Andrew Mason: "Nosso crescimento tem a ver com o problema que tentamos resolver" (Jimmy Fishbein/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 17 de junho de 2011 às 08h30.
Chicago - As compras coletivas são o maior fenômeno da internet nos últimos anos. O pai da ideia, o americano Andrew Mason, do Groupon, pode ficar para a história como o empreendedor que transformou para sempre o comércio.
Mas pode ser, também, uma das caras da nova bolha da internet. Em entrevista a EXAME, Mason diz o que pensa sobre o futuro das compras coletivas - e o que deverá manter o Groupon na liderança do mercado de cupons de desconto.
EXAME - Como surgiu a ideia do Groupon?
Andrew Mason - Eu e o Eric (Lefkosky), o cofundador, começamos um site chamado The Point. A ideia inicial era criar mobilização social com o mesmo princípio do Groupon: a partir de um determinado número de adesões, o projeto seguiria em diante. O Eric é um capitalista nato.
Havia uma tensão criativa entre nós dois. Ele sempre pensou em modelos de negócios, maneiras de ganhar dinheiro. Eu sempre resisti às tentativas de monetização. Montamos um blog muito simples, totalmente improvisado, usando a tecnologia do The Point, para vender cupons. Na época, o nome era Get a Group On. Aparentemente, funcionou.
EXAME - Por que deu tão certo? É o apelo irresistível dos descontos?
Andrew Mason - Eu diria que nosso crescimento tem mais relação com o tamanho do problema que estamos ajudando a resolver do que com nossa competência. Do lado do consumidor, o que estamos fazendo é inverter a tendência das pessoas de passar cada vez mais tempo na frente do computador.
Queremos que elas voltem para o mundo real. Você acorda e, no seu e-mail, há uma oferta de 60% de desconto para uma aula de escalada. Você pensa: “Nunca fiz isso antes. Com esse preço, por que não tentar?” Do lado dos vendedores, a transformação é ainda mais profunda.
As pequenas empresas nunca tiveram uma maneira eficiente de chegar aos consumidores. Existem muitas pérolas escondidas. O Groupon coloca essas empresas no mapa e as ajuda a atrair centenas, milhares de novos clientes. E nós oferecemos uma maneira de medir o sucesso da promoção.
EXAME - Mas os anúncios no Google são muito usados por pequenas empresas, e também são mensuráveis.
Andrew Mason - O Google é difícil. (Mason se levanta e desenha um diagrama no quadro branco.) O Yahoo! começou vendendo publicidade tradicional. Você paga pela audiência que atinge. Sua peça publicitária tem de ser boa para funcionar, e isso muitas vezes está fora do seu controle.
O mesmo vale para TV, rádio, páginas amarelas. Depois, veio o Google, que é um passo adiante: você só paga pelo clique. Se o anúncio não funcionar, OK, pois não há custo. Mas, se o cliente clicar, o site precisa funcionar muito bem. Isso é difícil. Eu tenho 40 pessoas aqui que só trabalham no nosso site.
Pequenas empresas não têm dinheiro para isso. No Groupon, você paga só quando o cliente vai até você e compra algo. Nós eliminamos dois fatores de risco do modelo tradicional, e por isso tivemos tanto sucesso. A menos que você seja uma grande empresa, você não tem o luxo de correr esses riscos.
EXAME - O Groupon está em mais de 400 cidades. Mas existe um limite de ofertas que podem ser apresentadas por dia, geralmente uma, ou um punhado em cidades maiores. Isso significa deixar de fora centenas, milhares de pequenos comerciantes. Não existe um limite para o crescimento?
Andrew Mason - Passamos por três fases. No começo, fazíamos só uma oferta por dia, porque era o possível, dado nosso tamanho. Tínhamos poucos parceiros e poucos usuários. Na segunda fase, o problema se inverteu. Eram tantos parceiros que, em algumas cidades, os vendedores teriam de esperar quase um ano para aparecer no site.
Nessa época, trabalhávamos como um encanador: o dia só tem 24 horas, e existia um limite para nossa capacidade de atender. Se você precisasse de conserto na sua pia, teria de procurar outro encanador. E foi exatamente o que aconteceu. Começaram a surgir os clones, que basicamente atendiam todos os parceiros que nós tínhamos de recusar.
Agora, estamos entrando na terceira fase, que é a personalização. Conhecendo os usuários — o sexo, o bairro, as preferências de compra e assim por diante —, podemos fazer ofertas mais adequadas. E também multiplicamos o número de promoções por dia, o que nos permite atender mais comerciantes.
EXAME - Você mencionou os clones. No Brasil, há mais de 1 000 sites de compras coletivas.
Andrew Mason - Meu Deus! (risos).
EXAME - Não é um sinal de que é fácil demais copiar seu modelo de negócios? Isso não preocupa?
Andrew Mason - Durante algum tempo fiquei preocupado. Acho que foi porque muita gente me perguntou isso. “Melhor eu ficar preocupado...” (risos) Veja, temos mais de 1 000 clones no Brasil, dezenas de milhares mundo afora. Mas ainda somos, de longe, a maior empresa do segmento.
O modelo pode ser fácil de copiar, mas não de executar. Sempre me perguntam quais são as barreiras de entrada para meus competidores. Minha resposta é: “Ou elas já estão aí, ou elas não importam”. Com tantos concorrentes, claramente estamos fazendo algo certo. E isso significa ignorar a concorrência e nos concentrar no nosso negócio.
EXAME - O número de parceiros e usuários cadastrados certamente é uma defesa importante contra a concorrência, não?
Andrew Mason - Sim, mas o mercado não vai ter um único vencedor. Eu realmente não penso nesses termos. Não é assim que tomamos decisões.
EXAME - Mas os investidores se preocupam muito com isso.
Andrew Mason - Sem dúvida, mas nosso histórico foi todo construído ignorando essa questão. E os investidores também querem pessoas que não sejam meramente reativas ao que faz a concorrência. E outra coisa: essa ideia poderia ter surgido dez anos atrás. Ou cinco. O conceito é estupidamente simples.
Como não pensaram nisso antes? Quando tive a ideia, não foi imaginando: “Vamos criar uma empresa de bilhões de dólares!” Nada foi previsto. Por mais intuitivo e óbvio que pareça hoje, havia muitas dúvidas, muitas chances de dar errado. “Será que os consumidores vão gostar? E os comerciantes?”
EXAME - Qual é o negócio do Groupon? É publicidade? Tecnologia?
Andrew Mason - Estamos entre o comércio eletrônico e a publicidade. Mas a tecnologia é cada vez mais importante. Um de nossos novos produtos, o Groupon Now, é um exemplo. As pessoas gastam 80% do dinheiro do dia a dia num raio de 3 ou 4 quilômetros de suas casas.
Com o Groupon Now, mostramos ofertas de acordo com a localização do usuário. Para o vendedor, perguntamos: “Qual é o horário em que você precisa de mais clientes?” Nós podemos fazer promoções no meio da tarde para um restaurante que fique aberto o dia todo, por exemplo.
Estamos tentando oferecer, para pequenos comerciantes, um sistema comparável ao das empresas aéreas ou os hotéis. E isso fica na fronteira do comércio eletrônico.
EXAME - O que isso significa internamente? No futuro, o Groupon vai ter mais a cara de uma agência de publicidade ou de uma empresa do Vale do Silício?
Andrew Mason - Abrimos um escritório no Vale do Silício no meio do ano passado, que tem cerca de 100 engenheiros. Eu diria que muito do que vamos fazer daqui em diante tem a ver com tecnologia. Estamos fazendo essa transição.
EXAME - Por que o Groupon recusou a oferta de 6 bilhões de dólares do Google?
Andrew Mason - Bem, não posso dizer se houve ou não oferta. Mas somos felizes como uma empresa independente. Nosso sucesso recente explica isso.
EXAME - Você fez faculdade de música, depois foi estudar políticas públicas e acabou como empresário. Por que as mudanças?
Andrew Mason - Com certeza não foi intencional, mas fico feliz com essas mudanças. Sempre fui um geek (pessoa curiosa e dedicada a um interesse particular). Desde os 10 anos de idade eu gosto de computadores. Quando comecei a estudar políticas públicas, a ideia sempre foi fazer algo ligado à tecnologia.
Eu tinha um site chamado Policy Tree (algo como árvore de políticas), e ganhei uma bolsa da Universidade de Chicago para trabalhar com isso. A ideia era criar uma plataforma para organizar debates políticos em organogramas. E acho que música e programação são muito semelhantes.
Ambas são maneiras de expressão, de comunicação. O que mais me empolga é ter ideias e colocá-las em prática. É muito difícil fazê-lo como um músico, e ainda mais difícil fazer as pessoas prestar atenção.
A web é uma folha em branco. Fico surpreso que não haja mais artistas que façam essa transição para a tecnologia. Há tantas oportunidades para tentar algo novo, pensar o mundo de maneiras inéditas. Mesmo que sejam ideias muito simples, como o Groupon.
EXAME - Como o artista descreve a experiência de ser presidente de empresa?
Andrew Mason - É diferente. Lembrei outro dia da época em que escrevia todos os textos de nossas promoções. Quando ficava na esquina de duas avenidas entregando panfletos para fazer propaganda do Groupon. Isso faz um ano e meio, mas parecem dez (risos). Sei que tenho a sorte de passar por essa experiência.
E tem sido um enorme aprendizado. A velocidade é grande. Foram seis meses para lançar o Groupon na segunda cidade, Boston. A terceira levou dois meses. Depois um mês, depois lançamos duas cidades num mês, depois dois países num mês, e assim por diante. Estamos aprendendo como fazer as coisas, e repetindo a experiência ao redor do mundo muito rapidamente.
EXAME - Estamos vivendo uma nova bolha tecnológica?
Andrew Mason - Deixo essa resposta para as pessoas mais inteligentes do que eu. Acho que, em algum momento, os números do Groupon vão falar por si mesmos. Não que eu não preste atenção no que está acontecendo, mas não posso responder por ninguém além do próprio Groupon.
Estamos chegando ao último espaço vazio da internet, um lugar que ainda não foi transformado pela tecnologia digital, que é o comércio local. É um mercado gigante, enorme. E muito do entusiasmo com o Groupon na realidade é um entusiasmo com a perspectiva de encontrar uma solução para esse problema.
EXAME - O que aconteceu na primeira grande onda da internet não assusta?
Andrew Mason - A diferença é que temos receitas. Somos um negócio de verdade.