Francisco Balestrin: “Precisamos de novos padrões de governança na área médica” (Luis Ushirobira/Valor/FOLHAPRESS)
Da Redação
Publicado em 4 de novembro de 2015 às 14h44.
São Paulo — de acordo com Francisco Balestrin, presidente da associação nacional de Hospitais Privados, que reúne instituições como o Albert Einstein, de São Paulo, e o Copa D’Or, do Rio de Janeiro, o maior problema do sistema de saúde privado não é a escassez de recursos financeiros.
O pior mesmo são os desperdícios e a corrupção. De um modo geral, segundo Balestrin, os hospitais privados brasileiros são mal administrados e sofrem perdas gigantescas por causa de compras superfaturadas, pagamentos de comissões e desvios de material.
Exame - Qual é o custo da corrupção e da ineficiência para o sistema de saúde privado brasileiro?
Balestrin - De acordo com um relatório da Organização Mundial da Saúde, de 20% a 40% dos gastos são perdidos. Seguindo os mesmos parâmetros, as perdas no Brasil custam hoje cerca de 80 bilhões de reais.
Mais ou menos 8 bilhões entram na conta da corrupção, que tem efeitos extremamente maléficos sobre a qualidade da gestão dos recursos destinados à saúde — tanto a pública quanto a privada. Além de corrupção, há muito desperdício.
Exame - Quais os elos vulneráveis da cadeia? Em que momento as irregularidades são mais flagrantes?
Balestrin - Nos processos de compra. Quem ganha mais dinheiro com o setor de saúde são os fornecedores de equipamentos, remédios e material hospitalar. Em geral, esses ganhos são justos, por causa dos investimentos em inovação que essas empresas fazem.
Afinal, os hospitais dependem do avanço da tecnologia para melhorar o atendimento. Mas existe o lado feio da história, que se trata da distribuição de comissões para médicos usarem uma ou outra marca, da formação de cartéis e do uso de tecnologias desnecessárias.
Exame - Todos os hospitais privados têm o mesmo problema?
Balestrin - Nas instituições da nossa associação, a regra é selecionar algumas opções de marcas para o médico escolher. O médico não tem autonomia para privilegiar um fabricante. Mas em muitos hospitais privados a autonomia é total.
Exame - Esse poder do médico favorece a corrupção?
Balestrin - Temos preocupação com a pressão da indústria e dos distribuidores sobre os médicos. Os hospitais devem centralizar as compras com base em critérios de qualidade e preço, e não por causa de benefícios escusos.
Exame - O senhor pode dar um exemplo?
Balestrin - Desde que sai da fábrica até sua utilização no paciente, o dispositivo tem seu preço elevado quase oito vezes. Uma prótese de joelho, cujo preço médio de fábrica é 2 100 reais, chega ao hospital por 13 000 reais e, quando é colocada no paciente, custa 15 600 reais. Dos 13 000 reais, 27% são a comissão do médico — o valor que ele coloca no bolso, lícita ou ilicitamente, por escolher determinada prótese.
Exame - O que dá para fazer para resolver esse problema?
Balestrin - É preciso rever o excesso de burocracia e tornar o sistema de saúde mais transparente. Além disso, é necessário melhorar os processos de compra.
Exame - Uma nova lei federal acaba de permitir que o capital estrangeiro tenha o controle de hospitais privados. Isso pode mudar essa situação?
Balestrin - Com certeza. Esses grandes investidores são organizados e trazem novos padrões de governança corporativa, de processos e de compliance. A tendência é a corrupção diminuir.