas mais valiosas se mostrou resiliente. Nos últimos três anos, as primeiras cinco colocadas — lideradas pelo Itaú Unibanco — mantiveram-se as mesmas. Juntas, elas representam, em média, 70% do valor do ranking. No conjunto, as empresas já dão sinais de recuperação. A soma do valor das 25 marcas que compõem a lista teve uma evolução um pouco mais expressiva neste ano.
Se em 2015 o crescimento do valor somado das marcas não passou de 2,7%, neste ano chegou a 5,4% e quase bateu os 110 bilhões de reais. “Muitas das que entraram fragilizadas na crise não tiveram forças para se -reerguer”, diz Daniella Giavina-Bianchi, diretora executiva da Interbrand no Brasil. “Mas o grupo das que entraram fortalecidas ganhou musculatura.”
Segundo a análise da Interbrand, uma das estratégias vencedoras na crise foi optar pela expansão. Ampliar a presença geográfica foi uma estratégia comum de parte das empresas, como as varejistas CVC e Lojas Americanas. Em 2015, ambas chegaram ao patamar de 1 000 pontos de venda no Brasil. A operadora de viagens inaugurou em dezembro sua unidade de número 1 000 em Piripiri, no Piauí, um município com 62 000 habitantes a 165 quilômetros da capital, Teresina.
Além da expansão regional, a CVC deu início a novas frentes de negócios. Desde setembro, abriu seis lojas exclusivamente dedicadas à venda de pacotes de intercâmbio, nas quais mudam a fachada e também o perfil dos atendentes. “Eles sabem que a compra de intercâmbio não acontece na primeira visita. É um investimento mais planejado e é preciso ajudar o cliente a escolher”, afirma Marcelo Oste, diretor de marketing da CVC.
No esforço de expandir a linha de produtos, a empresa adquiriu em 2014 a Rextur Advance, especializada em pacotes para viagens executivas, e em 2015 a Submarino Viagens, dedicada a vendas online. Hoje, 14% das vendas da CVC ocorrem pela internet.
Quem entrou na crise com fôlego para investir se deu bem. A varejista Lojas Americanas dedicou mais de 1 bilhão de reais à expansão neste ano. É um montante 60% maior em relação ao gasto em 2015. Esse investimento faz parte de um ambicioso plano de abertura de lojas, com 800 inaugurações previstas de 2015 a 2019.
Até o final desse período, o investimento terá somado 4 bilhões de reais e o tamanho da rede terá quase dobrado para cerca de 2 000 lojas. “Mesmo num cenário desafiador investimos para ampliar os resultados”, diz Murilo Corrêa, diretor financeiro e de relações com investidores da Lojas Americanas, que vende mais de 60 000 itens — de chocolates e eletrodomésticos a toalhas de banho e brinquedos. Resultado: o varejo recuou 6,6% até setembro e as vendas da Lojas Americanas encolheram 2,2%. O valor da marca cresceu 37% desde 2014, com a perspectiva de ganhos futuros com a expansão.
Em alguns casos, a mudança no padrão de compra dos consumidores exigiu mais do que a ampliação da oferta. A marca das sandálias Havaianas, da Alpargatas, há um ano controlada pelo grupo J&F, é um exemplo disso. Com a maior alta na lista da Interbrand, ao lado da varejista Renner, com 17% de valorização, a empresa fez uma manobra interna para manter os reajustes de preços abaixo da inflação — em torno de 6%.
Para isso, a empresa lançou sandálias mais estreitas, com menos borracha e preço 15% menor. Além disso, mudou processos de produção e renegociou contratos para baixar custos e manter as margens. A Havaianas representa hoje 63% da receita da Alpargatas, que cresceu 2,1% nos primeiros nove meses deste ano, enquanto o lucro líquido avançou 20%. “Ampliar o leque de produtos de uma marca tradicional garante crescimento mesmo num mercado recessivo”, afirma Márcio Utsch, presidente da Alpargatas.
A precificação foi a estratégia também da fabricante de bebidas Ambev, cujas marcas estão entre as mais valiosas há 14 anos. Para a empresa, a opção foi fortalecer a venda em garrafas de vidro retornáveis. Na devolução, o consumidor paga 30% menos no produto novo. A troca já acontece em 70% dos pontos de venda cobertos pela companhia, e sua participação nas receitas saltou de 4% para 26% desde 2014. A empresa não tirou o pé dos investimentos.
As marcas Skol, Brahma e Antarctica, entre as dez maiores do ranking, patrocinaram mais de 6 000 eventos neste ano, a exemplo da festa de São João, na Bahia. É um volume 4,5% maior em relação a 2015. As vendas da companhia cresceram 3,2% nos primeiros nove meses em comparação ao mesmo período do ano passado.
O lucro líquido encolheu 6,7%, mas ainda assim chegou a 8,3 bilhões de reais. “Continuamos investindo para estar próximos do consumidor e ter melhores resultados no longo prazo”, afirma Paula Lindenberg, vice-presidente de marketing da Ambev. Mais do que voltados para o impacto imediato, os olhos dos executivos da empresa estão atentos ao futuro. E a experiência mostra que poucas coisas são tão determinantes para a construção de uma marca valiosa quanto essa visão.