Paulo Manzano é CMO do Grupo JLR. (Eduardo Frazão/Exame)
Editor de Casual e Especiais
Publicado em 26 de outubro de 2023 às 06h00.
Parece ser apenas uma inversão de palavras. A Jaguar Land Rover quer deixar de ser uma marca de carros de luxo para se tornar uma marca de luxo que vende carros. “Na prática continuamos fabricando o mesmo produto, mas isso muda tudo: comportamento, métier, jornada do cliente”, afirma o CMO Paulo Manzano.
Essa não é a única guinada de rumo do grupo, que agora passa a se chamar JLR. A ideia é que cada uma das três linhas da Land Rover (Defender, Range Rover e Discovery) tenha identidade própria de marca, além da Jaguar. “Isso ainda não está claro para as pessoas, precisamos criar esse imaginário”, diz o executivo de marketing, sobre o desafio da empresa.
Manzano tem mais de 20 anos de experiência na comunicação do setor automotivo, em marcas como General Motors, BMW, Toyota e Lexus. Na entrevista a seguir, ele conta as estratégias para comunicar o novo momento do grupo.
A indústria automotiva está em transformação. A forma de comunicar também mudou?
Falando mais de Brasil do que globalmente, hoje não dá para pensar no marketing sem estar presente nas redes sociais e gerando conteúdos através de influenciadores, parceiros. O endosso de pessoas interessantes, formadoras de opinião, acaba sendo mais interessante do que o marketing tradicional. E é um desafio encontrar pessoas que compartilhem valores e consigam transmitir mensagens de forma natural e orgânica. Outra diferença é que não se faz nada sem métrica. Sempre existiu o funil de vendas, mas hoje temos outras ferramentas. Com a digitalização da comunicação houve uma grande amarração de KPIs e de buscas por resultados.
O desafio do marketing é equilibrar investimento para conversão e para branding. Como isso acontece na JLR?
Isso varia de marca para marca e de momento para momento. Fazemos aqui uma divisão entre nurture e converter. A parte de branding é nurture. Estamos nutrindo o imaginário das pessoas com nossas campanhas, nosso posicionamento, nossas ações. Para isso fazemos mídias impressas, campanhas digitais voltadas para a marca, OOH. Já a parte de converter é o call to action, a visita ao site, o preenchimento de um formulário, mais fácil de medir. Existe o desafio de achar a audiência certa, o grupo de pessoas com afinidade com a marca. E temos a parte de eventos. A Casa Range Rover é um exemplo. Na casa que montamos em São Paulo passaram quase 1.200 pessoas, um público superqualificado, clientes em potencial, formadores de opinião, durante duas semanas. Com eles conseguimos ter um impacto mais profundo, geramos leads, vendas, divulgação orgânica.
A JLR está trabalhando as linhas de carro como marcas. Como comunicar esse novo posicionamento?
A Land Rover é uma empresa de 75 anos, superconsolidada, mas com um posicionamento de marca que nem sempre reflete todos os atributos de seus produtos. O Defender lembra aventura, lama. Já a Range Rover é mais refinada, mais luxuosa. E o Discovery é mais para a família, tem sete lugares, sempre foi muito vendido no Brasil. Então, em vez de a Land Rover ficar como uma marca guarda-chuva com os modelos embaixo, transformamos as linhas em marca e trouxemos a Land Rover para baixo, para dar sustentação. Assim consigo fazer uma diferenciação, canalizar meu esforço de comunicação para cada cliente, tratar o consumidor com mais precisão.
E quais são os desafios?
As três linhas ainda não estão consolidadas como marcas. Talvez Range Rover seja a mais fácil de identificar. Em algumas mídias estávamos só com a marca Defender, mas achei que não estava legal. Conseguimos colocar uma silhueta do carro, aprovamos com a Inglaterra, para a pessoa entender o que é. No segmento agro, meu medo era que as pessoas achassem que fosse algum defensivo agrícola. A Discovery ainda causa certa confusão com o Discovery Channel. E eu preciso agora dividir meu orçamento para trabalhar as marcas de forma independente.
Como marca global, você tem liberdade para trabalhar localmente a comunicação?
Nessa transformação que estamos vivendo, de nos tornarmos uma marca de luxo que faz carros, estamos tendo um comportamento mais parecido com Louis Vuitton, Hermès, Rolex. Nós atingimos clientes globais, que viajam muito e são impactados no mundo todo. Nossos consumidores têm casa em Miami, passam férias na França. Procuramos ter consistência na comunicação. Há alguns espaços para trabalhar localmente, de maneira mais sutil, com influenciadores, eventos. Mas a comunicação, o visual, os códigos estão cada vez mais centralizados, o que eu acho bom.
Como é trabalhar a imagem de uma marca de luxo?
Na prática continuamos fabricando e vendendo carros. Mas isso muda o nosso comportamento. Se antes meu métier eram outras marcas de carro, eventos de pista, exposições em shopping, campanhas com incentivos, agora é sofisticação, luxo, curadoria. Vamos comunicar e vender nossos produtos mais como joias do que como carros. Na Casa Range Rover tínhamos só um carro em exibição, um artigo altamente desejado. Isso não muda só a comunicação, mas toda a jornada do cliente, a rede de concessionárias, os processos de atendimento. Vamos inaugurar agora uma loja temporária no shopping Iguatemi de São Paulo entre a Chanel e a Gucci. Não vamos ter lá um vendedor, mas um concierge. São experiências que um carro de luxo pode proporcionar.