Política em pauta: o prefeito de São Paulo, João Doria, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, analisaram o cenário político (Germano Luders/Exame)
Luciano Pádua
Publicado em 7 de setembro de 2017 às 05h31.
Última atualização em 8 de setembro de 2017 às 13h04.
São Paulo — A pouco menos de três meses do fim do ano, todas as preocupações se voltam para 2018. Não é para menos: no próximo ano, chegará ao fim o conturbado governo de transição de Michel Temer e haverá eleições presidenciais. A disputa vai ser decisiva para definir se o país seguirá na trilha das reformas econômicas para debelar a crise fiscal, colaborando para a volta do crescimento de modo contínuo. Após a pior recessão da história, a expectativa é compreensível.
Mas os sinais que vêm da economia — e, surpresa, até da política —permitem uma visão mais otimista dos próximos 12 meses. “O Brasil vive um novo momento. Nos últimos anos, o populismo foi prioridade. Prometeu-se tudo e nunca se fez a conta de como atender a tantas demandas”, afirma o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. “A agenda de reformas vai continuar.”
Na condição de presidente da República em exercício, devido à viagem de Michel Temer à China, Maia discursou na abertura do EXAME Fórum de 2017, nona edição do evento promovido anualmente para tratar das grandes questões nacionais. Desta vez, as discussões focaram a análise do cenário político a um ano das eleições presidenciais e as perspectivas econômicas para 2018. O evento, realizado no dia 4 de setembro em São Paulo, contou com a presença de outros dois expoentes da política: o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o prefeito paulistano, João Doria.
Além deles, palestraram o sociólogo Bolívar Lamounier, sócio da consultoria Augurium, e o cientista político Ricardo Sennes, sócio da consultoria Prospectiva. Para discutir a interferência do Judiciário na política e na economia, houve um debate entre os advogados Carlos Ari Sundfeld, professor na Fundação Getulio Vargas de São Paulo; Caio Farah Rodriguez, sócio do escritório Barros Pimentel, Alcântara Gil e Rodriguez; e o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso. Mario Mesquita, economista-chefe do banco Itaú, e o sociólogo Demétrio Magnoli analisaram a situação internacional e como ela influi sobre o Brasil.
A novidade mais alvissareira veio da economia. Após a dureza da recessão prolongada, o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da consultoria MB Associados, projeta um avanço firme do produto interno bruto: 0,7% neste ano e 3% em 2018. “Sairemos bem da recessão. No ano que vem, haverá crescimento de verdade”, diz. A análise está calcada em vários fatores. No campo externo, o Brasil se beneficia do crescimento do PIB mundial e dos juros ainda baixos dos países desenvolvidos.
Internamente, a queda da inflação nunca foi tão consistente, ampliando o poder de compra da população. Com isso, o consumo voltou a crescer — e tudo indica que se manterá assim até 2019, tornando-se o principal motor da nova fase. A redução do nível de endividamento das famílias, notada nos últimos dois meses, ajudará na liberação de crédito, outro vetor de impulso para o consumo. Há ainda bons indicadores nas exportações e nas contas externas. Por isso, o Brasil tem um cenário ambivalente: a economia deve crescer mesmo sem a solução da crise fiscal, que segue piorando enquanto uma reforma da Previdência não está decidida.
A perspectiva de alívio econômico — caso se confirme — terá influência direta na disputa presidencial. O nível de ressentimento da população em relação à política será a variável fundamental para definir os candidatos com mais chances no embate. Com uma recuperação econômica robusta, é possível esperar que os ânimos da sociedade estejam menos acirrados no segundo semestre de 2018. “A sensação econômica pesa muito na hora do voto. Se houver um crescimento do PIB, especialmente no final de 2018, o eleitor pode não querer arriscar a retomada econômica com a escolha de um candidato outsider inesperado”, afirma Ricardo Sennes. “Nesse quadro, há espaço para um reformista moderado.” Ao contrário, se houver frustração na economia e a raiva da população aumentar, a radicalização ganhará terreno.
Nesse cenário — considerado menos provável —, figuras carismáticas, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o prefeito de São Paulo, João Doria, teriam mais chances de protagonizar as eleições. A disputa já está aberta, especialmente entre Alckmin e Doria, que travam um duelo nos bastidores pela indicação como candidato do PSDB. No PT, as chances da vitória de Lula, ou outro candidato do partido, são consideradas mais baixas — e a legenda corre sérios riscos de sofrer uma derrota eleitoral como a das eleições municipais. A conclusão é que um candidato de centro, com disposição para tocar medidas saneadoras e que reduzam o grau de virulência na política, larga na frente.
Na política, é claro, tudo pode mudar. Mas um presidente com um perfil reformista poderia avançar sobre uma das carências do Brasil: um crescimento da economia sustentável, para aumentar a renda per capita e distribuir de forma mais justa a riqueza gerada. Nesse ponto, a estagnação da produtividade brasileira é apontada como vilã. Desde os anos 90, a renda dos brasileiros se mantém perto de um quarto da renda dos americanos. “Com a mesma produtividade dos americanos, teríamos renda per capita perto de 60% da que eles têm”, afirma João Manoel Pinho de Mello, assessor especial de reformas microeconômicas do Ministério da Fazenda, que esteve no fórum para mostrar um conjunto de medidas que estão sendo desenhadas para melhorar o ambiente de negócios.
Novas leis, como a da duplicata eletrônica e a do cadastro positivo, já foram encaminhadas pelo Executivo ao Congresso — uma nova lei de falências está para sair. No Parlamento, que acabou de aprovar a nova taxa de empréstimos de longo prazo do BNDES para reduzir os subsídios nos financiamentos do banco, projetos importantes para destravar investimentos, como os que versam sobre licenças ambientais, agências reguladoras e distratos, podem ser aprovados até o final do ano, segundo Rodrigo Maia. Se avançarem de fato, as medidas permitirão ao país se planejar no longo prazo.
Com maior competitividade, abre-se espaço para preparar as empresas para novas tecnologias, como a automação. “A natureza dos empregos mudará e é preciso estar preparado para isso”, diz Julien Imbert, sócio da consultoria BCG, que dividiu um painel sobre os efeitos da digitalização com Rafael Lucchesi, diretor de educação e tecnologia da Confederação Nacional da Indústria e diretor-geral do Senai. As empresas são uma das forças para impulsionar a agenda da produtividade. Entre os empresários, aumentou a consciência de que eles precisam se envolver, eleitoralmente ou não, no debate dos rumos do país. “O ‘empresário-moita’ ficou para trás”, diz Flávio Rocha, sócio da Lojas Riachuelo. João Amoedo, fundador do Partido Novo e ex-sócio do banco Itaú BBA, ajudou a discutir o novo papel da classe empresarial.
Apesar da turbulência deste ano, há motivos para pensar que o Brasil chegará a 2018 em boas condições de eleger um presidente que entenda as deficiências do país e busque combatê-las. Muitos dos problemas do passado foram resolvidos, como a hiperinflação, e outros já não são mais varridos para debaixo do tapete — vide Operação Lava-Jato. Se bem aproveitadas, as lições das crises brasileiras poderão levar à prosperidade no futuro.