Aécio e Dilma em debate: as aplicações dos fundos chegam a mudar diariamente, seguindo as pesquisas eleitorais (REUTERS/Ricardo Moraes)
Da Redação
Publicado em 6 de novembro de 2014 às 16h00.
São Paulo - A maioria dos profissionais do mercado financeiro usa um mesmo método para prever os resultados das empresas e, assim, projetar o preço de suas ações. Ainda que tenha suas falhas, o método demanda certo esforço. É preciso analisar os projetos das companhias, estimar retornos, descontar o peso dos juros.
O resultado do cálculo ajuda a decidir se vale a pena investir nas ações das empresas analisadas. Nas últimas semanas, porém, muitos investidores simplesmente abandonaram as planilhas. Com a bolsa oscilando — dependendo do dia, abruptamente — a cada pesquisa eleitoral, analistas e gestores de fundos resolveram simplificar a análise.
Agora, eles traçam um cenário pessimista e outro otimista para os papéis mais negociados da Bovespa, e o preço “justo” estimado para eles passa a ser um valor entre os dois extremos. É o caso da Petrobras. Atualmente, a ação da companhia vale na bolsa cerca de 21 reais.
O preço é exatamente a média entre a cotação máxima prevista, de 29 reais — que seria atingida caso o futuro governo indicasse que interviria menos na empresa — e a mínima, de 12 reais — para onde o preço iria se acontecesse o oposto disso. Nem as previsões para a produção, nem o potencial do pré-sal, nem mesmo o cronograma de investimentos da Petrobras entraram na conta.
Essa conta de padaria que os analistas começaram a fazer é um exemplo da imprevisibilidade que tomou conta do mercado em meio à disputa entre a presidente Dilma Rousseff e o candidato Aécio Neves (que obteve bem mais votos do que o esperado no primeiro turno) pela Presidência.
Semana a semana, há mudanças relevantes no preço da maioria das ações, nos juros pagos pelos títulos públicos e no câmbio. De acordo com a consultoria Economatica, a volatilidade dos papéis da Petrobras é maior hoje do que em 2002, quando havia enorme incerteza sobre o que poderia acontecer com a política econômica caso Luiz Inácio Lula da Silva fosse eleito presidente (na época, o dólar chegou a bater os 4 reais e o Ibovespa caiu 40% em menos de um ano).
Em setembro, o rendimento dos papéis do governo oscilou 15%, muito acima da média histórica, que é inferior a 5%. No mesmo mês, o dólar atingiu a maior cotação desde 2008, no auge da crise financeira mundial — e, no início de outubro, teve a maior queda em quatro anos.
Para tentar não perder dinheiro nesse ambiente, muitos gestores estão mudando seus investimentos diariamente: começam o dia apostando, por exemplo, na alta do dólar e, se a moeda valoriza, mudam de estratégia para preservar o ganho que tiveram. Quinze profissionais consultados por EXAME disseram que o volume diário de aplicações de seus fundos triplicou em dois meses.
Em algumas gestoras, as reuniões de comitê de investimento, que aconteciam uma vez por semana, passaram a ser diárias. “O cenário é binário: a economia e especialmente as perspectivas mudam radicalmente dependendo de quem vencer. Não há segurança para fazer apostas em um candidato”, diz Marcel Kussaba, sócio da gestora Quantitas, com 15 bilhões de reais sob gestão.
Apesar de tanto vaivém, os resultados dos fundos, de forma geral, têm decepcionado. O rendimento médio dos fundos de ações foi de apenas 0,4% de janeiro a setembro. Os multimercados renderam 7,5%, um desempenho melhor, mas ainda assim inferior ao CDI.
Um levantamento da gestora XP mostra que 74% dos fundos multimercados não conseguiram bater o CDI no ano. Mesmo gestores consagrados, como Luis Stuhlberger, responsável pelo Verde, fundo multimercado mais rentável do país, estão penando. O Verde fechou seis dos nove meses de 2014 no vermelho — o desempenho só havia sido pior em 2008.
No acumulado do ano, o rendimento é de 3%, e só não é mais baixo porque o fundo ganhou 7% em setembro, quando a subida da presidente Dilma nas pesquisas de intenção de voto fez o mercado andar na direção das apostas feitas por Stuhlberger na época (valorização do dólar e alta dos juros).
Períodos de maior turbulência são comuns no mercado no mundo todo. Quando há dúvidas sobre o cenário político ou as perspectivas econômicas, os investidores tendem a ficar mais cautelosos.
Após a crise de 2008, houve migração recorde de recursos da bolsa para a renda fixa na maioria dos países, e esses recursos só voltaram a ser aplicados em investimentos de risco recentemente, com a recuperação americana e o início de retomada na Europa. O problema se torna mais grave quando esses ciclos de incerteza são frequentes ou duram muito tempo.
No limite, isso prejudica os resultados das empresas e o desempenho da economia. Aqui, algumas companhias tentaram, mas nenhuma abriu o capital neste ano — ou seja, deixaram de captar recursos que seriam usados para investimentos. Não custa lembrar que a falta de uma taxa de investimento mais robusta é um conhecido calcanhar de aquiles da economia brasileira.
Ajustes em 2015
Pesquisas mostram que os executivos de mercado já têm suas previsões para a economia e os investimentos para depois das eleições. A maioria não espera grandes progressos econômicos em 2015 qualquer que seja o presidente: acredita que o crescimento do PIB não passará de 1,5%, os juros serão elevados e a inflação ficará acima da meta de 4,5%.
Mas a opinião geral é que as perspectivas de longo prazo são melhores caso Aécio Neves seja eleito e, por isso, os analistas preveem a alta da bolsa e alguma valorização do câmbio se isso acontecer. Já uma vitória de Dilma Rousseff, de acordo com as projeções desses profissionais, levaria o Ibovespa para a faixa dos 45 000 pontos e o dólar a 2,80 reais.
O consenso é que, em ambos os governos, os juros subiriam para conter o aumento de preços, mas a elevação seria mais abrupta numa administração Aécio Neves, o que poderia fazer a inflação ficar abaixo de 6% no próximo ano. Em cenários tão opostos, a única certeza é que 2015 será um ano de ajustes — para o Brasil e para os gestores.