Dório Ferman, do Opportunity: ações de bancos e empresas de energia na carteira (Eduardo Zappia/Site Exame)
Giuliana Napolitano
Publicado em 12 de abril de 2017 às 05h55.
Última atualização em 12 de abril de 2017 às 05h55.
São Paulo — O pernambucano Dório Ferman é gestor de um dos fundos de ações mais antigos e rentáveis do país, o Lógica II. Dez mil dólares investidos no Lógica em 1986, quando surgiu como um clube de investimentos, viraram 6,8 milhões de dólares hoje, rendimento quase 80 vezes maior do que o do Ibovespa. Isso apesar de os últimos cinco anos terem sido complicados — o fundo teve desempenho melhor que o do Ibovespa, mas, ainda assim, perdeu 17%. O problema, segundo Ferman, foi “não ter acreditado que a situação ficaria tão ruim” no governo de Dilma Rousseff. Hoje, porém, ele acha que o pior já passou e está apostando numa nova onda de valorização das ações de algumas das principais empresas da bolsa, como Petrobras e Vale. Um dos fundadores do banco Opportunity, que tem 25 bilhões de reais sob gestão em diferentes fundos, Ferman também aposta na queda dos juros e na valorização do real ao longo do ano. “Quem quer ganhar com esse novo Brasil deve investir em ações agora”, disse ele a EXAME em seu escritório no centro do Rio de Janeiro.
Exame - A bolsa brasileira subiu bastante no último ano. É arriscado comprar ações agora?
Ferman - Toda oportunidade embute um risco. Se as reformas que o governo está propondo forem aprovadas, viveremos um momento espetacular. Já houve uma mudança importante, a criação de um limite para o aumento dos gastos públicos, e é provável que saia do papel uma boa reforma da Previdência. Mas o investidor que esperar a aprovação das reformas para só então entrar na bolsa poderá perder a oportunidade, porque o preço das ações já terá subido. Por isso investimos na bolsa. Quem quiser ganhar com esse novo Brasil deverá investir em ações agora. Depois poderá ser tarde.
Exame - De onde vem essa sensação de que o Brasil vai dar certo?
Ferman - O país está se organizando para voltar a crescer, depois de um período muito ruim, especialmente nos governos de Dilma Rousseff. Mergulhamos no intervencionismo, que bagunçou toda a economia. O bom empresário não era o que produzia e vendia com lucro, mas o que conseguia financiamento no BNDES. Formou-se o grupo dos competentes em pedir. Fora isso, a Petrobras foi destruída e, por tabela, o Rio de Janeiro. Um inimigo não faria um serviço tão bem-feito. O Brasil, agora, está no caminho certo. A equipe econômica, comandada pelo ministro Henrique Meirelles, não poderia ser melhor, e os sinais de recuperação da economia são bons. O desafio é conseguir antecipar as empresas que vão se dar bem nessa nova etapa.
Exame - Como fazer isso?
Ferman - Analiso a governança da empresa, seu setor e o preço das ações. Quem investe numa empresa com governança ruim acaba perdendo dinheiro. Também não adianta apostar num setor decadente, mesmo que a empresa seja ótima. É preciso tentar prever para onde a economia vai e quais serão as grandes companhias da próxima década, o que é dificílimo. Fiz um estudo recentemente e vi que, em 1900, o grupo General Electric valia mais do que todas as 99 empresas que compunham o S&P 500 juntas. Hoje, é a 15a empresa americana e quem domina a bolsa são companhias de tecnologia, como Apple, Google e Facebook.
Exame - Quais ações os fundos do Opportunity estão comprando no Brasil?
Ferman - Investimos em ações de bancos, que devem se beneficiar com a retomada da economia, da mineradora Vale, que cortou custos e está mais eficiente, e da Petrobras, cuja gestão atual é excelente. O risco da Petrobras, hoje, é a dependência do preço do petróleo. Estamos otimistas também com o setor de energia elétrica: haverá muitas oportunidades para as empresas com os esperados leilões de linhas de transmissão e a privatização de distribuidoras. Uma em-presa interessante no setor é a Eletrobras: seu caso é parecido com o da Petrobras, de choque de gestão, mas a dívida é menor e não há dependência do preço de uma commodity. Ou seja, o risco é mais baixo. O Lógica teve 60% do patrimônio investido em ações do índice S&P 500, da bolsa de Nova York, de 2014 até quase o início de 2016. Hoje, temos uns 2%. Reduzimos porque estamos apostando na recuperação brasileira.
Exame - O desempenho do Lógica nos últimos cinco anos foi ruim. O que deu errado?
Ferman - Nosso erro estratégico foi não acreditar que a situação poderia ficar tão ruim. Houve uma esperança quando Joaquim Levy foi escolhido como ministro da Fazenda, no segundo mandato de Dilma. Então continuamos comprando ações, mas o país parou e, por consequência, a bolsa também. O país teve uma gestão péssima movida por uma ideologia complicada. A ideia de comandar a economia e escolher para quem vai dar o dinheiro deve ser muito agradável para quem escolhe, mas acabou com o país. Para um investidor com visão de longo prazo, errar faz parte. Já erramos outras vezes e nos recuperamos. Desta vez, vamos nos recuperar junto com o Brasil.
Exame - O que vai acontecer com os investimentos feitos pelo Lógica se a recuperação econômica demorar demais ou as reformas não saírem do papel?
Ferman - Vamos perder dinheiro, mas o risco que corremos é calculado. Não existe ganho sem risco, só que o risco tem de ser limitado. Essa é nossa grande preocupação. Se o cenário que projetamos der errado, o Lógica deverá perder algo em torno de 10% em alguns meses, porque a bolsa vai dar uma sacudida. Mas aí vamos mudar os investimentos, podemos voltar a aplicar no S&P, e o objetivo será recuperar o prejuízo.
Exame - Os fundos multimercado do Opportunity estão investindo em quê?
Ferman - Temos investimentos que vão valorizar se os juros caírem. É o caso de títulos públicos e contratos de juros nos mercados futuros. Essa é uma grande oportunidade hoje, porque a inflação diminuiu e deve cair ainda mais, o que abre espaço para a redução das taxas. Além disso, há espaço para que o juro de longo prazo diminua. Precisamos perder o costume de indexar. Quando começa o ano escolar, já esperamos pelo reajuste da mensalidade. Isso não existe no resto do mundo. Além disso, o real deve valorizar, porque a recuperação do país tende a atrair investimentos.
Alguns industriais podem até achar isso ruim num primeiro momento, porque dificulta as exportações, mas é melhor para a economia e para as próprias empresas no longo prazo. Com o real mais forte, as empresas conseguem se modernizar, comprando máquinas e equipamentos a um custo menor. Para isso acontecer, no entanto, é preciso deixar o mercado funcionar. Se o empresário achar que haverá intervenção no câmbio, vai preferir esperar e exportar num período mais favorável. Se achar que ocorrerá um movimento inverso, poderá esperar para importar máquinas pagando menos. Era o que acontecia no passado, e a consequência era que a economia ficava parada.