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Deixa que eu compro a Casa&Vídeo

Em 2009, um advogado foi contratado para salvar e passar adiante a falida rede Casa&Vídeo. Não achou comprador, tomou 20 milhões emprestados e virou dono

Fábio Carvalho, da Casa & Vídeo: três anos após entrar em recuperação judicial, a empresa voltou a dar lucro (Germano Lüders/EXAME.com)

Fábio Carvalho, da Casa & Vídeo: três anos após entrar em recuperação judicial, a empresa voltou a dar lucro (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 26 de setembro de 2012 às 07h00.

Última atualização em 22 de dezembro de 2018 às 04h24.

São Paulo - Era início de 2009 quando o advogado Fábio Carvalho deparou com o que parecia ser a definição de caos. Destacado pela consultoria Alvarez e Marsal para criar um plano de recuperação judicial para a rede de varejo carioca Casa&Vídeo, ele encontrou uma companhia agonizante: não havia produtos nas prateleiras, fornecedores e bancos faziam fila para cobrar uma dívida de 350 milhões de reais, havia ameaça de despejo e as lojas nem sequer aceitavam pagamentos com cartão de crédito porque as operadoras tinham levado calote.

Acostumado a administrar empresas quebradas, Carvalho reaproximou-se dos fornecedores, renegociou a dívida da Casa&Vídeo, mandou embora metade dos 6 000 funcionários e fez liquidações para trazer os clientes de volta às lojas. O plano de recuperação foi aprovado em nove meses.

Mas, na hora de arranjar um novo dono para a empresa, a coisa complicou. Possíveis compradores, como Lojas Americanas e Magazine Luiza, só estavam interessados nos pontos de venda, não na empresa desenganada. Carvalho decidiu então comprar ele mesmo a Casa&Vídeo.

Pediu um empréstimo de 20 milhões de reais, na “física”, ao banqueiro André Esteves, dono do banco de investimento BTG Pactual, e virou dono. Segundo executivos que participaram da negociação, a condição para o empréstimo foi que, no caso de venda ou abertura de capital da empresa, o BTG assessorasse o negócio. Menos de três anos mais tarde, está ficando claro: Carvalho fez um senhor negócio. A empresa voltou a dar lucro — e seu valor, que era quase nenhum, foi multiplicado.

A trajetória de Carvalho de 2009 para cá é qualquer coisa, menos comum. Executivos responsáveis por recuperar empresas quebradas seguem uma rotina que não foge muito disso: iniciam um programa de corte de custos cruel,  renegociam dívidas com os credores, conseguem um comprador para assumir a operação quanto antes — e aí partem para outra empresa quebrada.

Sua remuneração depende desse ciclo. E a turma, acostumada que está, não tem por hábito se “envolver” com um negócio a ponto de abandonar a carreira e assumir a empresa que está no buraco. Ainda mais incomum é que a decisão tenha sido tomada após a companhia em questão ter sido rejeitada pelo mercado seguidas vezes.


Ao decidir mudar de carreira, Carvalho colocou seus bens como garantia para obter o empréstimo de Esteves. Logo em seguida, voltou a oferecer a Casa&Vídeo para a Lojas Americanas — que olhou, olhou e recusou o negócio após sete meses de conversas. Em seguida, o próprio BTG Pactual flertou com a Casa&Vídeo até que pulou fora. Em 2010, portanto, Carvalho acabou sozinho, endividado e com uma empresa para recuperar.

O plano não era esse, mas Carvalho acabou tendo de virar varejista meio no susto. Sua intenção, ao comprar a Casa&Vídeo, era repassá-la o mais rápido possível, embolsando a diferença entre o preço de compra e o de venda. Mas seu plano B vem dando certo. A sorte ajudou, e muito.

No início de 2009, quando decidiu tomar o dinheiro do BTG emprestado, absolutamente ninguém acreditava numa varejista que acabava de ir às cordas por acusações de sonegação (os ex-donos foram presos e depois liberados). Era, afinal, o auge da crise econômica que se seguiu à quebra do banco americano Lehman Brothers, e quem tinha dinheiro procurava investimentos seguros.

Mas os ventos logo mudaram de lado, sobretudo para o varejo. Em 2009 e 2010, as vendas no comércio brasileiro cresceram 17%, um recorde. Assim, os primeiros dois anos, que tinham tudo para ser os mais complicados, acabaram sendo beneficiados por um pouco esperado vento de popa. A empresa começou a gerar caixa em 2011 e voltou a dar lucro nos últimos meses do ano. A dívida caiu a menos de um terço do que era em 2009.

Enquanto era beneficiado, na linha das receitas, pela boa fase econômica do país, Carvalho fazia aquilo que foi treinado para fazer: cortar na linha dos custos. Além de demitir metade dos funcionários, ele centralizou os serviços administrativos e de logística, chegando a uma redução de cerca de 40 milhões de reais nos custos da companhia.

Ele trocou todos os sete diretores da Casa&Vídeo — e os substitutos vieram de companhias como a gestora de shoppings BR Malls e a varejista Viavarejo. Eles foram incumbidos de transformar qualquer dado tido como “intuitivo” em estatísticas. Informações como o tempo de impressão de uma nota fiscal são cruzadas com o tempo de espera na fila do caixa, por exemplo, para só então se chegar à decisão de aumentar ou não o número de atendentes.

Em setembro de 2011, quando a empresa ainda dava prejuízo mensal, a gestora Polo Capital injetou 50 milhões de reais na Casa&Vídeo para se tornar sócia da companhia, ficando com uma fatia de 50,1% do capital (Carvalho ficou com 49,9%). Com o negócio, Carvalho quitou o débito com Esteves. “Já podemos caminhar sozinhos, investir e ter acesso a crédito”, diz ele.


Embora tenha se transformado em minoritário, Carvalho permanecerá como presidente da Casa&Vídeo. Segundo EXAME apurou,  ele negociou um pacote de remuneração atrelado ao cumprimento de metas de desempenho — e com prêmios mais gordos em caso, por exemplo, de uma eventual abertura de capital. O caminho à frente, além de longo, é difícil.

A margem operacional da Casa&Vídeo, mesmo após as mudanças recentes, equivale à metade da margem da Lojas Americanas — que, além de ser mais rentável, cresce mais. Essa diferença de desempenho faz com que céticos coloquem em dúvida o patamar de valor que os executivos da Casa&Vídeo atribuem ao negócio.

Segundo as contas de executivos da concorrência, a empresa vale, hoje, no máximo 300 milhões de reais, e não 600 milhões como indicado pelos cálculos internos da companhia. De qualquer forma, o valor real só será conhecido em caso de venda ou abertura de capital.

Carvalho jura que não está correndo para ver esse dia chegar. “Todo mundo achou que eu ia vender correndo, mas tenho apenas 35 anos e nenhuma pressa”, diz. Após sentir o gostinho de ser dono, ele não quer voltar a ser advogado tão rápido assim.

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