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Contra o tempo

A presidente Dilma Rousseff poderá corrigir agora os erros cometidos nos últimos quatro anos — mas haverá pouco espaço para fazer algo além disso

Presidente Dilma: (Ueslei Marcelino/Reuters)

Presidente Dilma: (Ueslei Marcelino/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 2 de fevereiro de 2015 às 09h17.

São Paulo - O segundo mandato da presidente Dilma Rous­seff nem começou e sobre ele já pairam duas grandes indagações. Ela vai reconhecer os erros cometidos desde 2010? E, caso o faça, conseguirá corri­gi-los e produzir algum avanço? É cedo para res­ponder à primeira questão, embora a indicação de uma equipe econômica liderada por Joa­quim Levy — gestor linha-dura com as finanças pú­blicas — mostre disposição para mudanças.

O tra­balho, porém, será árduo. “Dilma ganhou tem­po para arrumar a casa, se quiser”, diz Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas. “Mas talvez não tenha tempo de colher os resultados.”

Tome-se o caso do ajuste fiscal, já prometido pela nova equipe econômica. O projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, enviado ao Congresso Nacional, prevê taxas de cres­ci­mento modestas para os próximos três anos — 0,8% em 2015, chegando a 2,3% em 2017. A LDO projeta a dívida pública em 62,5% do PIB ao fim de 2017, quase o mesmo nível de hoje. Ou se­ja, não haverá melhora nenhuma. Nem por is­so a tarefa será fácil.

O problema com um choque de realidade é a obrigação de aceitar os fatos tais co­mo eles são. A meta de superávit primário para 2015, de 1,2% do PIB, exigirá, entre contenção de despesas e crescimento de receitas, um incre­men­to de 100 bilhões de reais no saldo das contas públicas.

Para isso será necessá­rio aumentar a carga tributária, pro­va­velmente com o retorno da Ci­de, o tributo sobre combustíveis, e com a elevação do imposto so­bre produtos industrializados pa­ra automóveis. Será preciso cortar despesas. Mas o governo só pode mexer em 4% do or­çamento — e al­gu­mas contas cres­cem naturalmente, como as unhas.

As regras de reajuste do salário mínimo, por exemplo, impõem um acréscimo de 9% em 2015, causando aumentos nos bene­fí­­cios sociais, co­mo o seguro-desemprego. A alternativa é di­minuir — ainda mais — os investi­men­tos pú­blicos e alterar as regras de benefícios.

“Algumas das medidas, como a mudança no seguro-desemprego, só poderão ser execu­ta­das se houver aprovação do Congresso”, diz Caio Me­gale, economis­ta do Itaú Uni­banco. “E isso torna tudo mais difícil.”

Eis aí um aspecto fora do controle de Dilma Rousseff. Num momento em que não são claros os desdobramentos da Operação Lava-Jato — que investiga um esquema de desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e parlamentares da base de apoio —, a capacidade de o governo negociar apoios fica prejudicada.

“O relacionamento com o Congresso será delicado”, afirma Gustavo Loyola, sócio da consultoria Tendências. “E isso é péssimo caso seja preciso votar medidas impopulares.”

As dificuldades políticas serão um obstáculo a mais para consertar os enganos cometidos na gestão da Petrobras. Desde 2011, a empresa não reajusta o preço da gasolina e do diesel para colaborar com o controle da inflação. Resultado: prejuízo de mais de 100 bilhões de reais em quatro anos, segundo a gestora paulista de recursos Antares.

O retorno dos investimentos da Petrobras está em 6% ao ano — menos do que o custo para captar dinheiro no mercado, de 10% ao ano. Isso põe em risco os planos de investir mais de 83 bilhões de reais em 2015. Toda a cadeia produtiva acaba penalizada. As demissões se alastram entre os fornecedores da Petrobras.

É o caso da paulista TKK Engenharia, prestadora de serviços à estatal em três refinarias. “Nos últimos dois anos, tivemos de demitir 600 funcionários, de um total de 950”, diz Marcus Vinicius Dias, diretor jurídico da TKK. Ele estima ter a receber cerca de 45 milhões de reais em pagamentos atrasados da Petrobras.

Intervenções

Há menos clareza em como Dilma Rousseff lidará com uma de suas principais marcas até aqui: o intervencionismo na economia. O futuro do setor elétrico, desorganizado desde 2012, quando o governo propôs às geradoras antecipar a renovação de suas concessões como forma de baratear a conta de luz, permanece uma incógnita.

Seu principal efeito colate­ral foi desestimular o fechamento de contratos de longo prazo com as distribuidoras. No último leilão de energia, realizado no início de dezembro, a oferta foi 86% menor do esperado pelo governo. Também é difícil prever o comportamento das instituições financeiras controladas pelo Es­tado.

Os repasses do Tesouro Nacional para o ­BNDES emprestar às em­presas chegaram a mais de 455 bilhões de reais em setembro de 2014. Mas isso não resultou em mais investimentos, hoje num dos níveis mais baixos da última década. Seria de esperar que, num ano de ajuste fiscal, a torneira fosse fechada. Em novembro, porém, o Tesouro aprovou a liberação de mais 30 bilhões de reais ao BNDES.

No passado, pensadores como Santo Agostinho e São Tomas de Aquino elaboraram um conceito que cabe ao momento vivido por Dilma: as pessoas podem se redimir de seus pecados, mas isso não as exime de conviver com as conse­quên­cias dos erros cometidos. Mesmo que a presidente tenha uma contrição perfeita — algo a ser provado nos próximos meses —, haverá pouco espaço para avançar.

É mínima a chance de que ocorram reformas importantes para o país, como a tributária. “Grandes mudanças exigem muita negociação, algo difícil num momento delicado como o atual”, diz Marcos Lisboa, vice-presidente da escola de negócios Insper. O que esperar de melhor?

“Há uma agenda de pequenas medidas que podem trazer mais produtividade à economia”, afirma Lisboa. Um exemplo é a simplificação da cobrança de impostos, como a unificação da cobrança de tributos como PIS e Cofins. Um cálculo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário mostra que as empresas gastam 47 bilhões de reais por ano só para lidar com o insano mundo das normas tributárias.

O governo poderia rever o marco regulatório das concessões de obras de infraestrutura, como portos e ferrovias, que patinaram nos últimos anos. O grande desafio é atrair recursos privados para as obras.

“Será preciso garantir aos investidores que os projetos terão taxas de retorno mais altas, enquanto se reduz o crédito subsidiado”, diz Sérgio Lazzarini, professor da escola de negócios Insper. Se isso acontecer, a caminhada daqui em diante poderá ser menos penosa.

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