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Hora de queimar gordura: como as empresas de saúde cresceram e aumentaram lucros em 2023

Os planos de saúde expandiram o número de beneficiários e o de atendimentos desde a pandemia. Tudo isso alimentou a inflação médica. Quem cresceu e ganhou eficiência levou a melhor em 2023

Laboratório do Grupo Sabin: investimento em painéis solares para economizar na conta de energia (Leandro Fonseca/Exame)

Laboratório do Grupo Sabin: investimento em painéis solares para economizar na conta de energia (Leandro Fonseca/Exame)

Leo Branco
Leo Branco

Editor de Negócios e Carreira

Publicado em 18 de setembro de 2024 às 06h00.

Última atualização em 18 de setembro de 2024 às 09h14.

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As prestadoras de serviços e fornecedoras de insumos para saúde tiveram um 2023 de números expressivos — alguns positivos, outros nem tanto. A começar pela principal notícia boa: os planos de saúde fecharam o ano com 50,5 milhões de brasileiros sob cobertura.

É o maior número desde 2014, quando o setor entrou numa crise de quase uma década em razão do fechamento de postos de trabalho com carteira assinada. Com mais gente assegurada, nunca os planos foram tão utilizados.

No total, foi mais de 1,7 bilhão de procedimentos como exames e internações no ano passado. É uma alta de 18,5% sobre 2019, o último ano antes da pandemia, segundo o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), uma das fontes mais confiáveis de dados sobre o setor.

Entre 2020 e 2022, os números desse segmento foram prejudicados pela pandemia. Com a quarentena, muita gente postergou exames e cirurgias eletivas, por exemplo. “No ano passado, com a crise sanitária definitivamente para trás, a demanda represada veio à tona”, diz José Cechin, superintendente executivo do IESS.

Crescimento de maneira sustentável

Tudo isso beneficiou os fornecedores de produtos e serviços para os planos de saúde. No ano passado, o conjunto de 27 empresas listadas na categoria Saúde e Serviços de Saúde no Ranking EXAME MELHORES E MAIORES 2024 expandiu as receitas em 32%. “Foi a maior alta entre os 22 setores do ranking”, diz o economista Samuel Barros, reitor da faculdade de negócios Ibmec, parceira técnica da edição de 2024.

A bonança no lado das receitas coincidiu com um aumento generalizado nas despesas com saúde. Mesmo com a inflação geral em queda desde 2022, as despesas do setor continuam crescendo em dois dígitos: em 12 meses até setembro de 2023, a alta chegou a 12,7%, segundo o IESS. (O IPCA no mesmo perío­do foi de 5,2%.)

Não à toa, os planos de saúde endureceram as negociações com fornecedores, numa tentativa de conter a escalada dos custos. O resultado é uma pressão sobre o lucro. O conjunto de 27 prestadoras de serviços de saúde teve margem operacional de apenas 2,4% em 2023.

É uma das menores do ranking — a média de todos os setores do MELHORES E MAIORES 2024 ficou em 8%. “Quem conseguiu conter custos cresceu de maneira mais sustentável”, diz Barros.

Hospital Albert Einstein, em São Paulo: atenção redobrada em cada linha de despesa (Germano Lüders/Exame)

As empresas de saúde mais bem colocadas no ranking de 2024 colecionam histórias de ajustes operacionais para ganhar fôlego. A começar pelo laboratório paulista Fleury, primeiro colocado nessa categoria.

A empresa investiu pesado em tecnologia, inclusive em inteligência artificial, numa tentativa de automatizar processos em 2023. “O cenário de saúde foi muito desafiador no pós-pandemia”, diz a CEO Jeane Tsutsui, fazendo referência ao vaivém da sinistralidade dos planos de saúde, que caiu em 2020 e cresceu rapidamente nos anos seguintes.

“Nesses momentos de pressão, todos nós temos de ter um olhar coletivo de como juntos podemos contribuir para a sustentabilidade do sistema de saúde”, diz Tsutsui. “‘Eficiência’ é a palavra fundamental.” (Leia mais sobre o Grupo Fleury e veja a tabela com a posição e os dados financeiros das empresas aqui.)

Disciplina por eficiência

Um bom exemplo de quem passou a olhar no detalhe as despesas é a administração do hospital Albert Einstein, quinto colocado no ranking. Nos últimos cinco anos, virou prática nas unidades do grupo em São Paulo e em Goiânia a revisão constante em cada linha de despesa em busca de melhorias.

Nos últimos anos, a gestão do hospital tem alongado os contratos com fornecedores de insumos e ampliado o volume, para evitar pagar mais caro em compras avulsas. Em paralelo, novas rotinas de médicos e enfermeiros colaboraram para uma queda de 20% na duração das internações ao longo da última década. “É uma disciplina na busca por eficiência”, diz Henrique Neves, diretor-geral do hospital Albert Einstein.

Mesmo quem está num ritmo de expansão acelerada priorizou maneiras de fazer mais com menos em 2023. É o caso do laboratório de medicina diagnóstica Sabin, quarto lugar no ranking. Aberto em Brasília, em 1984, o Sabin saiu às compras: foram cinco aquisições desde 2019. Os últimos meses por ali foram de buscar sinergias.

No ano passado, a companhia migrou 100% das unidades para um mesmo sistema operacional, de modo a evitar gastos dobrados com softwares. De quebra, a medida permitiu aos pacientes acessar um mesmo prontuá­rio médico em 78 cidades de 14 estados, de todas as ­re­giões, onde o Sabin está presente.

Além disso, a companhia buscou economizar na conta de luz com a migração para o Mercado Livre de Energia. Algumas unidades em Brasília ganharam painéis solares para depender menos do fornecimento externo. “De 2022 para cá, a despesa com energia diminuiu 17%”, diz Lídia Abdalla, presidente executiva do laborário Sabin.

Na Oncoclínicas, rede hospitalar dedicada ao tratamento de câncer com operações em 15 estados, para além da integração de diversos modelos de prontuá­rio médico num só, a busca por eficiência passou também pela “cozinha” da operação. Ao longo do ano passado, a companhia centralizou serviços de backoffice, como os de TI.

Em busca de sinergias

Agora, boa parte deles está sendo terceirizada num projeto com a empresa de tecnologia Accenture. As medidas ajudaram a Oncoclínicas a encarar os alongamentos feitos pelos planos de saúde nos prazos de pagamento por causa da escalada de despesas.

“O cenário macro mais difícil nos obriga a ser mais eficientes”, diz o fundador e CEO Bruno Ferrari. Em 2023, a companhia faturou 5,4 bilhões de reais, alta de 35%. No período, o lucro foi de 312 milhões de reais, quase o triplo do ano anterior.

Em algumas das empresas com destaque na edição de 2024 de MELHORES E MAIORES­, o investimento em novas estruturas ao longo do ano passado foi direcionado justamente a ganhos de eficiência com a simplificação de estruturas.

Um caso exemplar é o da Viveo, que faturou 11 bilhões de reais em 2023, alta de 26% em 12 meses, com insumos hospitalares. O lucro da companhia no período, de 349 milhões de reais, foi 38% acima do registrado em 2022 e colaborou para a empresa ficar em sexto lugar no ranking. Sob o guarda-chuva da ­Viveo estão 16 marcas, como a ­Cremer, que fabrica itens de primeiros socorros, e a Mafra Hospitalar, de distribuição de 12.000 itens para hospitais.

O portfólio da companhia fundada em 1996 começou a se expandir a partir de um aporte, 20 anos mais tarde, vindo da DNA Capital, braço de investimento da família Bueno, fundadora do plano de saúde Amil e da operadora de laboratórios e hospitais Dasa.

Nos últimos oito anos, foram 25 aquisições. Em 2023, a Viveo aportou 30 milhões de reais em dois centros de distribuição — em Cajamar, na Grande São Paulo, e em Brasília — para centralizar a distribuição das 18 marcas. Além disso, investiu 40 milhões de reais numa nova fábrica de lenços umedecidos, um dos carros-chefe da companhia.

Até então, eles eram produzidos em duas unidades adquiridas de empresas diferentes. Havia pouca sinergia entre as operações. “No ano de 2023 ficamos focados em reduzir a complexidade das operações”, diz o CEO Leo Byrro.

Olhando para o futuro, há bons motivos para crer numa continuidade dos desafios — e da complexidade — do setor. O envelhecimento da população é uma realidade: com a natalidade em queda, o Brasil terá 55 milhões de idosos em 2040.

Para cada 100 brasileiros com menos de 15 anos, o país terá 153 habitantes acima dos 60 anos, boa parte deles com doenças típicas da terceira idade. O setor também deve ser pressionado por um uso crescente por parte dos jovens. A maior atenção à saúde mental vem provocando uma onda de diagnósticos de doenças como o transtorno do espectro autista, também conhecido pela sigla TEA.

Combate ao desperdício

Na Mercer Marsh Benefícios, consultoria global de serviços de saúde para empresas, a fatia de pacientes com TEA subiu de 1% da carteira de beneficiários com até 18 anos de idade em 2019 para 23% no ano passado. “Tudo isso indica uma pressão adicional para empresas e planos de saúde”, diz Marcelo Borges, diretor-executivo da consultoria no Brasil. “O combate ao desperdício no setor veio para ficar.”

Até pouco tempo atrás, uma expressão comum só nos discursos dos executivos do setor, a chamada “saúde preventiva”, deve ganhar força como estratégia de negócios daqui para a frente. Quem já aposta na prática saiu ganhando.

Vide o caso da rede farmacêutica RaiaDrogasil, a terceira colocada nessa categoria. Nos últimos oito anos, a companhia transformou parte das lojas mais movimentadas em centros de serviços como aplicação de vacinas e de testes rápidos.

Na pandemia, a RaiaDrogasil foi uma das primeiras com os kits para testagem da covid-19. Hoje, a empresa é a maior aplicadora no país de vacinas como a contra o herpes-zóster, vírus causador de dor crônica, sobretudo em idosos.

Para além da guinada para os serviços, a RaiaDrogasil investiu em aplicativos para agilizar o atendimento na loja — a marcação de testes e vacinas, por exemplo, é feita online. Tudo isso reforçou o vínculo da marca com seu público, com mais visitas às lojas e gastos mais elevados.

“Um cliente convencional, por exemplo, vai 24 vezes ao ano à farmácia”, diz o CEO Marcílio Pousada. “Quem está no app vai, em média, 29 vezes.” Em 2023, a RaiaDrogasil faturou 36,3 bilhões de reais, alta de 25% em 12 meses. O lucro, de 1,1 bilhão de reais, expandiu 11%. “Digitalizar a relação com o cliente está na estratégia para o futuro da companhia”, diz Pousada.

Colaborou Natalia Viri


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