Revista Exame

Grécia trocou equívocos velhos por novos e se deu mal

A sucessão infernal de desastres da Grécia mostra que ainda não foi descoberto um jeito de chegar ao certo trocando equívocos velhos por equívocos novos


	 O sacrifício acabou?: o governo não diz, mas para a população grega, essa história tem tudo para ir longe
 (Luisa Gouliamaki/AFP)

O sacrifício acabou?: o governo não diz, mas para a população grega, essa história tem tudo para ir longe (Luisa Gouliamaki/AFP)

DR

Da Redação

Publicado em 15 de julho de 2015 às 18h00.

São Paulo - A filosofia amadora, que constantemente está mais correta do que se pensa, ensina que cada erro traz dentro de si, quase sempre, a semente de outro erro. Deveria ser o contrário, pois decisões erradas contêm lições que poderiam ensinar qual é o melhor caminho para corrigir amanhã as falhas cometidas ontem — mas o que se vê é a insistência de governos e sociedades em querer consertar erros cometendo mais erros.

Eis aí o exemplo da Grécia e sua infernal sucessão de desastres econômicos. Os gregos vêm utilizando há anos esse sistema para sair da desordem terminal criada em sua economia; não saem, é claro, pois ainda não foi descoberta uma maneira prática de chegar ao certo através da repetição do errado ou da troca de equívocos velhos por equívocos novos.

Mas continuam tentando — é a vitória da esperança sobre a experiência, como revela esse notável plebiscito no qual a grande maioria do eleitorado da Grécia, com todo o incentivo de seu atual governo, decidiu que não aceita as medidas propostas pelas autoridades econômicas da Europa para lidar com a ruína financeira do país.

O plebiscito grego, como frequentemente acontece com plebiscitos pelo mundo afora, foi armado com baralho falso; perguntaram se a população queria, sim ou não, continuar fazendo sacrifícios para dar dinheiro a credores estrangeiros e às grandes potências da Europa. A população em peso respondeu que não, não queria — mesmo porque as penitências que vem fazendo há anos, com perda de empregos, corte de salários, redução de aposentadorias, limitação no crédito e outros infortúnios, não adiantaram nada, até agora, para resolver problema algum.

A questão, em todo caso, não está bem aí; governos trapaceiros não organizam plebiscitos para perder. O problema está no conjunto da obra. A Grécia vive desde 2008 na vara de falências, quando ficou claro que não poderia mais continuar na pândega econômica dirigida por seus governos desde que foram premiados com a admissão do país na zona do euro. A Grécia tem um PIB menor do que o do estado do Paraná, mas quis viver como se fosse os Estados Unidos da América.

Gastou o que tinha e, sobretudo, o que não tinha — em aumentos salariais, inchaço do funcionalismo, Olimpíada, cartões de crédito platinum, aposentadorias “especiais”, redução de impostos, menos trabalho, presentes caríssimos para os mais ricos, e por aí vai. Nada disso, naturalmente, era fruto de aumento da produtividade, crescimento real do PIB e outras virtudes econômicas. Era apenas construção de dívida. Como jamais houve dinheiro sadio para pagar a festança, a Grécia passou a viver de euro emprestado; para tanto, não hesitou em falsificar números oficiais e mentir aos credores na hora de renovar seus papagaios.

Quando a casa enfim caiu, porque não podia mais continuar de pé, os governos gregos, os demais países europeus e os bancos credores lançaram-se a uma espetacular corrida para consertar erros com erros — contando, naturalmente, com a colaboração de políticos, sindicatos e burocratas da Comunidade Europeia, do FMI e dos demais suspeitos de sempre.

Nada do que fizeram de lá para cá deu certo. A mãe de todas as misérias que colocaram em circulação foi a costu­meira teimosia em buscar soluções apenas por meio do corte de despesas, sem mudar em nada o funcionamento real da economia grega — corta-se, mas não se criam condições para o desenvolvimento sadio, a capacidade de competir e a geração de riquezas, única maneira conhecida de financiar com eficácia o bem-estar geral.

E agora? Agora a Grécia imagina que pode se salvar trocando governos de direita, que deram errado, por governos de esquerda, que não vão dar certo. Sua grande ideia econômica é obter a prosperidade dando um calote mundial — mas mesmo que toda a dívida fosse milagrosamente perdoada, a Grécia começaria a dever de novo no dia seguinte, pois não tem um tostão furado para pagar despesas de qualquer tipo, e não sabe onde arrumar dinheiro. É uma história que tem tudo para ir longe.

Acompanhe tudo sobre:Crise gregaEdição 1093EuropaGréciaPiigsPlebiscito

Mais de Revista Exame

Aprenda a receber convidados com muito estilo

"Conseguimos equilibrar sustentabilidade e preço", diz CEO da Riachuelo

Direto do forno: as novidades na cena gastronômica

A festa antes da festa: escolha os looks certos para o Réveillon